Existem funções que exigem qualificação altamente sofisticada para que sejam bem exercidas. Ou seja, que excluem não só aventureiros como, o mais perigoso, pessoas que acham que sabem, ou que têm um preparo para tarefas semelhantes, mas não iguais. Exemplifico: não dá para dar uma função do setor de tecnologia da informação a um jornalista. Não dá para jogar um piloto de avião no comando de um ônibus espacial. Para determinadas funções é preciso, muito, muito, muito preparo.
Lembro disso para explicar minha visão do que está acontecendo no Flamengo. A atual diretoria é composta de pessoas honestas, até onde se sabe, bem intencionadas, rubro-negros de coração, e muitíssimo competentes, também até onde se sabe, na administração de empresas em geral, e de suas empresas particulares. Mas nem tudo isso somado é suficiente para que alguém seja um bom dirigente de um clube de futebol. Para isso, além de todos os predicados da diretoria do Flamengo, é preciso entender profundamente de futebol.
Quando falo profundamente não é do conhecimento que qualquer brasileiro tem do esporte mais popular do país. É conhecer a cultura do futebol, do vestiário, do dia a dia de treinos, da torcida e da paixão que se deixada de lado em qualquer estudo acarreta o suicídio. A julgar por alguns atos da gestão Bandeira de Mello, como elitizar o Maracanã, afastar as classes C, D e E do Flamengo – agora parece que voltaram atrás e vão colocar ingressos populares atrás de um dos gols do Maracanã – promover uma ciranda de técnicos (abrindo mão de um prata da casa vencedor como Jayme, e agora recorrendo a um treinador caro e que levou Patrícia Amorim a ser esculhambada por estes próprios dirigentes quando Luxa trabalhou com ela) me levam a pensar que esta não está qualificada para cuidar do futebol de um clube.
Fossem esses moços, por exemplo, engenheiros da Nasa, e surgisse um problema num foguete que exigisse uma diminuição do peso do bólido, correríamos o risco de que a opção fosse por descartar a tripulação, de modo a trazer o foguete para um pouso em segurança na Terra. Na matemática, perfeito, mas e a questão humana? Pagar as dívidas, sanear o clube é ótimo, mas não se pode paralelamente ser o lanterna do Campeonato. Para unir a solução de ambos os problemas é preciso alguem qualificado para solucionar OS DOIS problemas.
Já disse várias vezes neste fórum: clube grande não é empresa grande, ninguém torce para empresa. O correto é que um clube esteja com as finanças equacionadas e o futebol seja forte. O que a diretoria atual faz é apenas reproduzir como um espelho, o erro de várias diretorias anteriores, que agora, de maneira oportunistas, querem voltar arvorando-se em títulos que conquistaram: ignoraram as finanças e cuidaram bem apenas do futebol. Ambos os modelos estão errados, mas pergunte a qualquer torcedor do Flamengo quem ele identifica como melhor para o clube, Márcio Braga, por exemplo, campeã de tudo o que se possa imaginar no futebol, ou Bandeira e Wallim?
Vale para a opção por Luxemburgo a mesmíssima coisa que escrevi sobre Dunga: pode até dar certo. Vanderlei conhece futebol, é flamenguista, o Brasileiro ainda tem 2/3 dos jogos a serem disputados, o clube tem camisa, tem na torcida seu maior patrimônio e o elenco não é tão pior quanto o de pelo menos 12 ou 13 times na disputa. Só que… o time se livra do rebaixamento. E aí? Ano que vem vai ser o mesmo sofrimento? Aí o time passa em quatro mata-matas, ganha a Copa do Brasil com Luxa. E aí? Ano que vem sai na primeira fase da Libertadores de novo?
Até para que se faça justiça com os atuais dirigentes do Flamengo, o problema deles não é exclusivo. Raríssimos dirigentes de raríssimos clubes têm a competência e a qualificação de que trata este post. Quando a comunidade do futebol e as comunidades que escolhem os presidentes de clubes entenderem a necessidade imutável de aliar capacidade administrativa com conhecimento de tudo o que leva a um time de futebol a ter sucesso, aí começará a tão pedida revolução que os cronistas esportivos andam pedindo depois daquele triste 7 a 1.
Fonte: Entre as Canetas