O Flamengo nos recorda, com a licença do Galeano, que o melhor do mundo está na quantidade de mundos que o mundo contém. O Maracanã é o único lugar da vida que me faz sonhar e amar. Um espaço onde eu sou mais Flamengo do que eu sou eu. E não sou a única. Ali todos sãos mais Flamengo do que eles próprios. O bom é SER junto. E o nome disso é torcida. Torcida do Flamengo, claro. Quando somos mais do que nós mesmos, só que juntos. Mas eles tentaram, com louvor, nos tirar essa alma compartilhada rubro-negra com a política dos preços abusivos dos ingressos, que “renuncia à alegria, atrofia a fantasia e proíbe a ousadia”. Nós resistimos. Nos reinventamos. Cobramos. Eles cederam. E brigaram, pateticamente, entre eles para assumir a paternidade da decisão que deveriam ter tomado desde que assumiram o Clube mais popular do mundo. Mas fizeram exatamente o contrário. Deu no que deu. Não entenderam que dentro de cada jogador mora uma Nação que joga junto quando está junto. Mas quem não gosta de gente, não gosta de torcida do Flamengo.
Vi no rosto de uma menininha o nascer de uma paixão. Nos ombros do pai ela pulava, cantava, aplaudia, e se encantava com a festa da FAVELA. É o Flamengo do Paquetá, meu menino, minha pátria de chuteiras. Nele renovei minhas esperanças num Brasil melhor. Tem talento, alegria, paixão, tem comprometimento, tem disposição e tem ginga. O menino dança. A menina também. Ela quer pular as cadeiras da arquibancada. Quer abraçar desconhecidos. Quer gritar bem alto o mantra das nossas vidas: Mengooooooo. Mengooooooo. Mengoooooo. Eu volto a sonhar. O Flamengo me faz acreditar de novo na vida, no ser humano, na sociedade, na história, no amor. Olho para outro lado e escuto um outro diálogo. Também uma menina. O jogo está virando. Ela olha para o pai e diz: “Eu agora não sou mais Brasil. Só sou Flamengo. Eu sou fiel”. O pai ficou em choque. Eu também. Ela entendeu que o amor pelo Flamengo é mais forte que o amor pelo país, ou pelo parceiro ou parceira. O amor pelo Flamengo é mais forte que um contrato conjugal, a obrigação de fidelidade ao Mais Querido não admite nem sombra da suspeita da possibilidade de um deslize, evoco Galeano, hoje e sempre amém. Quanto mais me decepciono com as “coisas de Flamengo”, mais fortaleço meu amor por ele.
No dia da morte do meu pai a primeira coisa que fiz foi vestir um dos mantos sagrados que ele me deu. Avisei em casa: “Eu vou assim no enterro”. Escutei um “Deixa ela” vindo de algum lugar. Mas, nem que não deixassem, eu iria com o bem maior que herdei dele. E fui a única. No final é assim, só a gente com o Flamengo. O Flamengo com a gente. E nada mais. Ele dedicou sua vida TODA ao Flamengo. Até quando não estava mais tão consciente eu conversava com ele sobre os jogos. Eu ia falando, criando títulos, dando voz aos jogadores. Era minha maneira de mantê-lo vivo. Quando vi a cena da menina nos ombros do pai. Briguei com o meu ali mesmo no Maracanã. Num diálogo imaginário e sobrenatural. Expliquei que minhas reclamações agora tem expressão própria: cornetar. Cobrei jogadores “do tempo dele”. Contei que se eu soubesse que aquela cara bonitão que ele fazia a gente tirar foto entraria para história como o presidente mais vitorioso de todos os tempos, eu não teria fugido das fotos com o Márcio Braga para correr pela Gávea ou pela arquibancada. Contei, com muita vergonha, que segundo “eles” a torcida do Flamengo só vale para “aderir, comprar, clicar, compartilhar e curtir”. Consumir agora é torcer. Terminei a conversa com o apito final do juiz. Avisei ao meu pai…”daí de onde você está”: segue o líder.
O que o Flamengo quer da gente é coragem. E eu me perco nesse desejo dele. Em tempos de desilusão, decepção e dor ele me diz para ter fé na vida, fé no homem, fé no AGOSTO que virá. Sim, eu ainda sou uma garotinha, e só peço a Deus, e ao Flamengo, um pouco de Malandragem.
Pra vocês,
Paz, Amor e Segue o Líder.
Reprodução: Vivi Mariano | República Paz & Amor
É o texto mais lindo que já li nessa coluna!
Isso é ser Flamengo, belíssimo texto. Parabéns.