Enfim, chegamos às Dívidas.
No final, é aqui que as contas fecham. Se falta dinheiro em algum lugar, os clubes têm duas fontes de recursos: Adiantamentos de contratos (TV e Publicidade) ou Dívidas diretas. De qualquer forma, é tudo dívida.
Em 2013 o EBITDA foi menor, os Investimentos maiores, logo, o resultado é o aumento das Dívidas, que cresceram 22%, ou R$ 681 milhões.
Uma parte deste crescimento, relacionada aos Impostos, é mera correção, cujo reflexo será visto nas Despesas Financeiras. Fazendo uma conta simples e corrigindo o saldo de 2012 pela Selic (9% na média), o incremento real desta Dívida teria sido da ordem de R$ 300 milhões. Parte como transferência de Dívidas que estavam em Dívidas Operacionais, e parte pelo reconhecimento de novas dívidas e tributos atrasados.
Positivamente, no agregado as Dívidas Operacionais sofreram queda, e o evento destaque foi o reconhecimento de Imposto de Renda e INSS que o Corinthians atrasou por anos – e que nós apontamos na análise de 2012 (fato igualmente apontado por esse OCE) – e que foi transferido para a conta “Impostos”.
Enquanto isso, vimos o aumento expressivo nas Dívidas Bancárias, que saltaram 36% em 2012. Muito possivelmente este aumento está lastreado no contrato com a Globo, que serve de garantia para os Bancos (como já explicado por esse OCE em outras vezes, o adiantamento é, geralmente, um empréstimo bancário que tem determinado valor/período dos direitos de transmissão como garantia).
DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS
Estas serão alvo do Proforte (esse nome deixou de ser usado, a partir da mudança feita pelo relator do projeto, que transformou o que era o Proforte em Lei de Responsabilidade Fiscal no Esporte, tema abordado e explicado algumas vezes por esse OCE), projeto que visa reestruturar os passivos fiscais dos clubes e alongar seu vencimento, dando folga ao caixa e permitindo que sejam efetivamente pagos. Não entraremos nos detalhes do Proforte, pois ainda é um projeto que está tramitando na Câmara dos Deputados e não tem data para votação.
Mas é fato que a existência de projetos como este causa dois efeitos imediatos: i) os Clubes passam a atrasar deliberadamente o recolhimento de Tributos pois sabem que há uma saída menos custosa sendo costurada; ii) os Clubes apontam mais facilmente atrasos, contando que serão “limpos” após a aprovação do projeto.
PROFORTE – Lei de Responsabilidade Fiscal no Esporte
Depois da Timemania temos agora o Proforte, mais uma tentativa de resolver os passivos fiscais dos Clubes, alongando o perfil de vencimento de forma a possibilitar o pagamento.
A grande questão do Proforte é saber se de fato será a última tentativa de solução. O que costumamos ver é a reincidência dos clubes esperando pela próxima benesse, o que torna os que pagam em dia vítimas e beneficia financeiramente clubes que usam dos atrasos como fonte de recursos.
Dívidas Operacionais
As Dívidas Operacionais tiveram um comportamento positivo em 2013.
As dívidas com Fornecedores cresceram e referem-se ao pagamento parcelado da aquisição de Direitos Econômicos de Atletas. Mas é importante ressaltar que estes financiamentos serão pagos no período seguinte, e isto pressionará o caixa em algum momento.
Ao mesmo tempo, as Despesas Operacionais sofreram redução, mesmo com o aumento dos Custos, que naturalmente traria uma elevação nessas contas. Significa que os clubes estão se organizando e reduzindo o “financiamento” através de atrasos no recolhimento principalmente de IRRF sobre Salários e INSS.
Como os impostos vêm sendo pagos
Fizemos uma simulação comparando as Despesas Provisionadas, que em geral são os impostos correntes, com os custos dos clubes, de forma a apurar qual o prazo de pagamento desses impostos. Em geral, pagamentos em até 45 dias estão dentro do que se considera normal entre o recolhimento e efetivo repasse ao Fisco.
Separamos os clubes da análise em dois blocos: acima ou abaixo dos 45 dias.
Quem está acima, em tese, está com impostos atrasados, e quem está abaixo mantém os pagamentos em dia.
E há destaques: no primeiro bloco vemos Bahia, Fluminense, Coritiba e Cruzeiro com crescimentos importantes de prazo médio. Em compensação, ainda que acima dos 45 dias, Botafogo e Flamengo estão fazendo da lição de casa e reduzindo consistentemente este prazo.
Do outro lado, destaque para o Corinthians, que depois de 3 anos com prazo bastante superior aos 45 dias, está enquadrado e pagando os tributos em dia.
