Postado em: 22 de mar de 2013.
A idade é a mesma do ídolo e referência: Zico. Já a comemoração dos 60 anos acontece de maneira bem mais discreta. Eduardo Bandeira de Mello ainda não realizou no Flamengo nada que o faça merecer camisa comemorativa ou estátua. Mesmo que fizesse, garante não ser afeito a grandes comemorações. Pelo menos para si próprio. Nesta sexta-feira, dia em que faz aniversário, o novo presidente rubro-negro deixa qualquer tipo de extravagância para o pedido de presente. “Mimo” coletivo, que sonha dividir com todos os integrantes da maior torcida do Brasil para, aí sim, trocar a voz mansa e calma habitual para se entregar à festa: – Vale ser campeão do mundo, da Libertadores, Brasileiro…? Dá tempo de ser bicampeão do mundo até o fim do mandato – pediu sorridente. Há três meses no comando do clube, Bandeira de Mello sabe que o único presente que recebeu até o momento foi de grego: um turbilhão de problemas que passam pelas esferas financeira, jurídica e esportiva. Na data do aniversário, porém, garante já ter o que comemorar. O monstro, que era mais feio que o esperado, como admitiu o próprio, começa a ganhar feição um pouco mais apresentável: – Tem muita coisa dando certo. Embora a situação financeira seja muito complicada, estamos tendo alguns avanços. Dá satisfação ver que estamos agindo com responsabilidade. Torcida e sócios estão reconhecendo isso, apesar de sentirem as dificuldades. Estamos recuperando a dignidade e a credibilidade do clube. Na véspera do dia em que “empata” com o maior ídolo, o presidente do Flamengo recebeu a reportagem em seu gabinete na Gávea para longo bate-papo. Com uma papelada para despachar sobre a mesa e “abençoado” pela foto do amigo sessentão Zico na parede, Bandeira de Mello se dividiu entre o presidente e o torcedor, mostrou-se ambicioso ao falar do futuro, pé no chão ao analisar o presente, e otimista diante de qualquer situação. Do susto com o caos financeiro ao desejo de ganhar o mundo novamente, confira toda a entrevista abaixo:
Passados quase três meses de mandato, qual balanço você pode fazer da gestão? A situação que vocês encontraram era pior do que esperavam? O bicho era mais feio do que imaginávamos. Há sempre alguma surpresa, mas temos que estar preparados para isso. Não dá para ter medo dos fantasmas que às vezes aparecem. Qual seria o ponto mais positivo deste período? Algo planejado e que a diretoria já conseguiu alcançar? Tem muita coisa dando certo. Por exemplo, estamos com meio caminho andado para conseguir as certidões negativas de débito, algo que o clube não tinha há muitos e muitos anos. Isso vai nos permitir ter mais acesso a recursos de patrocínios, resolver problemas fiscais, investir nos esportes olímpicos. Do ponto de vista financeiro, apesar do caos total, dá muita satisfação ver que estamos prosseguindo e caminhando. Os nossos interlocutores estão reconhecendo a credibilidade e as boas intenções da atual diretoria. Embora a situação financeira seja muito complicada, estamos tendo alguns avanços. Dá satisfação ver que estamos agindo com responsabilidade. Torcida e sócio estão reconhecendo isso, apesar de sentirem as dificuldades. Estamos recuperando a dignidade e a credibilidade do clube. Há ainda outros pontos que dão satisfação, como a vice-presidência jurídica, que sempre foi uma pedra no sapato e algo mal gerido no Flamengo. Agora, temos um departamento no nível das maiores empresas brasileiras, que nos permite tomar pé da situação que sempre foi uma caixa-preta. Também na área administrativa. Quando temos que dispensar alguém, pagamos todas as verbas rescisórias, o que não acontecia e respingava no jurídico. O clube acabava devendo muito mais. O que mais assustou você ao assumir o Flamengo? Estar com todas as receitas penhoradas, não estar pagando os parcelamentos da Timemania e Refis 4. A Timemania foi um benefício para os clubes, parcela as dívidas em 20 anos, algo perfeitamente administrável. Ainda assim, o clube não pagou. No dia em que tomei posse às 19h, às 17h estava no Centro, na procuradoria da previdência, para tomar conhecimento da situação e podíamos perder o benefício por falta de pagamento. Convencemos os procuradores de que viraríamos o jogo, falei que podiam observar o meu discurso de posse, e felizmente concordaram. Foi solicitada uma auditoria para se ter a noção exata da dívida e de todos os problemas financeiros que existem no Flamengo. A diretoria já recebeu algum retorno em relação a isso? Alguma informação? Está terminando. Provavelmente na semana que vem ou, no máximo, em duas, teremos toda essa situação, que será apresentada a todos. E há alguma previsão para solução do problema das certidões negativas? Com essa questão solucionada, já há situações, como patrocínio e investimentos, acertadas? Está avançando bem. Não podemos nos comprometer com prazo, há uma série de burocracias