Sempre que ouvia relatos de seu pai sobre a história do Flamengo, o pequeno rubro-negro procurava pôsteres, fotos, o que fosse, para ilustrar sua imaginação. Certo dia, ouviu falar sobre um jogador que não conhecia. Caçou, revirou todos os seus recortes e colagens dos títulos de 1978 a 1983, a “Era de Ouro” tão comentada pelo pai, e não encontrava nada. Geraldo, o Assobiador, era um ídolo sem rosto, um nome que não teria qualquer referência na mente da criança, não fosse pelo som que lhe rendeu o apelido, e que o fez continuar a escutar o pai.
O assobio definia bem a postura de Geraldo dentro e fora de campo. Elegante, fino, harmonizava com a fragilidade física e o jeito mais improvisado de outro jovem que despontava na Gávea, um tal de Arthur Antunes Coimbra. Dono de habilidade admirável, era criticado por parecer descompromissado com o time e por conta da vida badalada fora de campo.
Na comemoração pelo aniversário de 40 anos do título Carioca de 1974, o único de Geraldo pelo Flamengo, mais uma vez seu nome foi lembrado. Entre tantos outros que não puderam receber a camisa, seu uniforme chamou a atenção do infante. Procurando entre memórias antigas de seu pai, achou o jornal “Urubu”, de julho de 76, com uma coluna que aconselhava o meia a não perder a cabeça e se concentrar, um mês antes de seu falecimento trágico. “Você não é um João-das-Couves qualquer. É a esperança de uma multidão rubro-negra, que deseja sempre te aplaudir e adorar, não criticar”.
O pequeno flamenguista então descobriu que um acidente médico cortou a vida dele aos 22 anos, em agosto de 1976. Foi um rosto que deixou de figurar entre as fotos da equipe tantas vezes campeã que conquistou o mundo pelo Flamengo. Não havia nos pôsteres o sorriso desconfiado de Geraldo. As voltas olímpicas foram menos felizes e a rotina na Gávea perdeu uma trilha sonora inconfundível. Foi um nome que se apagou das faixas, para vagar pelas lembranças imaginárias de cada rubro-negro, incluindo a criança que acabara de ouvir sobre ele.
Geraldo, o Assobiador, não era mais um jogador na história do Flamengo. Era a esperança da torcida na mesma geração de Zico. A carreira e a vida de Geraldo tiveram a duração de um sopro de assobio. Mas que som bonito ele devia ter.
Fonte: ESPN F.C.