Você conhece Edinaldo Batista Libânio? Provavelmente, os torcedores do São Paulo devem ter ótimas recordações deste nome. Estamos falando de Grafite, atacante que fez sucesso no Tricolor paulista e no Wolfsburg, da Alemanha. Em 15 anos de carreira, o jogador de 34 anos, que começou na pequena Matonense, conquistou o mundo pelo Soberano, tornou-se ídolo na Europa e alcançou o sonho de muitos brasileiros: vestir a amarelinha. Em entrevista exclusiva para o Yahoo Esporte Interativo, o jogador fala sobre sua carreira, desde os sucessos, até as dificuldades. Ainda também fala sobre a Copa do Mundo no Brasil e a vida nos Emirados Árabes. E alimenta o sonho de muitos clubes brasileiros: voltar a jogar no Brasil.
Possibilidade de voltar ao Brasil
Em conversa na sala de conferências do Al-Ahli, dos Emirados Árabes Unidos, Grafite admite que tem saudades de voltar ao Brasil. Contudo, a vontade da família pode contribuir para a permanência no país árabe.
“Todo ano, geralmente nesta época de transferências, o pessoal especula muito. Sempre aparece alguma coisa. Botafogo, Flamengo, Fluminense, Corinthians, Palmeiras… todos estes clubes me procuraram nos últimos anos. Eu fiquei muito próximo do Palmeiras em 2010. Eles foram à Alemanha, acertaram tudo comigo. O Felipão era o treinador na época, falei com ele. Ia ser um negócio muito bom, infelizmente não deu certo. Inclusive, meu contrato vai terminar em julho. Me dá uma vontade de voltar. Eu tenho canais do Brasil aqui e acompanho o futebol brasileiro, a briga que tá lá entre Portuguesa e Fluminense. E às vezes dá saudade, mas hoje em dia eu vejo que tenho 34 anos, pretendo jogar mais uns dois ou três anos ainda. Então eu penso na minha família que está muito feliz aqui. Elas estão muito contentes aqui em Dubai. Aqui tem um clima mais parecido do Brasil. Assim, não sinto tanta falta. Então, pelo lado familiar, eu não voltaria não”, explicou, completando que um time tem a preferência no retorno: “Mas se fosse voltar, a preferência seria do São Paulo. Tive dois anos muito bons lá”.
O atacante destaca que recebeu uma sondagem de um time brasileiro, mas aguarda um retorno para poder avaliar a negociação.
“Semana passada teve um rapaz dizendo que tinha uma situação do Brasil, mas ele não especificou qual clube que era. Estou esperando o contato dele ainda. Vamos ver o que acontece”, explica.
Melhor fase profissional, pior fase pessoal
Entre 2007 e 2011, Grafite jogou no Wolfsburg, da Alemanha. Sua passagem ficou marcada lá: foi artilheiro, quebrou recordes, conquistou o Campeonato Alemão e ainda foi eleito o craque da competição. Em 107 partidas pelo clube, marcou 59 gols. Os números demonstram que o atacante viveu sua melhor fase no país. Contudo, se dentro dos gramados Grafite brilhava, sua vida pessoal estava “apagada”.
“Nós passamos muita dificuldade na Alemanha. Profissionalmente foi muito bom pra mim, foi espetacular. Fui campeão, artilheiro e melhor jogador… mas, privado foi muito difícil por causa da língua. Não tinha escola internacional para minhas filhas. A mais próxima ficava 120 km de casa, então tivemos que colocar elas na escola alemã, tiveram muitas dificuldades. Então, tive a proposta do Al-Ahli, de Dubai. Eu tinha mais dois anos de contrato na Alemanha e eles queriam renovar por mais um. O que pesou muito para sair foi o lado familiar. Hoje, na Alemanha, graças a Deus sou muito respeitado e reconhecido nas ruas. É muito gratificante. Muita coisa que acontece no mundo do futebol o torcedor não sabe como é o dia-a-dia. Muita gente fala: “Vida de jogador é muito fácil. Tem carro, dinheiro e mulher”. Mas não sabe como é diariamente. Principalmente na Alemanha. Joguei a menos de 25 graus”, declarou o atacante.
