Quando criança minha primeira forma de dizer quem eu era aos adultos foi repetindo o time que meu pai tanto falava.
Quando queria vê-lo sorrir, chutava uma bola e gritava o nome do nosso clube.
Quando meu avô ia em casa, prestes a morrer, fazia questão de se certificar que eu sabia o nome dos jogadores e que honraria a paixão da família por pelo menos mais uma geração.
Quando me encontrava, após o beijo e o apertão, minha Vó brincava sobre os resultados do domingo, já que éramos rivais.
Meu outro avô, italiano, dizia que me converteria mas nunca tentou. Talvez ele soubesse o quanto seria importante lá na frente dividir a mesma paixão do meu pai.
Quando mais jovem eu aprendi a negociar trocando as idas as igrejas do sábado com a ida ao estádio domingo.
Quando rebelde corri pra uma turma de pouco juizo só pra dizer que “é nóis” e passar a fazer cara de mal.
Ainda jovem descobri como era dividir, ainda que só por um mês, a mesma paixão com todas as pessoas a minha volta numa única torcida.
Aprendi a chorar por caras que nem conhecia pessoalmente.
Me casei e atrelei as datas ao calendário do meu clube. Me separei e quando me vi confuso a única coisa clara na minha vida era ele.
Me casei de novo, e me vesti com suas cores para celebrar o começo da minha família.
A primeira coisa que me fez sorrir após a morte de parentes e situações difíceis na vida foi invariavelmente um momento proporcionado por ele.
Senti raiva, ódio, vontade de quebrar tudo. Até quebrei coisas que trabalhei pra conseguir comprar. Mas nem disso me arrependo.
Aos 15 era o amor da minha vida. Aos 30, minha vida. Hoje, minha profissão.
Ainda assim, a maior paixão de minha vida.
Quando encontro meu pai, nosso primeiro assunto é ele. O último, também.
Não há domingo sem ele, muito menos um “bom dia” ao porteiro sem atrelar a frase seguinte a um resultado recente.
Tem a ver com injustiça, surpresa, falta de controle.
Me conforta, me dá sensação de ter ao que me apegar quando e como precisar. Me faz parte de algo grandioso.
Me faz vencedor, derrotado, humilhado, apaixonado. Mas faz parte de mim.
Me faz de bobo, me leva dinheiro que as vezes nem tenho. Me carrega amigos pra perto e pra longe.
Me dá sentido quando nada mais faz sentido.
Me ensinou a perder, respeitar, brigar, chorar, abraçar, não discriminar, não ver cor, religião e nem classe social. Me ensinou a ser uma pessoa melhor.
A dias de te reencontrar em mais uma coroação que recebe, me sinto como que na primeira vez. Nervoso, ansioso, agitado, sem saber o que fazer.
Desde pequeno ouço conselhos para te esquecer, te dar menos valor e coloca-lo no devido lugar.
Pois é o que fiz.
Eu te amo, Futebol. Obrigado. E seja bem vindo.
Fonte: Blog do Rica Perrone