Amor x dinheiro. O segundo duelo entre Flamengo e Atlético-PR pela decisão da Copa do Brasil foi polarizado com esse embate fora das quatro linhas, tendo o jogo, inclusive, ficado em segundo plano. O aumento no preço dos ingressos tem gerado muita discussão e a repercussão não é das melhores. Entretanto, há sólidos argumentos tanto a favor quanto contra o aumento e vale a pena fazer uma reflexão sobre o caso:
1) Argumentos A FAVOR ao aumento
Sempre se bradou que a torcida é o maior patrimônio do clube, independente de qual ele seja e, em se tratando de Flamengo, essa afirmação tem ainda mais relevância. Nenhuma outra equipe possui 40 milhões de torcedores e, dessa forma, o potencial de consumo é muito grande. A diretoria rubro-negra, com a classificação do clube para uma final de campeonato nacional, em um ano que foi dado como “perdido” esportivamente, viu nessa decisão uma grande oportunidade de arrecadar, utilizando-se desse valioso patrimônio que é a Nação Rubro-Negra.
Diante disso, pode-se desenvolver o seguinte raciocínio: sendo a torcida a maior do Brasil em termos absolutos, ela consegue sobressair em qualquer classe social, da mais humilde até a mais abastada. Soma-se a isso o fator mercadológico, pois todo produto (no caso, o ingresso) vale a medida de sua escassez. Como o ingresso é um produto escasso, uma vez que só entrarão no estádio entre 60 e 70 mil torcedores de um total de 40 milhões, é nítido que a procura será maior que a oferta e o preço do bem tende a subir.
Aliado a isso, há a intenção de expandir ainda mais o programa de Sócio-Torcedor. Com o ingresso a valores estratosféricos, a tendência é que os torcedores optem por aderir aos planos do ST para se beneficiarem dos descontos concedidos. O Flamengo, em apenas 8 meses, já possui o 4º maior número de adesões entre os programas de sócio-torcedor brasileiros e tá pedindo passagem para o 3º colocado (Santos). A intenção é boa, mas poderia ser realizada em conjunto com outras medidas, como se verá mais adiante.
Há também a questão dos cambistas. Na “final” de 2009, contra o Grêmio, o ingresso de arquibancada custou R$ 40,00, mas os cambistas, pra variar, fizeram a festa e venderam as entradas por valores que variavam, na média, entre R$ 250,00 e R$ 350,00. Com a maior adesão ao ST, a tendência é que 2/3 dos ingressos sejam vendidos através do programa, o que diminuirá a atuação dos cambistas e fará com que sobrepreço vá para os cofres do clube, e não para sustentar vagabundo.
No entanto, o principal e mais contundente objetivo da alta dos ingressos é a arrecadação pura e simples. São muitos os motivos elencados pela diretoria, entre eles a compra dos direitos econômicos do Elias; pagamento de salários, premiações e luvas do departamento de futebol e diminuir o déficit deixado pelas outras administrações.
2) Argumentos CONTRA o aumento
A torcida, nos piores momentos de 2013 (e não foram poucos), sempre esteve ao lado do time e fez os jogadores, muitas vezes, tirarem forças de onde não tinham para ganhar jogos improváveis, como contra o Cruzeiro pela mesma Copa do Brasil. À exceção da estreia do clube no Maracanã, onde a diretoria utilizou deste mesmo artifício de custo de oportunidade e colocou os ingressos a preços bem elevados, os demais jogos do Flamengo tiveram preços mais acessíveis, porém nunca baratos. Somente quem era ST + estudante conseguiu desfrutar de preços populares.
Ainda assim, menos da metade dos ingressos, na média, foi vendido para ST, visto que uma grande quantidade de adeptos mora fora do Rio de Janeiro. Dessa forma, cerca de 50% do público comprava ingressos a preços cheios, ou era beneficiário de meia-entrada, ou conseguia as gratuidades estipuladas por lei.
Com o aumento fora dos padrões, até para os ST estudantes o preço ficou salgado, pois o ingresso sairá a R$ 75,00. Gastar esse valor (na melhor das hipóteses), em uma quarta-feira à noite, no final do mês, mesmo que seja para ver uma final, é puxado para a grande maioria dos torcedores. Vale frisar que quem for apenas ST terá que despender a bagatela de R$ 150,00.
O cerne da questão não é nem o valor em si, mas sim a quebra de confiança que houve na relação entre o clube e a torcida. Era certo que o preço dos ingressos iria aumentar para o jogo final, até porque já havia acontecido um pequeno reajuste para o jogo semifinal. No entanto, a elevação foi totalmente desarrazoada e desproporcional e poderá punir quem acompanhou o time nos jogos até aqui. Por mais que existam pessoas que possam pagar e que o estádio vá encher, não me parece justo dar costas a quem ajudou até aqui. O correto seria fazer com que a grande maioria pudesse ter chance de comprar os bilhetes. Se iriam conseguir, devido à fila, prioridades, disponibilidade, etc, é outra história, mas a chance seria dada.
Se a diretoria quer fazer caixa e comprar o Elias, por que não fez uma campanha de marketing com o próprio jogador, licenciando produtos, fazendo tarde de autógrafos, ou o que mais seja, já que ele se tornou ídolo da torcida? Por que não usaram a imagem do Brocador para fazer dinheiro, já que ele caiu nas graças da galera? O mesmo vale com relação ao Léo Moura, um ídolo de quase 10 anos de casa. Não sou do ramo do marketing e, por isso, citei só alguns exemplos hipotéticos. Deve haver, nessa área, outras saídas para que o clube possa gerar receita. Se não tiver, já deixo aqui o meu mea culpa, pois penso que tenha como.
A diretoria vem fazendo um trabalho muito bom na parte administrativa, mas querer tirar todo o prejuízo, de uma só vez, utilizando a paixão do torcedor como moeda de troca soou mal e ficou feio. Ainda que a medida possa ser legal, com certeza ela não é legítima.
SRN
Gabriel Lima