Arthur Muhlenberg: “Só as mães são felizes”

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Todos os times felizes são parecidos; os infelizes são infelizes cada um a sua maneira. Até quem acompanhou as ultimas 45 temporadas do Flamengo tem dificuldade em apontar um ano tão infeliz como 2017. Esse Flamengo que conseguiu a façanha de chegar à última rodada do campeonato sem ter feito o dever de casa de se classificar para a fase de grupos da Libertadores pode ser acusado de tudo, menos de não distribuir a infelicidade com notável equanimidade. Tem infelicidade em baldes para todos, jogadores, funcionários, cartolas e torcedores.

No choque frontal entre as altíssimas expectativas da torcida (adubadas por balancetes benignos, contratações vultosas e a natural megalomania rubro-negra) e a concretude da realidade restaram poucos sobreviventes entre as ferragens. E entre estes alguns respiram apenas por conta dos aparelhos, já estão com o pé na cova.

Não é pecado ou desculpa de aleijado mencionar o azar filho da puta que se abateu sobre o time na forma de contusões em série durante 2017. Um azar que, lamentavelmente, não se pode atribuir a este ou aquele pé-frio, seja dirigente ou jogador. Esse azar é coletivo, compartilhado igualmente por todos por ele atingidos. Mas a incontestável falta de sorte rubro-negra não encobre o verdadeiro motivo que originou a dramática atmosfera em que o Flamengo vive o final daquele que deveria ser o seu ano mágico: a evidente incompetência do Departamento de Futebol em entregar o que prometeu. O planejamento da temporada, a montagem do elenco, a relação com a imprensa, com a CBF, FERJ, AMALEBLON e com a torcida foram desastrosos.

É verdade que são poucos os planejamentos no mundo capazes de aguentar 2 frangos do goleiro no mesmo jogo, mas o simples fato do frangueiro contumaz ainda estar sendo escalado nas partidas mais decisivas do ano por absoluta falta de substitutos aptos denota o quão falha foi a montagem do elenco. Com o agravante para seus executores de ser público e notório o fato de que ao Flamengo não faltaram recursos na hora de ir às compras. Dinheiro houve, dinheiro houve. Gastou-se muito e gastou-se mal, vacilada típica do nouveau-riche.

Foi justamente a argentária ilusão de que bastava o saldo positivo na conta bancária para que o Flamengo dominasse o país, o continente e o mundo o principal combustível da devastadora desilusão que prostrou a maior torcida do Brasil. É até um pouco surpreendente que a cascuda torcida do Flamengo tenha caído nesse conto do vigário mais uma vez. Pisamos nessa casca de banana em 1995 com a chegada de Romário, Branco e Edmundo e as famosas engenharias financeiras que prometiam o milagre de trazer grandes jogadores para o Flamengo com o mítico “custo zero” e culminaram em uma temporada catástrofe onde o Flamengo só conseguiu ser campeão no Remo e no Basquete. Uma aventura inequecível cujo carnê ainda estamos pagando.

E poucos anos depois fomos iludidos pela lenda dos recursos infinitos da ISL, uma falcatrua internacional de grande calado que trouxe para treinar na Gávea, nem sempre com muito assiduidade, uma plêiade de jogadores de grande renome e nenhum compromisso com o clube. Mesmo sendo usado como um estúpido laranja por cambalacheiros sem nenhum escrúpulo, antes da casa cair o Flamengo conquistou um Tricampeonato Carioca e uma Copa dos Campeões. Glórias permanentes, é verdade, mas que decididamente não compensaram a decepção de um período que ficará marcado para posteridade pela pensata vampetiana “O Flamengo finge que paga e os jogadores fingem que jogam” e pelo presidente da época saindo de cena em um camburão. Maldita seja a International Sports and Leisure e seus tentáculos que ainda não foram em cana.

A dois parágrafos escrevi que era surpreendente que a torcida do Flamengo, com sua pátina de 122 anos de bons serviços, ainda caísse nessas lorotas, mas pensando melhor, nada mais natural que isto tenha acontecido mais uma vez. A torcida do Flamengo, sabidamente a mais inteligente do Brasil, não deixa de ser uma multidão. E toda multidão, não importando quantos PHDs alinhe em suas hostes, tem a inteligência e o discernimento de uma criança de 3 anos. Quando em comunhão rubro-negra os céticos acreditam em Papai Noel, os ateus imploram por graças de São Judas e os religiosos percebem a marca de Deus até nas caneladas de indisfarçáveis perebas. Portanto, enquanto torcida estamos perdoados pela otarice recorrente.

