Gastar menos do que se ganha é uma das regras básicas para uma economia saudável. Os clubes brasileiros, contudo, parecem não ter aprendido esta lição. Um estudo realizado pelo Itaú BBA, braço do banco Itaú, mostra que as finanças da maioria das agremiações nacionais agonizam com velhos problemas. Com o título “2013: Dinheiro na mão é vendaval”, o levantamento de mais de 150 páginas avalia os dados econômicos da última temporada (divulgados pelos próprios clubes), reprova a política de gastos e avisa: um dia a conta chega.
Itaú fala em Flamengo fazendo a coisa certa, mas com riscos.
“Vimos por dois anos uma evolução das receitas, algum controle de custos em 2012 – talvez porque não tenha havido tempo para gastar –, algum investimento em base, controle das dívidas, mas isto tudo foi posto a perder em 2013. Não é por acaso que, ao longo do ano, e mais fortemente em 2014, surgiram informações na mídia de atrasos de salários em muitos clubes”, relata o estudo.
De acordo com o levantamento, em 2013 houve um crescimento de 9% na receita bruta total dos clubes. O número é bastante inferior ao observado nas últimas temporadas. Em 2012, a renda dos clubes subiu 31%. No ano de 2011, o aumento foi de 28%.
Além disso, o estudo, ao desconsiderar as receitas obtidas com vendas de direitos econômicos, aponta que não houve crescimento de 2012 para 2013. A exclusão dos dados tem como objetivo prever a real tendência orçamentaria dos clubes, já que a negociação de jogadores ocorre de forma incerta e não pode ser encaixada em uma projeção de finanças anual. Esse valor foi R$ 260 milhões e registrou um considerável crescimento de 65% em comparação com 2012. As vendas de Neymar para o Barcelona e Lucas para o PSG foram determinantes para o número e correspondem a 70% do total.
Publicidade (que teve evolução de 13%) e bilheteria (36%) ajudaram no crescimento na arrecadação dos clubes na temporada passada. O estudo observa que a inauguração dos estádios para a Copa do Mundo foi determinante para a elevação da taxa de público nos jogos. Além disso, relata que, para atrair torcedores, a qualidade dos times e o fator decisão são mais importantes do que o preço dos ingressos.
“Bilheteria teve forte impacto da entrada em operação de novos estádios, como o novo Mineirão, que serviu de palco para a final da Libertadores com o Atlético-MG e uma renda na casa de R$ 14 milhões, e o Maracanã, que teve elevados públicos nos jogos do Flamengo pela Copa do Brasil, a preços elevados. Além disso, o Cruzeiro campeão brasileiro também lotou o Mineirão a preços altos. Ou seja, há uma baixa correlação entre preço do ingresso e público no estádio, ao mesmo tempo em que há forte correlação entre público no estádio e qualidade da equipe”, argumenta.
Se o faturamento teve um crescimento tímido, os gastos aumentaram em 16% na temporada passada.
“Desta forma os clubes se colocam em situação de risco. Contratam muito e mal, investem pouco em categorias de base, carregam atletas caros e de pouca efetividade, montam elencos desequilibrados e dependentes de receitas extraordinárias. Mas o círculo vicioso está criado: com elencos desequilibrados, os times não atuam bem, os patrocínios não retornam – Santos e Palmeiras estão há mais de um ano sem patrocínio master -, o torcedor não vai ao estádio, a venda de atletas fica mais difícil e, no fim do dia, faltará dinheiro”, conclui o estudo.
CLUBES NA BERLINDA
Além de avaliar o quadro geral, o estudo do Itaú BBA também individualiza a situação financeira dos principais clubes. Para a grande maioria, a projeção de futuro não é otimista, o que se reflete no título de cada capítulo. Para o Bahia, coube o texto “Atenção de todos os santos”; para o Grêmio, “Avalanche”; e no São Paulo, “Na vala comum”.
O Flamengo recebe avaliação positiva do levantamento, apesar de se destacar que a análise é limitada por falta de dados completos relativos a 2013. A receita do Rubro-Negro cresceu na última temporada, e as despesas permaneceram estáveis. O bom desempenho rendeu o título “Nadando contra a maré”.
“O Flamengo está no caminho certo, mesmo que isto signifique alguns anos longe dos títulos, o que afinal vinha ocorrendo antes mesmo desta reorganização do clube. O difícil é domar a torcida, porque haverá oscilação e riscos no meio do caminho. O Flamengo fez a coisa certa”, aponta.
O Corinthians é abordado no capítulo “Encantador de serpentes”. Segundo o estudo, o Timão apresentou em 2013 um desempenho bastante inferior ao dos últimos anos, o que acende um sinal de alerta no Parque São Jorge. Houve queda nas receitas da ordem de 12%, além do reconhecimento do atraso no pagamento de impostos nas últimas temporadas. O levantamento faz uma previsão de que o Alvinegro precisará reduzir investimentos, incluindo a aquisição de jogadores pra reforçar o time.
Em crise financeira com salários e direitos de imagem atrasados, o Botafogo é retratado no estudo como clube “em situação dificílima”. Em 2013, as receitas cresceram 25%, enquanto as despesas aumentaram mais que o dobro: 58%.
“Não é possível um clube que tem como Receitas Recorrentes algo da ordem de R$ 100 milhões ter Custos e Despesas da ordem de R$ 160 milhões! É impraticável. E por isso vemos os protestos de atletas contra a falta de pagamentos de salários. É praticamente impossível que sejam pagos, exceto se houver novas vendas, novos adiantamentos – que farão falta no futuro – exceto se a gestão corte custos. Não dá para gastar mais do que se arrecada”, diz o texto.
Outro clube em dificuldade financeira é o Palmeiras. Recentemente, o presidente Paulo Nobre precisou emprestar dinheiro para saldar as dívidas da agremiação. O fato não passou despercebido.
“Considerando que o clube continua sem patrocínio master, que as demais receitas permanecem estáveis e que o clube não é um grande vendedor de atletas, resta ajustar os custos para tentar fazer com que sobre mais dinheiro no caixa. Mas é ano do centenário, e, na avaliação equivocada dos dirigentes, em anos assim o clube precisa vencer mais que em outros. Resultado esperado é aumento dos custos, política descontrolada de gastos e mais problemas no futuro. O Palmeiras se mantém no círculo vicioso e 2014 tem todos os ingredientes para ser mais um ano difícil em termos financeiros. Até quando o presidente colocará dinheiro no clube?”, questiona o levantamento.
Fonte: GE
Compartilhe este artigo
Deixe um comentário