O que eu posso dizer sobre a torcida do Flamengo que ainda não tenha sido dito essa semana? Nada. Até os inimigos de sempre estão por aí mordendo as fronhas de ódio e inveja, vendo um time ser içado do fundo do poço pela força plenipotenciária da massa em rubro e negro.
Mas sempre tem quem nessa hora de puro êxtase queira reviver assuntos chatos – e eu, que nasci para ser gauche na vida, vou puxar a fila dos malas.
Meu parceiro Rainniery Sartório, mais novo discípulo da Fla Borderô (rapaziada fissurada na leitura dos boletins financeiros das partidas), notou um fenômeno curioso: nesses 3 jogos de presença vibrante no Maracanã, cerca de ¾ dos flamenguistas não são sócios torcedores.
Essa é uma informação bem surpreendente para mim. Clubes que possuem programas numerosos de sócios torcedores costumam preencher mais da metade dos lugares vendidos com seus sócios. E no Flamengo também vinha sendo assim – basta lembrar que na final da Copa do Brasil o quadro era exatamente inverso, 75% do público era de sócios.
Porém, esses três jogos de presença radiante no Maracanã provam que há um nítido descasamento entre a galera que está indo lá empurrar o time para a parte de cima da tabela e aquela que ajuda a patrocinar o clube com suas mensalidades. A partir dessa constatação, duas reflexões emergem.
A primeira é em relação ao preço dos ingressos.
Ninguém – nem o Bap ou o VP de Finanças – defendeu de forma tão convicta e enfática a política de preços dos ingressos que o Flamengo praticou em 2013 quanto eu. Não vou mudar uma vírgula do que disse, tampouco me arrependo. Acho, sim, que eu estava certo em defender a alta dos preços como forma de acelerar a recuperação das finanças.
Entretanto, sou teimoso, mas não a ponto de contrariar os fatos: preços mais em conta trouxeram de volta um torcedor que andava afastado das arquibancadas. E a resposta do time em campo evidencia que realmente precisamos muito dessa galera.
A segunda reflexão é mais complexa, porém ainda mais importante: o que falta fazer para convencer essa gente a se associar?
Vamos combinar que, qualquer que seja o preço do ingresso, ir ao Maracanã 10 da noite em uma quarta-feira representa um custo financeiro razoável, além do desgaste pessoal. Realmente acredito que parte expressiva desses que estão indo aos jogos poderia se associar.
Se não o fazem, a culpa não é deles – volta e meia aparece algum xiita para cobrar mais engajamento da torcida, como se virar um jogo no gogó fosse pouca coisa. Se eu coloco alguma coisa à venda e alguém do meu público alvo não compra a responsabilidade é minha, que não soube concluir a venda. E cabe a mim investigar as razões do negócio não ter sido fechado.
O clube precisa encontrar uma forma de entender as razões pelas quais essa porção tão fanática da torcida ainda não se associou. E, quem sabe, contar com o apoio do ¼ que já se associou e segue indo aos jogos.
Digo isso porque tenho visto um aumento substancial do que chamo de ativismo rubro-negro, onde não basta ser torcedor, tem que participar. Agora mesmo temos em curso duas iniciativas de financiamento coletivo, uma para pagar dívidas, outra para contratar jogador. Só posso aplaudir a energia e a dedicação de quem está por detrás delas, mas não quero perder de vista o que é realmente essencial: o programa de sócio torcedor.
O Nação Rubro-Negra, com seus acertos e imprecisões, é, de longe, o item mais importante do planejamento financeiro do clube. Com ele se pode pagar dívidas, contratar jogadores e, sobretudo, ter solidez, artigo raro no ambiente de futebol. Convido a todos que se dedicam à mobilizar torcedores que concentrem esforços para ampliar nosso ST.
O time já está nos braços da galera. Falta o clube. Para isso, sonho com mais e melhores sócios (antes que me xinguem, é uma analogia com um filme de Spike Lee, mas me refiro a “melhores” no sentido de contribuintes que não abandonem o barco na primeira garoa que cair).
E espero, realmente, que o fenômeno para o qual meu brother Rainniery chamou atenção sirva de inspiração para gerar estratégias de conversão de torcedores fanáticos em sócios torcedores. Esses que vão ao Maracanã na hora que mais precisamos são o créme de lá créme da torcida e estão prontos para ajudar, desde que se encontre o jeito certo de se comunicar com eles.
Walter Monteiro
Fonte: urublog