Ele vai voltar. Meu corpo todo agradece de amor, de prazer, de êxtase com o anúncio do jogo do Flamengo no Maracanã. A volta do Pacaembu na madrugada chuvosa do último domingo pela Dutra potencializou minha saudade. O Maracanã faz de nós torcedores e torcedoras melhores. É como se apenas ali, naquele templo de histórias infinitas, de paixão sem limite, de força sobrenatural, parece que só ali, somos ainda mais Flamengo. Lembro das histórias que escutei quando as organizadas ainda tinham salas no estádio. Dos torcedores que DORMIAM por lá para preparar a festa no dia seguinte.
Penso naqueles torcedores-magos-mágicos que viram o amanhecer do Maracanã para montar os maiores mosaicos do mundo. Me arrepio de ter visto, vivido, aplaudido e chorado de alegria com aquilo. Lamento por aqueles que não brincaram de tobogã nas arquibancadas antes do jogo começar, por aqueles que não viram o “mar se abrir” por conta de uma incompatibilidade na escalação e preferências dos torcedores. Tempos que a treta era à vera, olho no olho. Tenho vontade de abraçar os que não atravessaram aquele corredor escuro, empurrados por centenas de pessoas, e como numa visão celestial, se depararam com 90…100 mil torcedores em estado de graça. O céu era ali. Coisas que a gente só pode explicar quando ama. Tipo o dia que cismei de ir para estação de trem, para ficar lá de cima vendo a galera chegar. Quase fui massacrada. Mas vi. Senti. SobreVIVI.
Lembro de uma carta que um jovem poeta enviou para o Rilke, em 1903. Ele queria saber se os versos que escrevia eram bons. Assim como eu sempre me pergunto se essas coisas que faço pelo Flamengo são da mesma maneira…boas. O poeta respondeu: “Não há senão um caminho. Procure entrar em si mesmo. Investigue o motivo que o manda escrever; examine se estende suas raízes pelos recantos mais profundos de sua alma; confesse a si mesmo: morreria se lhe fosse vedado escrever? Isso acima de tudo: pergunte a si mesmo na hora mais tranquila de sua noite: SOU MESMO FORÇADO A ESCREVER? Escave dentro de si uma resposta profunda. Se for afirmativa, se puder contestar àquela pergunta severa por um forte e simples: SOU. Então construa a sua vida de acordo com esta necessidade.” Foi essa pergunta que me fiz na estrada: SOU MESMO FORÇADA A VER OS JOGOS DO FLAMENGO? Morreria se me fosse vedado estar perto do Flamengo? Morreria se me fosse vedado frequentar o Maracanã? Morreria se não pudesse ver o Flamengo jogar no Rio, em Volta Redonda, no Morumbi infiltrada, no Pacaembu, em Cariacica, em Curitiba? SIM, morreria. Sou mesmo forçada a ver o Flamengo. Logo, construí minha vida de acordo com essa necessidade.
O calor das cobertas, não me aquece direito. Já começo a sentir. Isso mesmo, SENTIR. Pessoas caminhando ao redor do Maracanã. Aquele mar de rubro-negros de todas as raças se esbarrando, se reconhecendo, se amando em silêncio, em festa, em canções. O churrasquinho, a cerveja gelada, as bandeiras, as buzinas, os gritos, a sintonia, a adrenalina, a chegada do trem. Voltar ao Maracanã é experiência filosófica. É puro Heráclito: É impossível entrar no mesmo Maracanã duas vezes. As águas já são outras e nós já não somos os mesmos, ou as mesmas. Estou preparada pra entrar nesse rio de novo. Não sou mais a mesma. Sou outra, ainda mais apaixonada pelo Flamengo. Ainda mais certa do hepta. As coisas, diria o Rilke ao jovem poeta e a mim, sobre a minha paixão e a dos meus 11 leitores: as coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis quanto se nos pretenderia fazer crer. Volta Maracanã. Vem viver outra vez ao meu lado, pois meu corpo está acostumado.
Pra vocês,
Paz, Amor e FÉ NO HEPTA.
Vivi Mariano
Fonte: República Paz & Amor