Em todos os meus anos de torcedor apaixonado pelo Flamengo, não lembro de ter dormido durante nenhuma das partidas do time. Aconteceu ontem. Por incrível que possa parecer, o jogo era contra um dos gigantes do futebol mundial, um clássico de dois campeões do mundo. O adversário era o Santos, eternizado por Pelé e um dos maiores formadores de jogadores do país.
O jogo foi ruim demais. Poucos torcedores tiveram a coragem de sair de casa. O Flamengo do primeiro tempo era claramente superior, mas com a ressalva de estar enfrentando uma das piores formações santistas dos últimos tempos. Longe de o melhor desempenho ser algo com o que devamos nos empolgar.
Lá pelos vinte e cinco minutos eu cochilei. E enquanto visitava Morfeu, um sonho me acometeu. Durou exatos quinze minutos. Nele, um time rubro negro jogava uma pelada. No vestiário, antes da partida, o treinador novato escolhia seu time através de um sorteio. O resultado foram jogadores improvisados, fora de suas posições, esquema indefinido e total desequilíbrio tático e técnico.
O grande acerto do técnico foi deixar fora do sorteio três jogadores que vivem uma ilusão em comum: estão presos ao passado e persistem na convicção equivocada de serem ainda os jogadores que um dia se destacaram no cenário do futebol: Felipe, André Santos e Elano. Três sujeitos arrogantes que, mesmo apresentando deficiências técnicas e físicas inadmissíveis, vêm injustiça no fato de estarem sendo, aos poucos, relegados a coadjuvantes.
Em campo, onze peladeiros reunidos com um objetivo: ganhar o jogo. Faltavam-lhes, como em toda partida amadora, esquema tático, entrosamento, preparação física e motivação. Desta feita, os zagueiros eram três, mas um era o lateral esquerdo improvisado. No meio, três volantes. O quarto jogador, Éverton, não se sabe se é lateral, atacante, ou um mero corredor. Neste jogo, mais uma vez cortaram o meia. No Flamengo esta parece ser uma posição abolida em qualquer modelo de jogo.
No ataque, coube a função de marcar os gols do time a dois velocistas que fazem quase tudo, menos colocar a bola na rede. Paulinho, comprovando a tese no fim do jogo e Negueba, peladeiro habilidoso, jogador de vigor e empenho indiscutíveis, quase não lembraram ao goleiro Aranha qual era sua função na partida. Muitos retrucarão: mas como cobrar do ataque se a bola não chega? Vou concordar. Se houvesse um meia no jogo e não no banco ou treinando com o time C, mais bolas deveriam ter chegado aos homens de frente. Tivesse Paulinho cinco chances como aquela do final do jogo, não acredito que desperdiçaria todas.
Tenho lido aqui e acolá que Ney Franco acertou o time do Flamengo. Das duas uma: ou eu desaprendi o que é futebol ou dormi mais do que quinze minutos e o jogo realmente foi uma aula de futebol do rubro-negro no Morumbi.
Vou ser repetitivo aqui: Não existe time minimamente competitivo sem uma transição eficiente defesa-ataque, sem meias criativos e sem um esquema tático bem definido. Infelizmente temos um técnico que num momento crítico como o atual demonstra não conhecer o grupo que tem em mãos e usa jogos oficiais para fazer testes estapafúrdios escalando e substituindo de forma inexplicável e completamente incoerente.
Temos muitos desfalques sim, o time é limitado sim. Mas não é por isso que um zagueiro tem que ser lateral, que um volante tem que ser meia. Não é por essa razão que o time tem que jogar com três ou quatro atacantes e que os únicos meias de origem do time têm que ficar fora do time.
Sem querer ser pessimista e deixando claro que não apoio a volta dos modelos de gestão suicidas do passado, não posso me juntar aos que acham que o que está sendo feito no futebol do Flamengo está sendo bem feito. Até o momento, apesar dos dois importantíssimos títulos conquistados até agora, nosso desempenho dentro de campo está muito aquém do que é possível ser feito com um orçamento de nove milhões de reais.
A verdade dolorosa é que times bem menores como Bahia e Goiás e outros com tantas limitações momentâneas quanto as nossas como Palmeiras e Atlético PR, têm demonstrado o que a competência é capaz de fazer com muito menos dinheiro do que temos disponível para gerir o departamento que é o de pior desempenho de todos os demais da ótima e séria gestão dos Azuis.
Aproveito para deixar uma pergunta: Às vésperas de anunciar o novo diretor de futebol, função de suma importância, dá-se como certa a contratação de Felipe Ximenes. Que critério está sendo utilizado para a escolha deste profissional? Quais foram os grandes trabalhos dele? Vamos apelar para a sorte como o treinador do meu sonho? O Flamengo merece ser laboratório para novatos em formação? Parece-me que para o momento a qualidade comprovada e a experiência são ingredientes fundamentais na receita do futebol rubro-negro: Rodrigo Caetano, Fernando Carvalho e Newton Drummond seriam opções menos arriscadas. Aguardemos os próximos capítulos.
FLAVIEW