Existem finais e finais. Existem as decisões que juntam grandes times de lugares diferentes e existem as decisões de colocam em campo clássicos de milhões de torcedores. Ou melhor falando, O Clássico dos Milhões. Em tempos de Campeonato Brasileiro de pontos corridos, as chances de dois times de uma mesma cidade fazerem uma final que não seja de estadual são muito pequenas. E quando os dois times são os próprios antagonistas, os maiores rivais, água e óleo, essa final ganha contornos épicos, como foi em 2006, com Flamengo e Vasco da Gama decidindo o título.
Se a Copa do Brasil de 1990 concorreu com o Mundial da Itália, a versão de 2006 também teve intereferência da competição da Fifa. Porém, desta vez não houve jogo em data concomitante, apenas um hiato de um mês entre a semifinal e a finalíssima, o que fez muita coisa rolar no Flamengo. Mas antes de chegar lá, vamos relembrar como foi a caminhada rubro-negra até o bicampeonato.
O Flamengo vivia um momento conturbado em 2006. Fez uma campanha bem abaixo da média no Campeonato Carioca e, no Brasileiro do ano anterior, escapou nas últimas rodadas de um inédito rebaixamento. O time não tinha a confiança da torcida no início da temporada, mas na Copa do Brasil, pelo menos, o cenário era diferente. À medida que as vitórias vinham, o apoio aumentava. E quando viram, lá estava o Mais Querido em mais uma final. Aí, deixou chegar…
O começo
Tal como em 1990, a caminhada começou contra uma equipe de Alagoas. Mas desta vez não foi contra um apanhado de jogadores que se reuniram cinco dias antes do jogo. Foi contra o tradicional ASA de Arapiraca, conhecido por aprontar muitas travessuras na Copa do Brasil. E no primeiro jogo logo ficou a impressão de que fariam mais uma das suas. Jogando no estádio Municipal Arapiraca lotado até o último espaço, o Rubro-Negro saiu atrás. Aos 31 do primeiro tempo, Denílson abriu o marcador para os donos da casa. Daí em diante foi pressão dos cariocas, até Ronaldo Angelim (o único Ronaldo possível) achar o gol da salvação em bola sobrada na área, que Luizão cabeceou mal após cobrança de escanteio. O empate não foi bom e não eliminou o jogo de volta, no Rio.
No Maracanã vai ser fácil? Bom… Lembra que o ASA gostava de aprontar? Logo aos 14 minutos, Cascata (não é mentira) fez 1 a 0 para os alagoanos. Mas, com calma e com time bem superior, o Flamengo virou ainda no primeiro tempo, com Renato Silva e Peralta. Depois, tratou de administrar o resultado até o apito final.
Na rodada seguinte, volta ao nordeste, desta vez, Natal, no Rio Grande do Norte. O confronto era contra o ABC, outro time acostumado a perturbar a vida dos grandes. Novamente, jogo apertado, difícil, a bola teimava em não entrar, até que apareceu a figura de Ronaldo Angelim, o zagueiro-mito, para resolver os que os atacantes não faziam. Aos 32, ele recebeu cruzamento de Leo Moura na medida e, de peixinho, mandou para o fundo da rede fazendo o gol solitário da vitória. De novo, o Flamengo não eliminou o jogo da volta, mas não teve problema. No Maracanã, as jogadas fluiram e a vitória veio sem sustos, por 4 a 0, com Renato Abreu fazendo dois e o ataque se redimindo: Luizão e Ramirez marcaram nas chances que tiveram.
Goleada e relaxada
Nas oitavas de final, o adversário foi o outrora tradicional Guarani, de Campinas. O time paulista já começava a ensaiar uma má fase administrativa e técnica que lhe custou muito. E, em campo, o Flamengo não tomou conhecimento. Jogando no Maracanã, a primeira partida foi um massacre. O placar final acabou em 5 a 1 porque o juiz apitou o fim do jogo. Renato Abreu, com dois gols, Leo Moura, Juan e Obina foram os carrascos da noite. A exibição de gala do Rubro-Negro liquidou a fatura, transformando o jogo de volta em mero protocolo. Mesmo como Guarani vencendo por 1 a 0, o Flamengo jamais correu riscos de perder a vaga e já pensava no adversário seguinte, um velho rival.
