Magia Rubro-Negra – Já perdi a conta de quantas vezes toquei no tema do preço dos ingressos do Flamengo e de quantos amigos perdi por conta disso. Ninguém deve ter sido tão enfático quanto eu na defesa da política de elevação dos preços, por mais impopular que ela possa parecer. Hoje está na moda elogiar a recuperação financeira do clube e a compreensão da torcida com o momento peculiar que atravessamos. Poucos, no entanto, se lembram que um dos pilares dessa recuperação – talvez até o mais importante – vem justamente da capacidade que o clube teve de fazer da bilheteria uma fonte de arrecadação relevante.
Passei dois anos com gente me olhando de forma enviesada pela minha apaixonada defesa dos ingressos mais caros. Portanto, estava certo de que, anunciada uma redução substancial manu militari desses preços para o Carioca, todos os que me apedrejaram agora exultariam de felicidade.
Como é difícil compreender a alma humana! Ao meu redor não vejo ninguém feliz com essa redução. Vejo, ao contrário, uma revolta profunda com a decisão.
De certa parte, revolta muito mais do que justificada. A decisão da Federação, longe de querer agradar ao torcedor, foi feita sob medida para atacar a estratégia adotada pelo Flamengo nesses 2 anos.
Um dos pilares da nossa recuperação financeira (ainda longe de completar seu curso, sempre bom lembrar) foi, como eu disse, ingressos mais caros. O outro, o programa de Sócio Torcedor. Ambos estão umbilicalmente ligados. O Flamengo conseguiu praticar com eficiência dois preços bem diferentes. Quem vai pouco ao estádio paga caro. Quem vai muito tem a opção de pagar mais barato (em muitos casos, 25% do preço original), desde que não se importe em pagar uma mensalidade para ter esse benefício.
É verdade que muitos sócios torcedores o fazem apenas por vontade de colaborar, mas há uma parcela que se imagina expressiva que paga a mensalidade em busca do benefício do desconto. E se não há desconto, não há razão para continuar no plano (ou nele ingressar), que passará a ser um sobrepreço bem significativo.
Teve gente que riu quando Eurico Miranda foi eleito e cravou que o Vasco entraria em declínio rapidamente. Eu não achei a menor graça. Eurico se movimenta como ninguém nos subterrâneos do futebol, habitat natural das figuras mais abjetas. E, mais do que isso, se alimenta de um ódio profundo ao Flamengo, reputando como sua missão causar o máximo de desconforto para nós.
O resultado está aí, aos olhos de todos: valendo-se da desculpa de melhorar a frequência de público do campeonato, impôs uma medida com endereço certo, visando enfraquecer o Flamengo naquilo que hoje temos de melhor, que é a capacidade de gerar receitas novas e com elas ensaiar uma pujança invejável.
Ora, diante de um plano tão mesquinho, toda revolta é pouca. Até aqui, #tamojunto.
Mas..
Não somos Euricos. Não raciocinamos com o fígado e nem com o coração. Se chegamos até aqui melhores do que estávamos antes é justamente porque agimos de forma racional, estratégica e planejada. Portanto, é nosso dever manter a calma e analisar a questão sob outro ângulo que não seja a rivalidade de araque.
Eu tive a curiosidade de comparar os jogos de Flamengo x Vasco em duas edições recentes do Carioca: ano passado e em 2012.
Por que 2012?
Porque foi a última temporada antes da nova direção, portanto antes da implantação da política de preços. E sendo duas temporadas tão próximas, enfrentavam o mesmo processo de desgaste do campeonato estadual no imaginário do torcedor. Sendo que em ambos os anos o Flamengo estava envolvido com a disputa da Libertadores, com o agravante de que em 2012 o Vasco também participava da copa intercontinental. A única diferença é que em 2012 o Maracanã ainda estava fechado e os jogos aconteciam no Engenhão.
Dito isso, vamos aos fatos. Em fevereiro de 2014 os clubes jogaram no Maracanã para 13,2 mil pagantes. E em fevereiro de 2012 tivemos 21,5 mil pagantes no Engenhão. Considerando que o Engenhão foi apontado como um dos vilões da fuga do público, era de se esperar que o jogo no Maracanã tivesse mais gente, mas não foi isso que aconteceu.
Ora, se os jogos aconteceram sob as mesmas condições (no mesmo mês, em um campeonato desprestigiado, concorrendo com a Copa Libertadores) e um tem tão menos público que o outro, mesmo sendo disputado em um estádio mais central e muito melhor, a conclusão óbvia é que o preço cobrado deve ter tido uma grande influência na decisão do torcedor de ir ou não ao estádio.
Em 2014 o ticket médio do Maracanã ficou em R$ 64,8. Em 2012, no Engenhão, foi de R$ 27,46. Parece um tanto óbvio que o preço é mesmo uma variável importante na tomada de decisão de ir ou não ao estádio.
Nem deveria ser diferente, aliás. Baixar os preços é uma estratégia clássica de qualquer segmento para aumentar as vendas quando algo vai mal. E, convenhamos, o campeonato carioca vai muito mal.
A partir daí entram outros componentes na equação: o elevado custo do Maracanã (inexistentes em 2012) e os jogos contra times pequenos, que levam pouca gente ainda que se cobrasse quase nada por eles (Flamengo x Madureira tiveram 2,8 mil pagantes em 2014 e 4,3 mil em 2012).
O que a decisão da FERJ sinaliza é que esses jogos não podem mesmo serem jogados no Maracanã, diante do peso imposto pelo Consórcio que hoje o explora (no bom e no mau sentido). Se jogados em Moça Bonita, Volta Redonda ou Macaé, o prejuízo minimiza e o público até melhora um pouco.
Como o Consórcio é um dos vilões dessa história, causa estranheza que esteja tão irmanado ao Flamengo na defesa da posição de resistência. Afinal, não passamos 2 anos ouvindo que o Maracanã é a mais cara das novas arenas, graças à gula do Consórcio?
E o que dizer do Fluminense, que divulgou uma nota metida a engraçadinha? O Fluminense jogou no Maracanã ano passado – sim, ano passado – cobrando R$ 10,00 por partidas no campeonato brasileiro. Não consta que tenha invocado Chico Buarque ou o Pequeno Príncipe para justificar esse ato. Pareceu, simplesmente, que baixar os preços era uma boa estratégia para levar mais gente ao Maracanã – e levou mesmo.
Volto a dizer, sou defensor incondicional da política de preços praticada pelo clube e do seu direito de fixar livremente o valor que acha adequado por suas apresentações. Mais ainda: do direto de instituir descontos em favor dos que pagam mensalidades, como é o meu caso.
Porém, sinceramente não acho o fim do mundo ter que jogar 15 partidas a preços mais em conta. Estimando um ticket médio de R$ 30,00 para os clássicos, seriam necessários 28,6 mil torcedores para igualar a renda de 2014 de Flamengo x Vasco. E de R$ 15,00 para os jogos contra os pequenos, precisaremos de 7,8 mil torcedores para igualar a renda de Flamengo x Madureira.
Ou seja, não é nada impossível. E se a redução dos preços realmente resultar em um aumento da frequência de público para um campeonato cambaleante, menos mal. Vamos para o jogo, que é o que importa.
Walter Monteiro