O que é, sim, surpreendente, é que homens adultos, designados para comandar os destinos do Flamengo segundo a razão e o bom senso, tenham também se deixado iludir pela ideia de que a mera ação gravitacional de nossa balança de pagamentos positiva seria suficiente para atrair taças e títulos para as galerias de troféus da Gávea. É bastante possível que Bandeira e seus vice-presidentes discordem veementemente de tal afirmação, mas na falta de elementos mais sólidos para análise, o que resta ao torcedor na hora de buscar culpados é se fiar no que a mídia lhe oferece.

E a história que a mídia tem contado, e até agora sem contestação oficial do clube, é que sob o comando de Bandeira e Rodrigo Caetano, e com a participação do CEO Fred Luz, se instalou no departamento de Futebol do Flamengo a absoluta certeza de que o trabalho vinha sendo feito da melhor maneira possível e que não demandava qualquer correção. Ainda que os decepcionantes resultados que se acumulam desde o primeiro semestre mostrassem exatamente o contrário. A imagem que se pretendeu passar foi a de segurança, confiança em um projeto para o futebol, mas a impressão que ficou foi a de arrogância.

Para piorar o enredo, o Flamengo, na figura do presidente, meteu o infeliz discurso de proteção aos jogadores antagonizados pela torcida. O que provavelmente foi pensado como uma ação motivacional, uma rede de segurança para o elenco, revelou-se um tiro no pé. Que causou uma ferida que nunca se cicatrizou, porque os ditos protegidos entregaram a rapadura vezes sem fim durante a temporada. Confirmando para quase todos o pior entendimento possível do discurso. Onde pensavam que estavam escrevendo tolerância e fechamento com o grupo a torcida leu conivência com a perebagem. Comunicação não é o que você diz, é o que os outros entendem.

Para a próxima temporada as mudanças na estrutura do futebol do Flamengo são inevitáveis. Mas as mudanças que poderiam ter sido feitas de maneira gradual e equilibrada em um ano eleitoral que costuma trazer grande instabilidade à equipe, agora serão forçosamente traumáticas. Contratos, projetos, parcerias, alianças e compromissos serão obrigatoriamente revistos, ainda que o Flamengo conquiste a Sulamericana. Uma conquista cada vez mais improvável diante dos últimos acontecimentos.

Todo os torcedores felizes são parecidos; os infelizes são infelizes cada um a sua maneira. A minha infelicidade não é por pensar que 2017 foi jogado fora. Hoje estou infeliz porque não consigo antever as mudanças radicais que precisam ser feitas para que 2018 não seja a mesma droga.

Mengão Sempre

Reprodução: Arthur Muhlenberg | Futebolzinho

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  • Já tivemos anos muito piores e contos do vigário também mas este é mais estranho e doloroso do que os outros porque fica aquele gosto amargo de que este seria diferente do outros

  • Tudo o que o Flamengo conquistou na gestão financeira não compensa uma das mais ridículas e patéticas administrações que eu já vi no futebol.

    2017 é o ano que a torcida acordou do conto do vigário.

  • Morre 2017!! Morre seu FDP!!!MORRE!

  • Quanto a essa PEQUENA GALERA que ainda OUSA defender esse FURALHA MENTIROSO, sugiro que compre um time e leve ele pra jogar

  • E esse CRETINO do FURALHA ainda tem a cara de pau de dizer que o grande culpado é o gramado da Ilha, no lance do 1° FRANGO contra o Santos. Crie vergonha nessa cara, GOLEIRO MENTIROSO, VAZA DO MENGÃO.

  • A minha infelicidade é ver o Flamengo sem espírito de Flamengo! É como se fosse outro time, chamado arame liso, sem garra, sem vibração. A torcida raiz foi limada, só restou o pessoal das selfies e redes sociais, que cantam pouco, e começam a cornetar na primeira oportunidade. Onde está o velho Flamengo?
    Arthur definiu muito bem com o “nouveau-riche”. Parece que não sabem como gastar tanto dinheiro, contratam muito mal. Jogadores medianos são supervalorizados e chegam caríssimos. A propaganda segue, e a torcida acredita por pura fé. Cair na real depois è a maior decepção, como aquele carro usado que voce comprou e só depois descobriu que foi um péssimo negócio. Aquele sentimento de ter sido feito de otário mesmo!
    Quanto a parte do azar, se vamos falar em superstição, então o pé frio é de EBM. Até gols nos ultimos minutos e combinação de resultados para ser eliminado tem ocorrido esse ano. Sim, essa série de lesões parece azar mesmo, parece uma carma dessa Flamengo, o universo conspira contra!

  • Certamente 1995 foi mais triste que 2017. E depois teve outros momentos bizonhos também. Escapar do rebaixamento na última rodada não se compara com ser eliminado da Libertadores e terminar o Brasileiro no meio da tabela.

    • Pensei a mesma coisa!

  • Que me desculpe o Rever em querer defender o muralha, mais ninguém aguenta mais.

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