Repetir a dose é importante
O Flamengo gostou do negócio de vencer bem a partida de ida e não tomou conhecimento do Atlético Mineiro no Maracanã. Com grande atuação de Renato Abreu, o Mais Querido atropelou os mineiros por 4 a 1, novamente decretando na ida que a volta não teria utilidade alguma. Renato fez dois gols, um aos 18 segundos do segundo tempo, e ainda viu Obina e Jônatas marcarem para garantir a vitória. Na volta, no Mineirão, um 0 a 0 sem grandes emoções serviu para carimbar o passaporte para a semifinal contra o time sensação da competição.
Mais pão de queijo?
O Ipatinga foi, em 2006, o que a Copa do Brasil tem de melhor. Ano sim, ano também, um time pequeno chega longe graças ao formato da competição e também devido a fatores que só o futebol explica. Nesta edição, o time da pequena cidade de 260 mil habitantes do interior de Minas foi indo, indo, eliminando o Botafogo com duas goleadas, indo mais um pouco, atropelando o Náutico com outras goleadas, aí foi, passou do Santos nas quartas, e quando se viu já estava na semifinal contra o Flamengo.
Mas se os mineiros tinham o fator surpresa, o Flamengo tinha o fator melhor do que Eto’o. Obna abriu o placar na partida de ida e foi peça importante na volta em casa, mas quem definiu mesmo foi Renato Abreu, mais uma vez. Com a vitória por 2 a 1 em casa, o fantasma estava devidamente eliminado e a taça seria decidida por uma final há muito aguardada.
Da beira do caos para a beira do campo
Flamengo x Vasco. Se já não bastasse toda a rivalidade, havia um gol do Rodrigo Mendes, um bi com direito a embaixadinha, um tri com o gol do Pet e mais três gols de Jean para apimentar ainda mais a decisão. De 99 a 2004, foram quatro decisões estaduais entre os dois times, todas com vitória do Flamengo no final. O Vasco não conquistava um título sobre o Flamengo desde 1988. Todo mundo queria ver esta decisão, o jogo que valeria por todos, a primeira vez que os maiores times do Rio se enfrentariam numa decisão nacional.
Mas tiveram que esperar dois meses para isso.
Graças à Copa do Mundo da Alemanha, Flamengo e Vasco passaram 60 dias treinando apenas, se focando na guerra que teriam pela frente. Quis o destino que os times tivessem esse tempo. Tempo que foi crucial para o Flamengo. Quando ninguém esperava, o treinador Waldemar Lemos foi demitido do clube e para seu lugar veio exatamente o técnico do Ipatinga, Ney Franco, derrotado pelo Waldemar na semifinal. O Brasil estava descobrindo um novo nome e Ney Franco aceitou o desafio de tentar o título logo em sua estreia.
Assim sendo, Flamengo e Vasco entraram em campo no dia 19 de julho de 2006, em um Maracanã desfigurado e pela metade por conta de mais uma obra, para a primeira batalha. O primeiro tiro do Mais Querido foi dado aos 14 do segundo tempo. Obina acertou um lindo chute e abriu o placar. A vantagem chegou, mas ainda era pouco. Dois minutos depois, Luizão ampliou, dando números finais à partida.
Uma semana ainda se passaria até o jogo derradeiro. Uma semana de Flamengo bem ao estilo mineiro de seu treinador, quieto e comedido, e um Vasco que buscava, com palavras, incentivar seu torcedor a acreditar no resultado. Prometiam tirar a diferença e que 2 a 0 não era uma vantagem tão grande assim. Mas aos 15 minutos de jogo, Valdir Papel, o atacante escolhido por Renato Gaúcho para tentar a virada, foi expulso prejudicando o time cruzmaltino. Com um a mais, o Flamengo se soltou e 10 minutos depois, Juan jogou a pá de cal na decisão, abrindo 3 a 0 no placar agregado e colocando mais um título sobre o maior rival na conta. Flamengo bicampeão da Copa do Brasil.
Fonte: Site Oficial