“Se arrumarem o Flamengo, amigo, acabou o futebol brasileiro”. Na mesma semana em que o Flamengo assinou com a Confederação Brasileira de Clubes para receber R$ 5,4 milhões da Nova Lei Pelé, o ex-presidente do Atlético Mineiro, Alexandre Kalil, alertou sobre o risco de uma reorganização do Fla. Esse medo, baseado numa estrutura disforme, em que a organização de um clube pode ser prejudicial, só existe por um péssimo hábito de nossos cartolas, incluindo os rubro-negros: a incrível dificuldade para agir em conjunto e construir um diálogo entre clubes rivais.
É difícil imaginar Paulo Nobre e Carlos Miguel Aidar, presidentes de Palmeiras e São Paulo, sentando para discutir alterações na esdrúxula fórmula do Campeonato Paulista, principalmente após a negociação que levou Alan Kardec para o Morumbi. Ou ainda o próprio Kalil concordando com Gilvan Tavares, presidente do Cruzeiro, para melhorar o estadual de Minas Gerais, após trocarem farpas publicamente e Kalil dizer que estava “cagando” para o rival.
Cada vez mais, os dirigentes de clubes do Brasil lançam mão de decisões de curto prazo, com direito a vários conflitos de bastidores com seus adversários, deixando um ambiente desconfortável para ações conjuntas dos mesmos. Daí resultam o jogo duro para disputar partidas no estádio do adversário, leilões e salários astronômicos para jogadores e técnicos medíocres, além de qualquer outra complicação que possa ser imposta ao rival. É um dos principais motivos pelo qual temos um alto endividamento dos clubes, que parecem começar a ver só agora o quão fundo é o buraco em que se meteram.
Com baixos públicos e futebol ruim, o que tem mantido o Brasileirão minimamente interessante é o seu equilíbrio. Adotando ações mesquinhas (como comemorar ter passado a perna num rival), os clubes estão assumindo uma postura autodestrutiva, que põe em risco até mesmo esse equilíbrio. É muita gente se preocupando apenas com a superioridade do próprio time para pouquíssimos com o fortalecimento do futebol brasileiro como um todo. A diferença abismal na divisão dos direitos de TV e a aprovação de uma Lei de Responsabilidade Fiscal no Esporte que não exige medidas disciplinares de gestão nos clubes são apenas consequências danosas desse modus operandi.
A estabilidade e a saúde financeira de um time com o potencial do Flamengo deveriam ser motivos para impulsionar uma liga minimamente organizada. Se o futebol brasileiro corre risco, como Kalil disse, não é pelo que ocorre no Fla, mas pela estrutura insustentável que cartolas como ele criaram nos últimos anos. Não adianta fingirem que não têm capacidade de mudar esse panorama. Têm. Nem que seja se unindo a rivais para formar um futebol mais justo.
Fonte: ESPN F.C.