Não sei o que esperavam de Jorginho. Já escrevi aqui que seu currículo como técnico era modesto demais para receber os cerca de R$ 200 mil mensais que faziam dele uma opção mais barata que o seiscentista Dorival Júnior. Mesmo a economia que se pretendeu com ele era discutível: era preferível ter revelado um treinador, apostado num ex-jogador recente com carisma junto à equipe, mas essa não é ainda uma política que os clubes brasileiros aplicam.
Quero me adiantar e dizer que não acho que o técnico precise dessa estabilidade toda não. Acho perfeitamente normal o ritmo de trocas de técnicos nos clubes brasileiros: nosso futebol ainda vive de motivação e empatia com o técnico. É raro haver algum raciocínio tático-estratégico dando certo, como Tite e Cuca, e ciclos acabam com a mesma velocidade com que espinhas dorsais inteiras de equipes são desfeitas. Se um clube que se considera top 10 da Série A perde as quatro primeiras partidas do Brasileiro, demitir um técnico não é exatamente um remédio contra-indicado. No mundo todo, Alex Ferguson é mais exceção do que regra.
Ainda assim, a demissão de Jorginho, depois da derrota para o Náutico, me pega de surpresa. Vejamos: o Flamengo estava desfalcado de González e Marcelo Moreno, que serviam suas seleções. O técnico testava algumas das contratações recentes – Paulinho, Val, Gabriel, nenhum deles uma realidade como reforço – e o time criava oportunidades sem alçá-las ao placar. Insistia com Rafinha, que parecia ser muito bom no Estadual – deve se destacar de novo na edição de 2014. Fazia enfim o que dava para fazer, embora tenha abusado da amizade ao cometer o pecado capital de pôr em campo três volantes – sendo que apenas um era o admirável Elias.
Não era um jogo fácil de ganhar, uma vez que o Náutico marcou o afunilado rubro-negro com disciplina, mas a fragilidade do adversário pernambucano, em nada comprometido com a vitória, ressaltou os piores aspectos do Fla.Perder para quem não quer te ganhar ainda é a maior humilhação do futebol.
Contra Jorginho, porém, há um forte argumento: o time não repete com facilidade o padrão de jogo que exibiu contra o Santos, em que dominou a partida no Mané Garrincha e poderia ter vencido. No Orlando Scarpelli, se não houve brilho, não se pode dizer que faltaram oportunidades. Houve um enorme tempo para melhorar o time entre o Estadual e o Brasileiro, treinando e enfrentando as equipes limitadas da Copa do Brasil. E aí há os azares.
Se Hernane não tivesse esgotado seus gols no Estadual, anotando um aqui e outro ali, ou se Renato Santos não tivesse marcado bola no gol do Náutico, talvez Jorginho ainda fosse um projeto viável. Para a diretoria que chegou ao Fla com discurso de administração cinco estrelas e austeridade, o desafio agora é mostrar um mínimo de coerência.
Porque sabemos: o técnico do Flamengo não pode ser mais caro que Dorival Júnior – e de cara descartamos Muricy Ramalho, preferido de nove entre dez torcidas do Brasileiro. Desde que Paulo Pelaipe se tornou diretor de futebol, fala-se em Mano Menezes – que é mais caro que Jorginho – mas o interesse nunca se concretiza, e não sei se Mano merece tantas cantadas rubro-negras em sequência. Se qualquer um desses dois for contratado, fica claro que a diretoria muda de discurso conforme a cotação do dólar.
E não, não acho que o Flamengo vá atrás de René Simões, demissionário da diretoria do Vasco. Assim como não vejo espaço na Gávea para a mediocridade revisitada de Joel Santana.
Sempre serei a favor de Renato Gaúcho no Flamengo, por uma tese minha: não é exatamente um gênio – está longe de sê-lo -, mas acho que a maior parte dos técnicos brasileiros ganha na base do vumbora, e isso ele sabe fazer. O grande lance, no entanto, é que Renato casa com a fanfarra e a megalomania com que o torcedor rubro-negro desfruta o Flamengo. Vai dizer as coisas que mexem com a galera – ninguém fica imune a Renato – e saber impor respeito aos jogadores. Talvez aceite os valores de Jorginho; afinal, está em busca de recolocação profissional. Se o projeto é não ter projeto, que se aposte no puro suco da marra.
Há Andrade, que foi campeão brasileiro pelo clube porque a equipe se uniu em torno dele, porém acabou engolido pelo descalabro disciplinar de Adriano e Patrícia Amorim em 2010. Se estiver recuperado da cirurgia que fez no joelho, devido a uma infecção, talvez seja uma bandeira barata. Não recebia mais de R$ 150 mil quando deixou o Flamengo. Poderia fechar até por menos.
Por fim, há sempre a possibilidade de trazer um ex-jogador identificado com a torcida e respeitado pelos jogadores. Penso em Fábio Luciano como líder que foi, penso em Ronaldo Angelim, que sempre foi um cara amado por todos – e que pode criar uma solidariedade coletiva, inspirando os jogadores a atuarem por ele como foi com Andrade. No entanto, isso exige uma coragem que já faltou à diretoria na hora de segurar Jorginho.
Mas nunca ninguém perdeu dinheiro apostando no caos rubro-negro. Se se pode mandar um Ibson embora para apostar num Carlos Eduardo mais caro e menos identificado, se se pode trazer uma marca esportiva (a Adidas) em nome duma suposta reidentificação com uma época da qual o próprio Jorginho fez parte, e ainda assim mandá-lo embora, confesso ao leitor: não me surpreenderia nem com um Muricy caro, nem com um técnico absolutamente alienígena à história do clube.
E boa sorte ao auxiliar Jaime Almeida contra o Criciúma. Porque, se não tiver tu, irá tu mesmo.
Fonte: Blog do Marvio dos Anjos