Caríssima Mulambada bem vestida, nessa época do ano já era tradicional aquele meu post esculhambando com o carioqueta, sempre arrematado com terríveis ameaças de que “esse ano não vou a nenhum jogo dessa porcaria!”. Uma bravata totalmente desnecessária, e desrespeitosa com a tradicional e centenária presepada sócio esportiva da qual o adjetivo preferido para defini-lo é charmoso. Ui! Mas era vacilo ficar escrevendo essas coisas, ainda mais porque era muito fácil me dar flagrante nos jogos do infecto carioqueta. Sem ameaças esse ano.
Mas em 2014 é sério, não vou a nenhum jogo do carioqueta. Porque não tenho dinheiro pra gastar com essas peladas do nosso ruralito tendo que morrer numa baba pra ver os jogos da Liberta. Questão orçamentária, mesmo. Administrar, lembro a vocês, é tomar decisões e fazer escolhas. Eu já fiz a minha. Em 2014 Carioca é só na TV.
E pra mostrar que 2014 não será igual ao ano que passou nem vou escrever o tal post esculachando o certame praiano. Minha opinião sobre o Carioca continua a mesma dos últimos anos, se quiser saber qual é basta ler os posts sobre os carioqueta anteriores. Em 2014 a tarefa de falar dessas miudezas fica para o Walter Monteiro, que agora mora longe e ainda sente saudade de Lillyput.
Abracetas, Arthur
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A minha primeira emoção verdadeira da infância foi quando Rondinelli inaugurou a Era de Ouro da Gávea, estufando as redes no finzinho do 2º tempo de uma decisão de turno contra os eternos vices e conquistando antecipadamente o título carioca.
Mais de 30 anos depois o fera Renato Ramos, fundador da Fla Lages e referência rubro-negra aqui no Sul do Brasil, veio me contar que Coutinho tinha escalado Rondinelli apenas para poupar o titular Nelson, que precisava ser preservado para a finalíssima, já que o Vasco tinha a vantagem do empate. Ao contrário de mim, que fui de bandeira e camisa para o Maraca com meu pai, Coutinho não acreditava na vitória. Rondinelli saiu da reserva e entrou para a história como o Deus da Raça. E todas as glórias que resultariam no mítico Flamengo supercampeão começaram ali, naquela cabeçada.
Falar bem do campeonato carioca nos dias atuais é como gostar de rock progressivo ou pegar onda de longboard, ou seja, coisa de coroa, já que os tempos áureos ficaram lá pelos anos 70, 80 no máximo. Basta eu ensaiar uma mínima simpatia por esse torneio que recebo uma enxurrada de ofensas, provocações, ironias e maus-tratos. O bonito é falar mal do campeonato estadual, virou cult lamentar ter que passar 3 meses tirando onda com os rebaixados rivais locais.
Tenho para mim que parte desse sentimento é alimentado pelo setor da nossa crônica esportiva mais sensível ao complexo de vira-lata, incomodada por um país de dimensões continentais não seguir à risca a receita europeia de organização futebolística, mas pouco importa. O fato incontestável é que os nossos estaduais perderam bastante do seu apelo, por mais divertido que seja derrotar os fregueses de sempre e reafirmar nossa centenária superioridade.
Mas tem um lugar onde o Campeonato Carioca tem uma importância imensa: fora do Rio de Janeiro! Ironicamente, quanto mais longe do Rio o flamenguista está, mais ele gosta do estadual.
Desde que fundamos a FLA RS em 2007 reparamos um fenômeno interessante: o bar fica mais cheio nos jogos do Carioca do que no Brasileiro. Notamos que muitos torcedores possuem o PFC em casa para ver o Brasileiro ou assistem os jogos na casa de amigos, mas na época do Estadual ou o cara vai até o Fla Bar tomar uma com a gente ou vai ter que se contentar em assistir Inter x São Luis de Ijuí na companhia do cunhado.
Além disso, tem algo absolutamente fundamental, que o leitor pode conferir a partir dos dados do ótimo blog Teoria dos Jogos. O Campeonato Carioca é transmitido ao vivo para 15 estados e mais o DF. Há uma coincidência absoluta entre os lugares onde o torcedor assiste o Carioca e os redutos rubro-negros Brasil afora.
Ninguém é Flamengo à toa. A pessoa é Flamengo porque interage com o clube, da forma que der. É justamente no Campeonato Carioca que o Flamengo consegue a maior interação com seus torcedores afastados, porque passa muito mais jogo na TV do que na época do Brasileiro, quando a grade da televisão tem que dar espaço para times de SP, MG, RS, etc.
Para desespero da paulistada invejosa, o Carioca é uma reserva de mercado para o Mengão, uma barreira de entrada às pretensões de Corinthians e São Paulo de um dia nos superarem. Nunca serão!
Então, para você aí que é do Rio e está amaldiçoando o fato de ter que perder seu precioso tempo vendo jogos contra Boavista ou Macaé, saiba que cada partida dessas mobiliza milhões de rubro-negros no Norte e Nordeste, loucos para ver a vitória contra o Audax, com direito a Negueba e Wellinton de titulares, para os quais declaro respeito e admiração, porque é aquela parada, vestiu rubro-negro, não tem para ninguém.
É sério isso, o Campeonato Carioca, além de receber uma grana da TV que deve ser mais do que o dobro do que a da Libertadores, é muito importante em termos da estratégia de consolidação do Flamengo como a maior e mais espalhada torcida do Brasil. Se ele acabar, essa nossa vantagem competitiva acaba junto.
Além de ser importante para o Flamengo, em segundo lugar ele também é importante para o Vasco – e isso não foi uma piada. O mesmo fenômeno que nos beneficia é aproveitado pelos Vices, que surfam na nossa onda, ainda que bem atrás.
Vejam só, até para o Botafogo ele é importante: é graças a esses 3 meses de exclusividade nas telinhas de 16 UFs que em todas as pesquisas de torcida o Foguinho ainda mantém folgada liderança sobre os foragidos da Série B, o menor time do Rio. Pena que o Ameriquinha perdeu fôlego, senão podia entrar no bolo.
Vai começar e o recado é esse: levem a sério essa parada. Claro que a Libertadores é importante, prioridade, etecetera e tal. Mas sou Flamengo e nasci para vencer tudo, todos e sempre! Se os cariocas estão de ressaca de tanto ganhar o estadual, os Off-Rio estão grudados na TV sonhando com as vitórias e as Taças.
Pra cima deles.
Walter Monteiro
Fonte: Urublog