Futebol é aquela coisa: todo mundo acha que entende mais que o treinador, que o dirigente e que o comentarista, sempre baseando-se na sua ótica de torcedor apaixonado. De uns anos para cá e com as facilidades que a tecnologia nos oferece, cada vez mais vem sendo tentada uma abordagem mais, digamos, científica do que se passa em campo.
Já tem uma literatura razoável sobre o tema, mas ano passado foi lançado um livro que eu considero um divisor de águas nessa metodologia: Os Números do Jogo – Por Que Tudo o Que Você Sabe Sobre Futebol Está Errado. É uma tentativa de explicar o jogo através de modelos matemáticos e uma maçaroca de estatísticas, processadas de forma lógica e estruturada.
O livro já inspirou até uma série no Fantástico – meio rasa, por sinal, mas só essa semana eu tive chances de ler, e o fiz de uma só vez, de modo frenético, porque para quem é fã do filme Moneyball e sonha com algo parecido no futebol, o livro é imperdível.
A tese mais importante dos autores é que o futebol é um jogo do elo mais fraco, ou seja, o resultado é muito mais consequência das fraquezas de uma equipe do que do talento dos seus melhores jogadores.
São muitas páginas dedicadas à teoria, que fazem todo sentido para provar que por mais que você aglomere bons jogadores, o determinante crucial do sucesso da equipe (ou de uma empresa) é como você lida com suas fraquezas. Evitar que os pernas de pau cometam um desastre é mais importante do que o desempenho espetacular do craque – em números, melhorar seu elo fraco representa um saldo de gols 30% melhor e quase o dobro dos pontos no campeonato.
Outra tese bem interessante é a contaminação negativa que um craque pode espalhar pela equipe.
Citando um estudo da psicologia alemã dos anos 20 conhecido como Efeito Kohler – que conseguiu provar que no esporte o desempenho coletivo melhora na medida em que os menos capazes são induzidos a perceberem sua contribuição como decisiva para não prejudicar o grupo – os autores reforçam a importância de selecionar seus elos mais fortes entre atletas que estimulem o esforço máximo de todos, para que o sucesso seja percebido como resultado de um trabalho árduo, não de um talento nato.
Não que isso venha ao caso, mas como exemplos de liderança positiva eles citam o argentino Lionel Messi, que se dedica intensamente e assim induz os elos mais fracos do Barcelona a fazerem o mesmo. E como exemplo de liderança negativa, bom, eles escolheram o Imperador Adriano, que ao optar constantemente por não treinar e ainda assim ter um bom desempenho, passava a seus companheiros de time a mensagem de que por mais que eles se esforçassem, jamais chegariam aos pés dele.
Ora, se futebol é, provadamente, um esporte cujo triunfo depende essencialmente da forma como o time lida com seus elos mais fracos, ter no grupo lideranças negativas, ainda que talentosas, é a forma mais garantida de fracassar.
Por que digo tudo isso? Porque andei refletindo, animadamente, sobre a inequívoca melhoria do time do Flamengo neste último mês (noves fora o desastre do Alto da Glória que praticamente nos alijou da Copa do Brasil). Muita coisa boa aconteceu, a governança do futebol mudou, o treinador mudou, tivemos escassos porém precisos reforços, o ambiente político melhorou, a torcida abraçou o time…
Mas, para mim, o que foi realmente decisivo foi o afastamento de Elano, Felipe e principalmente André Santos.
Não tenho dados estatísticos para afirmar, mas creio que eles estavam entre os piores desempenhos de todos e só por isso já deveriam ter outro destino – porque a receita clássica de lidar com os elos fracos é tentar fazer o sujeito melhorar treinando mais, depois é reforçar o setor com outros jogadores, se não der certo substituir e se continuar a dar errado é mandar o cidadão embora.
E mesmo que não fossem “cientificamente” o elo mais fraco do time (ou seja, ainda havia gente em campo com desempenho pior do que o deles), a mensagem que cada um trazia estampado era de que, sendo jogadores consagrados, milionários, com passagem pelo exterior e pela Seleção (Felipe só nas de base), suas falhas estavam sendo minimizadas pelo nome que carregam, o que contribuía para espalhar uma carga negativa para todos os demais.
Ainda não dá para soltar fogos, mas como claramente o time é outro, é nítido que esse tipo de mensagem equivocada – tudo posso, porque sou famoso e jogo com meu nome – precisa ser extirpada em um esporte que se destaca pela coletividade e, sobretudo, pelo estrago que jogadores de baixo desempenho, o tal elo mais fraco, costumam causar.
Avante Mengão. Dias melhores virão.
Walter Monteiro
Fonte: urublog