Não dá para um técnico cair no Flamengo, o time ser o vice lanterna no Brasileiro e o fato não ser comentário geral. Para começo de conversa, acho que a nova diretoria do clube ainda não pode ser crucificada pois seis meses, é pouco tempo para ajeitar um clube com o nível de complexidade do Flamengo. Mas tampouco dá para passar a mão na cabeça de todos o tempo todo. Vamos lá: ela mostrou agilidade ao corrigir um rumo com a saída de Jorginho. Nem quero discutir a qualidade de um profissional de quem pessoalmente gosto e com quem sempre tive ótima relação nos tempos de jogador. Mas é inegável que houve uma correção de rumo. Afinal, foi a diretoria que o contratou. Se o contratou, e 14 jogos depois o demitiu, é, sim, uma correção de rumo.
Mas: com Dorival Júnior (demitido por ganhar demais), o Flamengo jogava e teve êxito na Taça Guanabara, jogando de acordo com o nível desse elenco: como time pequeno. Sim, porque se você tirar Marcelo Moreno (recém-chegado), Cáceres e Marcos Gonzalez, o elenco do Flamengo cabe em qualquer um dos pequenos do Rio. Dorival fechava o time lá atrás, marcava bem em seu campo, e saía em contra-ataque com muita velocidade, puxando lançamentos para a correria de Rafinha. O time perdeu a final num jogo em que foi superior ao Botafogo, e a direção não achou bom. Colocou Jorginho, com quem o time passou a jogar na base do toque de bola, sem ter talento em campo para isso. E não ganhou nem resfriado.
A diretoria precisa, decidir, o tamanho da mudança de rumo: se vai só trocar um nome por outro, ou se vai rever conceitos-pilares de sua gestão. Sobre o futebol, além de Jorginho, eu questiono muito quem trouxe Carlos Eduardo. Quem foi? Baseado em que? Por que ele ganha uma fortuna para ficar enrolando na lateral do campo? Por que foram trazidos Gabriel, Paulinho, Bruninho, nomes que juntando todos não dá um craque? Porque continuam titulares nomes como Léo Moura e Renato Abreu, não pelos brilhantes atletas que já foram, mas pelo quase nada que são hoje? Onde foram parar as pratas da casa, Adryan, Thomáz, Nixon, Rodolpho, que simplesmente sumiram até do banco de reservas? Por que profissionais caros, cujo trabalho é montar um elenco à altura do Flamengo, só montaram um elenco à altura de um time pequeno do Rio? Por que o Flamengo não mete medo no mais frágil dos adversários?
Desculpem-me, mas achar que buscar jogadores nos pequenos de São Paulo é uma fórmula beira a ingenuidade. Paulinho venceu no Corinthians porque é um craque de bola, não porque veio do interior. O mesmo vale para o sucesso de Ralf. O Flemngo já foi buscar David e Williams em São Paulo, mas foi campeão brasileiro em 2009 porque tinha Bruno, Léo Moura, Angelim, Petkovic, Zé Roberto e o Imperador. Assim como venceu o Estadual 2011 porque tinha Thiago Neves e Ronaldinho Gaúcho. Até onde me lembro, nenhum deles veio do interior de São Paulo.
Fora do campo, também tenho minhas reflexões a compartilhar com os comandantes rubro-negros. Tenho a quase certeza de que nenhuma empresa se interessa por estampar seu nome, em troca de milhões de reais, numa camisa que “apenas” está com as contas em dia. O que as empresas querem é visibilidade, e a maior exposição possível de suas marcas. E isso só acontece em times campeões. Sanear o clube é importante e necessário. Mas é possível fazer isso e montar um time que se pague com títulos (que trarão mais e mais parceiros)
Um grupo que chegou ao clube com uma enorme expectativa de que fosse especialista em captação de recursos não me parece pensar grande, por exemplo, ao achar que vai resolver algum problema passando a cobrar estacionamento dos sócios. Não me parece correto que alguém que já paga uma mensalidade para usar o espaço do clube, tenha ainda que pagar para entrar nele – afinal, o estacionamento faz parte do espaço do clube. Se a medida é só para impedir que cidadãos irresponsáveis usem o clube com estacionamento para irem trabalhar no Leblon, que se cobre somente de seganda a sexta, e que se mantenha a gratuidade nos fins de semana.
Recorro ao meu grande amigo publicitário Affonso Romero, que chegou a lançar candidatura à presidência do Flamengo, e que lembra o exemplo do Barcelona.
“Quando o atual grupo que dirige o Barcelona pegou o clube, ele estava afundado em dívidas, perdendo receitas, correndo o risco de se apequenar. Está tudo lá no livro do Soriano. Sabe o que eles fizeram? Investiram, investiram e investiram. Com inteligência, com responsabilidade, mas investiram. Não se apequenaram, não cortaram despesas fundamentais, não cobraram estacionamento. Foram ao mercado com um projeto, trouxeram parceiros fortes (…). Adotaram um padrão interno de gestão, de formação de atletas, de perfil de contratações. E contrataram pesado. O Soriano é explícito: eram dois caminhos possíveis e uma escolha. Um, se apequenar, fazer economia porca, apertar o cinto; outro, ousar, fazer valer a grandeza do Barça, voar alto com os melhores. Optaram pelo segundo caminho”.
A diretoria rubro-negra tem tempo, crédito e uma grande capacidade, reconhecida por todos, para ajustar o prumo e evitar que o Flamengo seja obrigado a seguir o caminho do Corinthians, Vasco, Botafogo, Grêmio, Atlético-MG, Fluminense, que precisaram ir ao inferno da Série B para se reestruturarem. Um time com uma torcida do tamanho da do Flamengo tem, necessariamente, chance de percorrer outro caminho. Pode-se optar por um grande time, comandado por um técnico à altura do clube, como Mano Menezes ou Muricy Ramalho, ou… escolher outro e continuar patinando na lama onde o time está.
Basta levar ao pé da letra o comentário de Jorginho ao comentar sua demissão, talvez o mais sensato desde que foi contratado: “O Flamengo não pode ser vice-lanterna”.
Fonte: Blog entra as Canetas