Outro projeto hoteleiro do empresário Eike Batista, que nunca saiu do papel mas causou muita polêmica, deixa apreensivos vizinhos do Morro da Viúva. O prédio 170 da Avenida Rui Barbosa, antiga sede do Clube de Regatas do Flamengo, seria transformado no Hotel Parque do Flamengo. O quatro estrelas, com 454 quartos, exigia a reforma do imóvel — construído nos anos 50 —, estimada em R$ 100 milhões, além da retirada de moradores. O investimento era visto com bons olhos pela prefeitura, que chegou a anunciar que perdoaria a dívida de IPTU do clube, de R$ 17 milhões. A anistia era atribuída ao fato de a construção do hotel, que receberia turistas em 2016, atender ao pacote olímpico.
Obras na antiga Sede do Flamengo estagnam.
Depois de inúmeras promessas de reforma, o Hotel Glória continua abandonado. Há dois meses, o grupo Acron, que adquiriu o empreendimento do empresário Eike Batista por um valor que é mantido em sigilo, anunciou que as obras seriam retomadas em agosto, mas até agora nenhum operário começou a trabalhar no local. Enquanto isso, os vizinhos daquele que já foi o primeiro hotel cinco estrelas do Brasil reclamam dos transtornos causados pela paralisação da reforma.
Moradores do edifício Itacolomy, que fica ao lado do Hotel Glória, tiveram as paredes de seus apartamentos danificadas pelas obras no hotel, e a vista do Aterro do Flamengo bloqueada por placas de metal, instaladas para proteger os imóveis da poeira. Cansados da escuridão, os moradores de três andares se juntaram e pagaram R$ 3 mil para uma empresa retirar as placas de metal que tapavam as suas janelas.
Apesar desses problemas, o que mais deixa indignada a escritora Alice de Oliveira, que mora no 11º andar do prédio, é a destruição do patrimônio do Hotel Glória. Ela lamentou que o empresário Eike Batista, que comprou o imóvel, tenha paralisado as obras.
— Eu tinha a vista desse lindo hotel. Agora, ele é só um esqueleto. A gente fica triste e sem palavras para descrever esse crime. Não restou nada. É escombro puro — reclamou.
ENTIDADE PODE INGRESSAR COM AÇÃO POPULAR
Vizinhos do hotel, inaugurado em 1922, taxistas do ponto da Rua do Russel também reclamam da interrupção das obras. Segundo Adilson Borges, presidente do ponto, o movimento caiu 80%.
Para o presidente da Associação de Moradores e Ouvidores da Glória e Parque do Flamengo (AMO Glória e Parque do Flamengo), Jorge Mendes, o primeiro erro foi da prefeitura, que autorizou a demolição do Teatro Glória — que funcionava desde 1970 no anexo do edifício — e o retrofit do hotel. Para tentar reverter a situação, a entidade estuda impetrar uma ação popular, a fim de exigir do novo proprietário a restauração do projeto original do Hotel Glória, incluindo o teatro.
— Se os órgãos encarregados de preservar a nossa arte arquitetônica e nossos prédios históricos não tivessem autorizado a demolição, não teria acontecido de um empresário falir deixando um esqueleto muito feio — avaliou Mendes.
A Subsecretaria do Patrimônio Cultural, Intervenção Urbana, Arquitetura e Design informou, em 2010, na época da aprovação da reforma, que uma pesquisa histórica e iconográfica constatou que o Teatro Glória não pertencia ao projeto original. Por isso, teve sua demolição autorizada, para que o prédio principal voltasse a ter seu formato original. Na época, o grupo EBX informou que “o projeto do Hotel Glória garante uma contrapartida cultural para a cidade, ainda a ser estudada e anunciada até o fim do ano”. No entanto, nenhum anúncio foi feito.
PREOCUPAÇÃO COM INVASÕES
Na fachada no Hotel Glória, janelas parcialmente tapadas por tapumes não impedem a entrada de invasores. Apesar da presença constante de dois seguranças no local, a fachada, completamente pichada, mostra que vândalos conseguem entrar e sair incólumes do imóvel. A vereadora Leila do Flamengo (PMDB) contou que vem recebendo denúncias de pessoas preocupadas com o risco de que moradores de rua e usuários de drogas invadam o imóvel para erguer no local uma favela, como as que se formaram em um terreno da Oi, no Engenho Novo, que foi desocupado em abril, e na fábrica Tuffy, no Complexo do Alemão, onde moram cerca de duas mil pessoas em barracos improvisados.
— Estamos preocupados com o abandono das obras. A última notícia que tivemos é que o empreendimento foi comprado por um grupo estrangeiro, mas, até agora, as obras não reiniciaram. Há inclusive o risco de invasões, já que os portais de entrada têm uma abertura no andar térreo que facilita o acesso de invasores. Os moradores do bairro estão preocupados, e o hotel já foi pichado — afirmou a vereadora.
Para Jorge Mendes, a fachada pichada comprova que há riscos de invasão. Já Alice de Oliveira, vizinha do hotel, não acredita que moradores de rua possam invadir o Hotel Glória. Ela reclama de outros tipos de invasores: urubus, que fazem seus ninhos nos andaimes das obras abandonadas, e mosquitos, que se proliferam nas poças de água depois de cada chuva.
— Enquanto as obras não forem retomadas, esses animais indesejáveis continuarão hospedados ali — lembrou Alice.
Representantes do grupo suíço Acron, que adquiriu o Hotel Glória, não foram localizados para comentar o assunto. Em julho, o grupo afirmou, em entrevista ao GLOBO, que o hotel, com 352 quartos, ficaria pronto para os Jogos Olímpicos de 2016.
CONSTRUÇÃO DE 4 ESTRELAS TAMBÉM NÃO DECOLOU
Depois de brigas que chegaram ao Ministério Público — alguns moradores se recusavam a deixar seus apartamentos — o Edifício Hilton Santos está desocupado. Quem mora na região reclama do abandono e teme que o local seja invadido. Segundo o porteiro Antônio de Oliveira, que trabalha em um prédio vizinho, há reclamações de aglomeração de moradores de rua e usuários de droga nas proximidades do Hilton Santos, que exibe sinais de deterioração, como paredes pichadas e janelas quebradas.
A presidente da Associação de Condomínios do Morro da Viúva (Amov), Maria Thereza Sombra, garante, no entanto, que o local não oferece riscos para a população, uma vez que há seguranças armados protegendo o imóvel de invasores. Já o vice-presidente de patrimônio do Flamengo, Alexandre Wrobel, confirmou que o contrato com a REX (empresa do grupo EBX, de Eike Batista) ainda está em vigor. Wrobel afirmou que existem negociações para que o empreendimento seja passado para outro grupo financeiro. Ele ainda tem esperanças de ver o hotel pronto para as Olimpíadas.
Fonte: O Globo
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