A Contradição do Flamengo.

Venho já há algum tempo ensaiando um artigo com este tema, mas vinha adiando, adiando… Até que, em entrevista no último domingo ao jornal O Globo, os mandatários rubro negros explicitaram um pensamento que já se vinha analisando há algum tempo: o de que torcedores de extratos de renda menor não são bem vindos neste “novo” Flamengo.

A atual administração vem se notabilizando por uma forma “neoliberal” de proceder: o importante é a maximização de lucros a curto prazo, sem importar o bem estar da população ou, no caso rubro negro, o desempenho esportivo. Além disso, a prioridade para o pagamento de dívidas e a redução do tamanho do clube com a eliminação de esportes que “não dessem lucro”. Até o time campeão brasileiro de basquete esteve ameaçado de fechamento logo após a conquista se não arrumasse patrocinadores.

Além disso o time se radicou em Brasília para a disputa deste Campeonato Brasileiro. A intenção era aumentar a geração de receitas em um acordo onde a maioria das receitas pertence ao clube e não há cobrança de ingressos de meia entrada. Além disso se aumentou o valor mínimo de ingresso, que nas partidas disputadas na capital federal tem sido na faixa de R$120.

Por outro lado, o clube vem endurecendo as negociações com o consórcio responsável pelo Maracanã a fim de aumentar a maximização de lucros. Foi fechado um acordo provisório até o final do ano para a utilização do estádio, mas de acordo com a citada entrevista a ideia é ir buscar oportunidades de maximização de lucros fora do Rio. Nas palavras de Luiz Eduardo Baptista, o BAP, Vice Presidente de Marketing e, segundo alguns, presidente de fato do clube:

– “No longo prazo, vamos duplicar a torcida. Vamos construir um Flamengo muito mais forte. O Flamengo é líder de torcida em 23 estados.

Ou seja, mais importante no momento é se exibir ao torcedor de fora do Rio a fim de aumentar o ganho financeiro, ainda que a prejuízo da parte esportiva. Neste Brasileiro o clube mandou cinco partidas fora do Rio de Janeiro (entre Juiz de Fora, Brasília e Florianópolis), obtendo cinco pontos ganhos. No Maracanã foram dois jogos, com quatro pontos – que poderiam ser seis não fosse a lamentável arbitragem da partida contra o Botafogo. Ainda assim a entrevista deixa claro que pelo Brasileiro só devem haver mais jogos no Rio de Janeiro se o Consórcio aceitar incondicionalmente as condições do clube e se houver necessidade de resultado.

Outro ponto importante é o projeto de Sócio Torcedor, apelidado ironicamente por alguns torcedores de “Sócio Doador” ou “Sócio Otário”. A postura dos dirigentes do clube foi clara no sentido que os torcedores não deveriam esperar benefícios do clube: o importante era ajudar o Flamengo a pagar suas dívidas e melhorar sua gestão. Em jogos de menor apelo ainda tem se feito promoções pontuais de ingressos, mas é algo que tende a ser pontual.

Ainda assim, é algo caro: paga-se R$ 40 de mensalidade no plano mais barato e com a adesão o ingresso mais barato, em número limitado, sai a R$ 60 ou R$ 80. Que se vá a um único jogo mensal, equivale a 20% aproximadamente de um salário mínimo.

Evidentemente, este fenômeno de elitização da frequência aos estádios é um fenômeno mundial. Entretanto, o Flamengo vem exacerbando este fenômeno – a ponto dos ingressos para o jogo contra o Botafogo, sob responsabilidade do clube, terem saído mais caros que partidas da Copa das Confederações realizadas recentemente no Maracanã. Por outro lado, em centros europeus como a Alemanha tal fenômeno de elitização é acompanhado da reserva de lugares a preços populares para aqueles que pertencem a camadas sociais mais baixas.

Entretanto, veja o leitor o que pensa a atual diretoria do Flamengo a respeito dos torcedores de menor faixa de renda:

– O Flamengo vai viver dos pobres, jogar um futebol pobre e ser um time pobre, porque o negócio futebol mudou (BAP)

– O Flamengo é grande em todas as camadas sociais. A TV cumpre um papel complementar, leva a todas estas pessoas o Flamengo. (BAP)

– A precificação é mais complexa do que o romantismo. A atratividade do jogo é mais relevante que o valor do ingresso para trazer público. (ainda BAP)

Lembre-se o leitor que o citado BAP, vice de marketing, é presidente da SKY, operadora de tv a cabo – que tem como um de seus principais negócios a venda de pacotes de futebol no sistema “pay per view”. Ou seja, há um claro conflito de interesses envolvido: quanto mais se afastam os torcedores do estádio, mais se vendem os pacotes do referido produto – que, aliás, é um péssimo serviço, mas este é papo para outro post.

Contudo, esta questão de se afastar o torcedor de camadas de renda mais baixa do estádio e do convívio na Gávea – basta lembrar que o valor de mensalidades de sócios e títulos do clube foi aumentada de forma significativa nesta gestão – esconde o que é uma grande contradição do Flamengo.

O clube firmou sua imagem de “mais querido” e “clube do povo”, mas tem historicamente uma elite dirigente bastante excludente, para ser suave na determinação do termo. Não é elite na acepção financeira, mas sim “de berço”: não adianta ter muito dinheiro se não souber ter os ternos corretos, o óculos de classe e saber estar e ser aceito nos locais frequentados pela alta sociedade desde tempos imemoriais. Para fazer parte da diretoria do Flamengo não adianta ter muito dinheiro: é preciso ser “bem nascido”.

O mesmo clube que tem torcedores em todas as classes sociais, que assumiu com orgulho o rótulo de “urubu” (somos todos pobres, somos todos negros) tem uma elite dirigente que reproduz os piores preconceitos sociais de nossa elite. É um clube de pobres – dirigido por quem odeia pobres. De certa forma não deixa de ser um microcosmo do Brasil pré-2002.

Note o leitor que os dois presidentes recentes que fugiam deste estereótipo de “bem nascidos” foram expelidos pelos sistema do clube: Edmundo Santos Silva e Patricia Amorim. Evidente que os dois também fizeram por onde, com administrações muito ruins, mas talvez os mesmos (graves) erros seriam relevados caso fizessem parte desta “reserva moral” do país arquétipo dos dirigentes rubro negros.

Ou seja: na prática a atual direção apenas tenta “devolver” o clube àqueles que desde os tempos da fundação pensam ser os verdadeiros donos. É algo para se pensar.

Fonte: Pedro Migão


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