Sua história no Wolsfburg até hoje orgulha o atacante de 34 anos.
“É gratificante. Às vezes eu olho para trás e vejo tudo o que eu fiz no Wolfsburg. Não é fácil, ainda mais em um campeonato forte como o Alemão. Antes de ir para o clube, o pessoal já dizia que eu iria me dar bem no campeonato deles. E foi assim. Logo no segundo ano. Lá o futebol é muita força física e muito disciplinado. Fisicamente se trabalha muito lá. Eu sou recordista de gols junto com o Edin Dzeko (Manchester City) de dupla de ataque. Nós marcamos 54 gols. Antes, Gerd Muller e Uli Hoennes tinham a marca desde 1972. Eu bati essa marca. Fui artilheiro com 28 gols, o Dzeko foi vice, com 26 gols. Foi também eleito melhor jogador do campeonato alemão. Então foi tudo gratificante”, afirmou.
Apesar das dificuldades na Europa, Grafite afirma que é no continente que os jogadores viram profissionais.
“Eu aprendi ser jogador de futebol na Europa. O jogador brasileiro é muito bom tecnicamente, mas você aprende a ser profissional mesmo na Europa. Em todos os aspectos: físico, mental e tático. Foi a melhor coisa que eu fiz. Joguei seis anos na Europa. Eu aprendi a ser profissional. No Brasil tem aquele negócio: eu treino na boa, mas corro no jogo. Existe essa mentalidade entre os jogadores. Na Europa não. Se você não corre no treino, você não joga. Lá você tu pode ser o cara que for, mas na Europa tu é só mais um. A mentalidade é diferente”, explicou para complementar: “Não é fácil chegar e se impor. Eles dão todas as condições, mas não existe o negócio de “é o Grafite” tem que jogar. Olha o Neymar, tem jogo no Barcelona que ele fica no banco. Quando ele voltou das festas de fim de ano, o treinador (o argentino Tata Martino) viu que o Alexis Sánchez estava melhor nos treinos e deixou-o no banco”.
Preocupação com a Copa do Mundo
Grafite também comentou sobre a Copa do Mundo no Brasil. Ele foi uma das surpresas da convocação final para a edição de 2010, realizada na África do Sul. Para o jogador, o ataque é o setor que mais preocupa.
“Essa questão do ataque tá difícil. O Fred se machucou, mas vinha bem na Seleção e no Fluminense. Ficou quatro meses fora e agora tá voltando. Qualidade tem, mas o momento não é bom. Tem o Fred, tem o Luís Fabiano, tem o Adriano, que tá se recuperando no Atlético-PR. Ainda tem o Damião recomeçando no Santos. Jogador tem, o problema é que o tempo é curto. Tivemos quatro anos desde a última Copa do Mundo, mas a preparação não foi tão boa assim. O Mano não conseguiu colocar sua impressão no time. Agora, o Felipão chegou há um ano e meio e está fazendo um trabalho bom. Mas tá difícil para resolver a questão do ataque. Os que jogam no Brasil tem uma chance agora nos próximos meses. Teve o caso do Diego Costa, que optou pela Espanha, era um bom nome. A expectativa tá grande”, afirmou.
Para ele, o fato de disputar uma Copa jogando no Brasil pode ser bom, mas também pode ser ruim.
“Tem os dois lados da moeda de jogar em casa a Copa do Mundo. Pode ser benéfico se o Brasil jogar bem, como no caso da Copa das Confederações. E no caso de jogar mal vai ter a torcida pressionando contra. Eu falo para o pessoal aqui em Dubai: o futebol no Brasil é religião. Na Europa, tu perde, mas a torcida está te apoiando. Agora no Brasil, tá na moda o torcedor achar que tem o direito de agredir o jogador”.