envolvidas. Mas estamos esperançosos. Há muita coisa engatilhada. Lógico que não é sair anunciando no dia seguinte, isso é impossível, mas há uma série de coisas engatilhadas. Quase um mês depois, há algum arrependimento da decisão de encerrar com as equipes de ginástica e judô? Principalmente diante de tanta repercussão do caso. Foi uma coisa bem pensada e uma decisão tomada em cima da situação econômica do clube. Não tínhamos como manter uma situação insustentável. Com certeza, vamos retomar na frente, com todo investimento em atletas de ponta, equipes de natação, ginástica e judô. Vamos retomar, mas em bases sustentáveis. Era algo sem futuro, manter atletas de ponta pagando salário alto no papel e não conseguir pagar depois. Como você recebeu as críticas de Diego e Daniele Hypolito e de Jade Barbosa? Além das acusações da sua antecessora, Patricia Amorim, de que foi um ato de revanchismo? São atletas que merecem respeito, trabalharam para o Flamengo esse tempo todo e, certamente, deram declarações emocionais. Eles vão refletir e ver que não existe nada pessoal contra eles. No futuro, vamos retomar. O Flamengo é um clube conhecido pelas inúmeras correntes políticas internas. Como foram esses três meses? Há muita resistência? De uma maneira geral, estamos conseguindo trabalhar. Claro que oposição é sempre saudável. Mas em momento nenhum me senti pressionado por nenhum segmento político. Vamos ser otimistas de que todo mundo é Flamengo e quer o bem do Flamengo. Depois de tanta badalação no aniversário do Zico, você também completa 60 anos quase despercebido… Eu mesmo esqueci. Não sou muito festeiro. Cá entre nos, Zico é Zico, é o nosso rei. O meu vai passar de passagem, como os outros passaram. Fazer aniversário como presidente do Flamengo é diferente? Estar aqui no Flamengo, na presidência, me dá muito orgulho. A responsabilidade é grande, independentemente de ser aniversário ou não. Ser presidente não era um projeto pessoal, aconteceu. O importante é o nosso grupo estar aqui, trabalhando para o clube. Vou me sentir realizado se conseguirmos fazer tudo que queremos. Qual o presente que você gostaria de receber? Vale ser campeão do mundo, da Libertadores, Brasileiro…? Dá tempo de ser bicampeão do mundo até o fim do mandato. Você sempre se disse um torcedor fervoroso do clube. Depois que assumiu o cargo, mudou alguma coisa? Tenta se conter um pouco mais nas críticas, análises…? Acho que é mais ou menos a mesma coisa. De vez em quando, me pego em uma reação que não seria a ideal para a liturgia do cargo, mas todo mundo entende. Sempre assumi que sou e vou continuar torcedor. E a chegada do Jorginho? Está animado? Faço parte do conselho gestor, e a escolha dele foi uma unanimidade. Estamos muito esperançosos, é uma pessoa séria, estudiosa. O contato foi maior com o Wallim, mas, no contato que tivemos, ele só confirmou toda a excelente impressão que eu tinha. Você já disse que, como presente de aniversário, deseja ser campeão de tudo, mas e como presidente do clube? O que projeta para quando encerrar o mandato, em dezembro de 2015? Como torcedor, é claro que quero que o time vença tudo até lá. Mas o que tenho certeza é que vamos deixar a instituição em um outro patamar em termos éticos, morais e de credibilidade. Vamos avançar muito na recuperação financeira. Acha que o Flamengo pode se tornar o clube mais forte do Brasil em termos financeiros até lá? É possível. Se não conseguirmos, queremos estar próximos. O Corinthians é um exemplo ou o espelho são clubes de fora? Há muitos clubes bem administrados. Estamos conversando com vários. Pegando um pouquinho de cada. O grupo do qual você faz parte sempre falou muito da questão do marketing, em explorar a marca Flamengo. Internacionalizar o clube é uma das prioridades? Levar a própria equipe para o exterior? É um objetivo. Isso com certeza vai mudar. Quem viaja para o exterior vê que existe um potencial muito grande para crescer. Inclusive em países sem muita tradição, como a China, toda a Ásia, a África… Com certeza, o Flamengo vai crescer para esse lado. Mas vamos dar também uma atenção especial ao torcedor do interior do Brasil. O Flamengo tem 40 milhões de torcedores, e boa parte está no interior. Vamos estreitar a relação com outros estados. Já viajei muito pelo interior e sei como é a presença e a importância do Flamengo para essas pessoas. É uma forma até de agradecimento por essa paixão. Mesmo à distância, eles mantêm a chama acesa. Então, além da internacionalização, vamos fazer a interiorização do clube. Esse projeto passa mais por ações de marketing mesmo ou inclui a presença do próprio time em alguns desses lugares? Vamos encontrar uma maneira de estar presente. Daí, há vários tipos de ações que podemos pensar. Ainda não podemos passar todos os detalhes, até porque os projetos precisam ser bem planejados. Não podemos ser irresponsáveis.