Comentário do OCE – Qualquer futuro passa pelo pagamento das dívidas
No decorrer desse ano, desde a publicação dos balanços dos clubes no final de abril, o assunto Dívidas teve muita presença na mídia. É natural, pois a água chegou ao queixo e em alguns clubes ela bate na testa.
Solucionar os monstruosos passivos deixados por administrações absolutamente irresponsáveis é a condição primeira – e única, se pensarmos a fundo – para que nossos clubes de futebol voltem a ter esperança de futuro.
Exagero meu? Longe disso, muito longe, pois é visível até para o mais desavisado torcedor que o torniquete das contas que têm que ser pagas fica mais e mais apertado. Foi pensando nisso que, desde o primeiro momento, derramei-me (até exagerei um pouco em alguns momentos) em elogios à atual gestão do Flamengo. Por tudo que vi dos atos, da prática dessa diretoria, essa visão de futuro e do que é necessário hoje está muito clara para todos: para ter futuro o Flamengo precisa pagar o que deve. Se não pagar 100%, solucionar 100%. Ou seja, pagar o possível, renegociar o possível e, fundamental, pagar o que foi renegociado.
Decisões desse tipo comprometem, inevitavelmente, o futebol e são antagônicas à fome, à ânsia por títulos que tem todo torcedor brasileiro. Infelizmente, não há como conciliar essas duas metas. Enquanto estiver pagando as dívidas, um time até pode conquistar um título ou outro, mas, acreditem, isso será fruto de uma combinação muito feliz de um elenco de custo baixo que encaixou à perfeição no campo e que, nos vestiários, convive sem crises, sem dramas, sem ciúmes. Ao mesmo tempo, dependerá de bons cruzamentos (nessa realidade, títulos são menos difíceis em torneios eliminatórios) em fases iniciais, ganhando fôlego e a sagrada confiança tão decisiva para uma final.
Dito isso, o mais provável é que um clube passará por um período de vacas magras e, fundamental, precisará contar com o suporte de seu torcedor nessa fase. Suporte financeiro, não somente a presença no estádio. O grande craque dessas fases é um jogador que não calça chuteira e não entra em campo: a Paciência. A propósito, leiam ou releiam o que disse no post anterior sobre as divisões e sobre os garotos que chegam aos “times de cima”. Se houver paciência com eles, e carinho, as respostas virão e, com elas, menos dificuldade para o clube cumprir seus compromissos financeiros.
Sozinha, porém, pouco fará a Paciência, pois precisará da companheira Determinação que estará jogando nos bastidores, na direção firme do clube, sem se deixar levar por cobranças de torcida e sócios.
Difícil, né?
A próxima aprovação – finalmente! – da Lei de Responsabilidade Fiscal no Esporte, que substituiu o famigerado Proforte, será um alívio para os clubes mas, por si só, nada solucionará. Se não mudarem o texto do Deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), os clubes terão uma boa facilidade inicial, que será pagar 50% do que deveriam. O restante ficará para ser pago no final do acordo. Boa ajuda, mas nenhuma ajuda externa funciona se o próprio organismo ajudado, biológico ou social, não fizer seu próprio esforço e colaborar para sair do buraco.
Esse ano corrente está difícil. Em muitos clubes os atrasos nos pagamentos viraram quase uma rotina, assim como rotineiras foram as negações desses atrasos por parte de dirigentes. Alguns ainda tiveram o desplante de dizer que os salários estavam em dia, “só” os direitos de imagem estavam atrasados. Ora, direito de imagem é salário, não existe essa diferenciação. Só em cabeça de dirigente que não cumpre o combinado.
A próxima safra de balanços não será muito animadora, a exemplo dessa atual.
O levantamento do portal GloboEsporte.com mostra um público médio de 15.749 torcedores pagantes por partida do Brasileirão 2014. Melhorou, mas ainda é baixíssimo. O porquê disso é outra história, longa história, controversa história. De um jeito ou de outro, porém, com os times jogando bem ou mal ou mesmo muito mal, será fundamental a participação do torcedor para ajudar seu clube a sair do seu próprio buraco. Como vimos nas tabelas acima, os valores devidos são elevados e, no caso dos tributos, a maioria dos clubes continua pagando-os em prazos longos, demonstrando que seus caixas estão comprometidos.
Essa história de ajustes e controles, de “ficar tudo ruim” para melhorar depois, é absolutamente verdadeira. Na nossa vida pessoal, na vida dos clubes e de empresas e na gestão pública, também. Não existe “contabilidade criativa” que dê jeito nisso. Não existe “heterodoxia” que resolva. Nesse ponto, diga-se, nossos clubes e nosso país estão em pé de igualdade: todos precisando de ajustes, controles e, inevitavelmente, grandes doses de sacrifício. Não importando quem está no comando e quem está na torcida.
Fonte: Olhar Crônico Esportivo