Coluna do Fla entrevista Dr. Alex Souto Maior, fisiologista e ex-Flamengo
Por: Leo José e Simon Lédo
Sobe o morro, Mengão! O Flamengo precisa enfrentar os efeitos da altitude duas vezes no Grupo E da Libertadores ao visitar Millonarios (COL), em Bogotá, e Bolívar (BOL), em La Paz. A logística e a preparação atípica são dois dos desafios para o time de Tite buscar bons resultados. Para entender melhor as especificidades das viagens, o Coluna do Fla conversa com Dr. Alex Souto Maior, ex-fisiologista do Rubro-Negro.
O Flamengo encara o Millonarios a 2.620 metros acima do nível do mar, logo na primeira rodada do Grupo E, em 02 de abril. 22 dias depois, o Mengo sobe ainda mais e vai aos 3.640 metros de La Paz para enfrentar o Bolívar, pela terceira rodada.
Dr. Alex Souto Maior projeta uma possível queda de rendimento do Flamengo nesses dois jogos. Isso porque, o fisiologista explica que os jogadores exigem mais dos músculos inspiratórios. No entanto, como o corpo dos brasileiros que vivem no nível do mar não acostumados com o ar rarefeito, o desgaste físico é maior.
“O ar é muito rarefeito, a bola fica com uma resistência diminuída e fica muito mais veloz. Dito isso, o sujeito tem a capacidade de inspiração reduzida. Isso porque, os músculos inspiratórios não estão treinados e acostumados para fazer uma inspiração profunda, forçada, que é característica do ar rarefeito”, explica Alex.
HÁ FÓRMULA PARA O SUCESSO?
Existem duas maneiras de se programar para jogos muito acima do nível do mar: chegar ao local do jogo horas antes de a bola rolar e tentar não sentir os efeitos da altitude ou ir à cidade da partida dois ou três dias antes para se habituar. Para Alex Souto Maior, a preparação ideal precisa começar desde o Rio de Janeiro, com treinamento inspiratório específico.
“Sempre falo do treinamento inspiratório. Esse treinamento ainda é muito negligenciado, de uma forma geral na alta performance, as pessoas não compreendem. Eu já tive um artigo publicado mostrando a eficiência desse treinamento no rendimento, principalmente em sprints, de atletas profissionais. Foi publicado em uma revista chamada Journal of Bodywork and Movement Therapies”, começa.
“Mostrei a eficiência do treinamento inspiratório, dos músculos inspiratórios, para eficiência da performance. Você pode trabalhar tanto com pressão negativa do abdômen, quanto com equipamentos próprios. É uma inspiração forçada, trabalhando importantes pontos, como diafragma, abdômen e músculos intercostais. Todos esses pontos são de inspiração e expiração”, completa o pós-doutor em fisiologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
EXECUÇÃO DO TREINAMENTO
Alex Souto Maior também aponta que a execução do treinamento é simples. Conforme a explicação, o jogador pode fazer o exercício no próprio CT do Flamengo, em duas semanas, já projetando os duelos na altitude.
“Período mínimo de duas semanas. É um treinamento simples, que o sujeito pode fazer ao chegar no clube. Cada equipamento de resistência inspiratória fica dentro da baia de cada jogador. Então a comissão técnica instrui o jogador a fazer, aproximadamente de 15 a 20 inspirações, e na segunda semana, 30 inspirações. E depois vai progredindo”, explica.
“É simples, o cara chega no clube, troca de roupa, pega o aparelho, bota na boca, faz o treinamento e depois segue o treino normal. É um treinamento bem particular, mas que dá um resultado incrível na performance e na captação de oxigênio. Ou seja, ele fica com a inspiração melhor”, completa Dr. Alex Souto Maior.
“TIRO NO PÉ”
O fisiologista também deixa claro que o planejamento de subir para a cidade do jogo horas antes da partida é um risco. Isso porque, o resultado pode ser positivo para alguns jogadores, mas a grande parte do elenco tende a sofrer mais.
“Essa questão de ‘vamos esperar para subir a algumas horas’… pode ter um efeito bom para alguns atletas, mas pode errar na maioria. Isso sempre vai da capacidade de treinabilidade do atleta. Alguns atletas se adaptam muito rápido, como normalmente se faz, ficando em nível do mar e algumas horas antes sobe para competir na altitude. Isso é um tiro no pé. A grande maioria sente os efeitos da altitude, e o desempenho cai de 15% a 25%, e aí perde o jogo”, diz Alex.
TEM COMO PREVER QUAL JOGADOR SENTE MAIS OU MENOS?
“Tem como prever (quem pode se dar melhor), analisando o resultado do consumo de oxigênio apresentado no teste de esforço máximo. E a partir desses resultados, você faz uma intervenção sobre essas ações. A principal hoje é o treinamento dos músculos inspiratórios. Não tem como um sujeito subir a altitude sem ter uma adaptação prévia à essa situação que ele vai encontrar, e essa adaptação pode ser pelo treinamento dos músculos inspiratórios”, detalha Alex Souto.
DOIS JOGOS EM ABRIL SOB EFEITOS DA ALTITUDE
O Flamengo encara o Millonarios na cidade de Bogotá (2.620 metros acima do mar) em 02 de abril e depois o Bolívar, em La Paz (3.640 metros acima do mar), no dia 24. Nesse espaço de três semanas, o Rubro-Negro tem as duas rodadas nas altitudes. Alex Souto Maior indica como o elenco deve se preparar para a sequência.
“La Paz vai ser pior. Bogotá a 2.620 metros é suportável. A partir de 3.000 metros, você tem uma queda de desempenho significativa, acima de 15%. Em Bogotá, a queda é de até 15%. Eu recomendaria uma semana de treinamento respiratório para o jogo em Bogotá e de duas semanas de treinamento para o jogo em La Paz. O ideal seria entre 15 e 30 inspirações máximas diárias com o equipamento apropriado”, pontua.
QUEM É DA ALTITUDE SE BENEFICIA JOGANDO NO NÍVEL DO MAR?
“Quando eles descem para jogar aqui, no nível do mar, é uma maravilha. Quer um exemplo clássico? Um cara que treina na altitude é como se tivesse uma mochila de 20kg nas costas todos os dias, mas quando desce a altitude, é como se tirasse essa mochila. Isso porque, eles têm os músculos inspiratórios muito treinados, adaptados”, explica o fisiologista ex-Flamengo.
TIME DE TITE É BEM TREINADO
Embora tenha os efeitos da altitude pela frente, o elenco do Flamengo é muito forte, ao menos na visão de Alex Souto Maior. Como acompanha de perto o Rubro-Negro, o profissional avalia que o time tem uma capacidade física muito grande: “O time do Flamengo é um time muito forte. A capacidade física do Flamengo prevalece no nível do mar. Eu olho o Flamengo como um time que vai brigar por todos os títulos. Flamengo vai ter um sucesso incrível”.
Além de enfrentar Millonarios e Bolívar, o Flamengo também tem o Palestino (CHI) no Grupo E da Libertadores. Entretanto, a equipe chilena joga em Santiago, cidade a apenas 570 metros acima do nível do mar, o que não representa nenhum desafio próximo às montanhas de Bogotá e La Paz.