Grafite também mostrou preocupação em relação às obras para a Copa do Mundo, principalmente em relação aos estádios. Para ele, o número de sedes deveria ter sido reduzido.
“A gente nem sabe como vai ser essa Copa no Brasil. Tem a situação dos estádios. Eu vi a situação do aeroporto de Natal que não vai ficar pronto, as Arenas que estão atrasando. A logística no Brasil não é fácil. O problema do Brasil é que o país tem dimensões muito grandes. Eu joguei na Alemanha e nós íamos de trem para os jogos. Atravessávamos o país de trem em 2 horas. Mas no Brasil, tu pega um São Paulo-Manaus tu leva 5 horas. É complicado. Eu acho que não haveria a necessidade de ter 12 sedes. Poderia ser mais centrado. Minas, São Paulo, Brasília. Mas daí tem aquele negócio “preconceito com o Nordeste”. Só que é muito grande. E o pessoal quer fazer logo e agradar todo mundo”, destaca.
Vida de “Sheik” nos Emirados Árabes
O atacante está a quase três anos atuando no Al-Ahli, de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. Ele contou com exclusividade sobre as “facilidades” que o povo local tem.
“Aqui (em Dubai) é muito tranquilo. Os jogadores locais não dependem do futebol pra viver. Eles não dependem do, “ah, eu tenho que jogar num clube grande para conseguir ajudar minha família”. Eles não precisam disso. Aqui o Sheik dá tudo para eles. Quem não tem trabalho aqui, eles dão trabalho. Eles têm tudo. Outro dia o treinador (Cabalem Radicam, da Romênia) tava dando uma “dura” nos jogadores por que perdemos o jogo. Ele disse: “aqui vocês tem tudo aqui. Por que o governo de vocês dá tudo para vocês. O nosso, o meu governo, do Grafite, do Luís (Jimenez, do Chile), eles fazem de tudo para tirar o máximo da gente”. E é verdade, ele tem razão. Nós pagamos imposto. Aqui não tem isso. No Brasil, pagamos 27,5% de imposto, mas não tem transporte, saúde, nada… aqui é diferente”, conta.
A grande dificuldade foi a diferença da mentalidade dos jogadores locais. Como não precisavam do futebol para viver, a competitividade era baixa, como explica Grafite.
“Não é fácil. Principalmente no começo. Contudo, a mentalidade deles mudou bastante. Quando cheguei, os locais eram o seguinte: chegavam, treinavam bem ou mal, iam para casa. Se perdessem ou ganhassem, iam para casa normal. Quando o treinador Quique Flores chegou, ele mudou essa mentalidade, os fez quererem ser campeão, chegar à seleção. O cara tem que vir para Dubai para jogar, por que se vier só pelo nome não joga não. Tem que mostrar para se destacar. O povo que vive aqui em Dubai, só 20% é local. Por exemplo, tu vai ao shopping, mas não vê locais trabalhando. Eles só trabalham nos aeroportos, polícia e etc. Nas lojas, só filipinos e indianos. O Sheik ajuda eles. Para ter uma noção, tem um jogador nosso, que tem 27 anos, e quando fomos campeões da Copa do Príncipe, ele foi pedir emprego para o Sheik. E ele garantiu emprego para ele. No nosso clube não tem mais, mas em outros tem muitos locais que trabalham em outro lugar, na polícia, por exemplo. Os locais, se não tiver casa, eles dão. A maioria do pessoal aqui não passa dificuldade”, concluiu.
Mesmo não sabendo qual será o futuro do Grafite, se fica em Dubai ou se volta para o Brasil, uma coisa é certa: os torcedores continuarão comemorando muitos gols deste artilheiro que brilhou por onde passou.
Fonte: Ei