Fonte: GE
Após muitos debates e polêmicas, o Plenário da Câmara dos Deputados finalmente aprovou nesta quinta-feira o novo texto da MP do Futebol, que refinancia as dívidas dos clubes de futebol com a União – estimadas em cerca de R$ 4 bilhões – em troca de novas regras de gestão, incluindo o chamado “fair play” financeiro, que prevê o rebaixamento de inadimplentes. Transformado em Projeto de Lei de Conversão (PLV 10/2015), o relatório do deputado Otávio Leite (PSDB-RJ) foi a base do texto. Porém, sofreu alterações por conta de uma emenda aglutinativa, articulada por parlamentares ligados a clubes e CBF. A MP segue agora para apreciação no Plenário do Senado, onde precisa ser aprovada até o dia 17 de julho, ou perderá a validade.
Assinada pelo deputado Jovair Arantes (PTB-GO), membro do conselho deliberativo do Atlético-GO, a emenda aglutinativa fez modificações em relação ao relatório original, aprovado em comissão mista. O limite de gastos dos clubes com o futebol subiu de 70% para 80%, além de alterações nas regras de redução de déficit financeiro aplicadas. Outra mudança foi a retirada do artigo que transformaria a seleção brasileira em patrimônio cultural – o que colocaria a CBF na mira do Ministério Público.
Ponto que gerou bastante polêmica nos últimos dias, a alteração nos colégios eleitorais das federações estaduais, que daria mais poder aos clubes grandes, também foi retirada. Em contrapartida, ficou mantida a inclusão dos clubes da Série B no colégio eleitoral da CBF – atualmente, votam apenas clubes da Série A e das federações.
Apesar das mudanças promovidas pela emenda aglutinativa, continuam no texto artigos polêmicos, que também vinham sofrendo influência de alguns dirigentes para serem retirados. O principal deles trata da exigência de apresentação da Certidão Negativa de Débitos (CND) para disputa de campeonatos, com uma flexibilização para os casos em que tramites burocráticos atrasem a emissão do documento. De acordo com a MP, os clubes que não apresentarem os comprovantes de pagamento seriam automaticamente rebaixados para a divisão inferior. Também seguem previstas punições de dirigentes que cometerem gestão temerária, que seriam responsabilizados e ficariam inelegíveis por 10 anos.
– A aglutinativa não afeta a essência do projeto. Apenas um ponto eu gostaria de aprovar, e não consegui, que era a alteração no quórum das federações. Mas em contrapartida, consegui aprovar uma providência completamente inovadora. O próximo presidente da CBF não será mais eleito pelas federações e a Série A. Entra, no mínimo, a Série B. Isso é algo importante. CBF, clubes, federações, todos serão obrigados a uma prática de gestão transparente, democrática, com uma série de regras – avaliou o relator Otávio Leite (PSDB-RJ), após a sessão.
Concluída a votação na Câmara, o texto segue para o Senado. Caso seja feita alguma alteração de mérito pelos senadores, terá que voltar ao Plenário da Câmara. Por ser derivado de uma Medida Provisória, que tem prazo de 120 dias para tramitação no Congresso, o agora PLV precisa ser totalmente aprovado até o dia 17 de julho para ser remetido à sanção da presidente Dilma Rousseff e se transformar definitivamente em lei.
CBF aprova; presidente do Fla lamenta queda de mudança nas federações
Mesmo com o texto alterado, o secretário-geral da CBF, Walter Feldman, que fez questão de acompanhar a votação em Brasília, se mostrou ainda insatisfeito com alguns pontos, como a mudança no colégio eleitoral da entidade máxima do futebol brasileiro. Porém, considerou positiva a aprovação da MP.
– A única coisa que não concordamos é em haver por lei alteração no sistema de organização do futebol. É isso que discordamos por uma questão constitucional. Mas na reunião da mudança estatutária, nós mesmos já discutimos a adição dos clubes da Série B no colegiado. Então, como a tendência é que isso já aconteça, não há problema – disse Feldman.
Um dos dirigentes mais ativos nas discussões sobre a MP em Brasília, o presidente do Flamengo, Eduardo Bandeira de Mello, destacou boas medidas presentes no texto aprovado. No entanto, lamentou profundamente a derrubada do item que mexia nos colégios eleitorais das federações.
– Acho que é um avanço, a medida tem vários pontos positivos, como medidas de responsabilidade, exigência de CND, redução do déficit, controle dos gastos com o futebol em 80% do orçamento. São vários pontos positivos. Mas ficou um gostinho de água no chopp porque a democratização das eleições nas federações foi suprimida em cima da hora apesar de ser objeto de um acordo feito, que foi descumprido. Agora, as eleições nas federações continuam naquele sistema arcaico que vem prevalecendo – avaliou Bandeira.
Deputado federal, o ex-presidente do Corinthians, Andrés Sanchez (PT-SP), foi outro que viu a aprovação do texto como um passo positivo. No entanto, disse que poderia ter ido ainda além e garantiu que o clube paulista não irá aderir ao refinanciamento por já estar inscrito em um Refis do governo federal.
– O texto foi positivo, mas acho que podia ter avançado um pouco mais em algumas coisas, como os colégios eleitorais das federações. Para uma MP negociada com todas as partes, até que não foi ruim. Mas deixamos de dar alguns passos, infelizmente. O Corinthians vai aderir tudo que entrar no regulamento, mas não vai entrar no refinanciamento da MP, porque as regras não são muito diferentes das do Refis que aderimos há seis meses – afirmou Sanchez.
Bom Senso: “Foi um avanço, mas ainda temos muito a evoluir”
Representantes do movimento Bom Senso F.C., que também participaram ativamente dos debates em torno da MP, seguiram a mesma linha de Bandeira de Mello e Sanchez: consideraram a aprovação do texto um avanço, mas lamentaram as alterações realizadas na reta final.
– É um avanço enorme do ponto de vista da gestão, do fair play financeiro, trabalhista, na transparência e na governança dos clubes. Talvez, nunca tenha tido um avanço assim. É preciso reconhecer a participação da sociedade como um todo, dos torcedores que pressionaram os parlamentares, do Bom Senso, com todos os atletas que defenderam a reforma no futebol brasileiro. Mas, no fim, fica um gosto amargo pelas mudanças feitas pela influência da bancada da bola. Foi um avanço, mas ainda temos muito a evoluir – afirmou o diretor-executivo do Bom Senso, Ricardo Borges.
Além da renegociação das dívidas e das contrapartidas, o novo texto da MP do Futebol aborda ainda diversas outras questões ligadas ao esporte em geral. São temas como a criação de novas loterias associadas aos clubes, regras para o pagamento de direitos de imagem aos jogadores e atuação de agentes esportivos, além de prorrogação da Lei de Incentivo ao Esporte e criação de um seguro obrigatório para atletas, motivado pelo caso da ex-ginasta Lais Souza.
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