Um impasse que se agravou nos últimos dias pode levar o Flamengo a romper o contrato firmado em dezembro de 2011 com a maior potência olímpica mundial, os Estados Unidos, e não mais ceder a Gávea para os treinos dos atletas relacionados pelo Comitê Olímpico Norte-Americano (Usoc). Os visitantes ocupariam boa parte da sede do clube pouco antes dos Jogos de 2016. Em troca, pagariam US$ 400 mil (cerca de R$ 805 mil). A nova diretoria do Flamengo, no entanto, não concorda com esses valores e quer pelo menos US$ 4 milhões (R$ 8 milhões).
Na nova negociação, iniciada em março deste ano, o Flamengo expôs a situação ao diretor de Eventos Internacionais do Usoc, Doug Ingram. Ele se assustou com a decisão da cúpula rubro-negra e levou o caso à sua entidade e às autoridades americanas responsáveis pela segurança da delegação, sempre cercada de cuidados especiais por causa do receio de atentados terroristas.
Agentes do FBI já inspecionaram o clube e, principalmente, o entorno do Flamengo. Eles dispõem de um relatório preliminar sobre as condições de uso da Gávea pelo Usoc. Houve, então, uma contraproposta dos norte-americanos, considerada irrisória pelo Flamengo. O clube já decidiu que não vai trocar visibilidade por uma quantia “desprezível”. Quer, assim, marcar posição em nome da valorização da marca Flamengo, que acaba de assinar um patrocínio com a Caixa que vai lhe render R$ 25 milhões em um ano.
Oficialmente, o clube atenua a situação e se declara otimista quanto à reestruturação do contrato. “O Clube de Regatas do Flamengo reforça a satisfação pela parceria com o Comitê Olímpico dos Estados Unidos, com a certeza de que os atletas americanos terão as melhores condições de preparação e treinamento para os Jogos Olímpicos Rio 2016”, informou o clube, por e-mail.
Essa, no entanto, não é a realidade. Um dirigente do clube, que não quis ser identificado, deixou claro que “ou o Usoc aumenta em muito a sua contraproposta ou vai ter mesmo de procurar outro lugar para seus atletas em 2016”.
Uma pessoa que mantém contato estreito com dirigentes do Usoc disse que a ruptura está praticamente decidida, tanto que o comitê norte-americano passou a procurar, sem o conhecimento do Flamengo, outras áreas no Rio de Janeiro para a sua delegação. Já esteve em um clube da zona oeste, perto do futuro Parque Olímpico, e tentou em vão dividir o espaço que será ocupado pelo Comitê Olímpico Brasileiro na Escola de Educação Física do Exército, na Urca.
Por e-mail, o chefe de imprensa do Usoc, Patrick Sandusky, limitou-se a dizer que “é normal na atual fase discutir detalhes dos planos finais do contrato”. Ele acrescentou que o comitê “pretende continuar contando com o clube”.
Pedro Rego Monteiro, diretor executivo da agência intermediadora do negócio, a Effect Sport, disse que não houve quebra de contrato. Indagado em seguida se o acordo estava com os dias contados, pediu desculpas e encerrou a conversa. “Não posso falar mais nada”, repetiu ele pelo menos três vezes.
A reportagem apurou que dirigentes do Usoc prometeram não recorrer à Justiça se o desfecho da crise for o fim da parceria. Eles entenderam que a mudança de gestão no Flamengo criou um novo cenário e que um litígio com o clube mais popular do País poderia prejudicar o desempenho de seus atletas no Rio de Janeiro por causa da reação do público em algumas competições.
Segundo o contrato assinado com a ex-presidente Patricia Amorim, a Gávea serviria de centro de treinamento olímpico e paralímpico para atletas de vários esportes, incluindo natação, judô e basquete. Na tentativa de oferecer algo a mais aos norte-americanos, a fim de reforçar o argumento de que os valores iniciais estão fora de questão, o clube, agora administrado por Eduardo Bandeira de Mello, que tomou posse em janeiro, também cederia suas instalações de remo, na Lagoa Rodrigo de Freitas, onde haverá as provas da modalidade. Por dois dias, a reportagem não conseguiu contato com Patricia Amorim.
Desde 2009, quando o Brasil foi anunciado como sede dos Jogos de 2016, o Usoc foi o comitê olímpico que mais vezes visitou o Rio de Janeiro. O contrato fechado no fim de 2011 já estava em discussão havia mais de um ano. Além das instalações da Gávea, teve peso fundamental na opção norte-americana a questão da segurança de sua delegação, testada na visita do presidente Barack Obama à cidade, em março de 2011. O campo do Flamengo serviu para pousos e decolagens do helicóptero Marine One, no qual viajavam Obama, sua esposa, Michelle, e as filhas, Sasha e Malia. Todas essas movimentações foram vigiadas por um esquema que incluía atiradores de elite posicionados no alto de vários prédios que circundam a sede do clube.
Fonte: Ei