Eu me sinto como Bubba, o amigo do Forrest Gump que em plena Guerra do Vietnã foi capaz de listar 21 formas de comer camarão e não conseguia falar de outra coisa. Eu tento me libertar desse carma, mas volta e meia a estimulante/desgastante polêmica acerca do preço dos ingressos do Maracanã me persegue.
Tantos amigos a quem eu quero bem, parceiros de tantos anos de Maraca, estão na trincheira contrária. Meus colegas de blog, meus confrades de lista de discussão, meus companheiros da Fla Manguaça, meus seguidores nas redes sociais, meus amigos de infância, minha turma no Colégio Santa Teresa de Jesus e talvez até minha mãe do alto de seus 81 anos de idade, estão bravos com esse aumento dos ingressos, que elevou de R$ 40,00 para R$ 50,00 o preço cheio da entrada mais barata para o jogo contra o Corinthians.
E eu ainda estou aqui tentando entender e absorver o volume dessas críticas. Porque logo depois do aborrecimento com a derrota para o Goiás eu me toquei de uma coisa….aquele estádio, lotado de rubro-negros, esgotou em 72 horas os ingressos colocados à venda, sendo que o mais barato custava R$ 70,00 a inteira. Dinheirinho que vai reforçar os cofres esmeraldinos, porque a torcida era nossa, mas o mando era deles.
Caramba, Cuiabá é uma capital de 500 mil pessoas (ou 850 mil, incluindo toda a região metropolitana), com renda per capita de R$ 1,3 mil. E o Rio de Janeiro tem quase R$ 6,5 milhões de pessoas (ou mais de 12 milhões na região metropolitana), com renda de R$ 1,8mil. Em tese, deve ser muito mais fácil vender ingresso no Rio do que em Cuiabá, não é? Mais ainda se em Cuiabá o ingresso mais barato é 40% maior do que no Rio.
Ah, mas não seja imbecil, me dirão logo. Em Cuiabá o Flamengo joga 1 vez a cada 10 anos, no Maracanã joga toda hora, então o ingresso tem que ser mais barato, para poder lotar, caso contrário o torcedor não pode apoiar.
Não discordo que eu possa ser um pouco imbecil, mas o fato, em si, não muda: em Cuiabá custou mais caro, lotou rápido e se tivesse mais lugar, teria sido vendido também. Portanto, não é o preço, isoladamente falando, que é decisivo na tomada de decisão do flamenguista de ir ou não ao estádio. É, basicamente, uma questão de motivação.
Me parece um tanto quanto óbvio que houve inabilidade no timing do aumento e, principalmente, na forma como ele foi comunicado. Dizem as más línguas que a comunicação do Flamengo está a cargo de um vascaíno notório e, vou te contar, deve estar mesmo, porque vou te contar, viu, ô vocação para fazer bobagem!
A gestão eficiente, vale lembrar, não passa apenas pela recuperação da rentabilidade e da sustentabilidade econômica. É preciso aprender a administrar as expectativas e as interações com os clientes – se for correto chamar de torcedor de “cliente”, porque uma relação movida a tanta paixão vai além disso. Não importa, se tem paixão no meio, é preciso ter mais cuidado ainda, logo não tem cabimento promover o aumento soltando uma tabela de preços no site oficial sem dar explicações.
Mas habilidade para entender as coisas e os caprichos da alma rubro-negra não é mesmo o ponto forte de Bandeira e sua turma, uma lástima, mas, paciência, tá na cara que eles não vão mudar nem tão cedo, se é que mudarão um dia.
O que importa, caros amigos, é que um aumentinho de R$ 10,00 do preço médio em um Maracanã lotado dá mais de R$ 500 mil POR JOGO. Não sei se é muito ou pouco frente à gravidade das finanças do clube, mas é inexorável que esse valor SUPERA a soma da arrecadação de dois meses desses projetos de financiamento coletivo, como Fla em Dia e Flamengo da Nação.
Agora vejam vocês, um esforço imenso, uma energia sem fim colocada nesses projetos, uma mobilização intensa em tudo quanto é canto para os torcedores doarem e salvarem o Flamengo e todo mundo batendo palmas. Mas se o clube resolve cobrar R$ 10,00 a mais no preço do ingresso, a casa cai e fica todo mundo irritado.
Todo o debate acerca do preço de ingresso parte sempre da mesma premissa: o Flamengo tem que cobrar um preço que seja bom para o torcedor pagar. Poucos se propõe a sugerir a lógica inversa: o torcedor tem que pagar um preço que seja bom para o Flamengo receber.
Parece estranho, mas é assim que a gente devia raciocinar: quanto melhor para o Flamengo, melhor para a sua torcida. Afinal, o Flamengo somos nós. Ou não somos?
Dito isso, o que já e suficiente para ser mal visto por toda aquela gente que listei lá em cima – menos minha mãe, que seguirá ao meu lado – termino o meu artigo feliz. Porque enquanto você está aí no Twitter esbravejando, tem milhares de rubro-negros debaixo de sol fazendo fila para comprar ingresso para domingo.
Não sei se está caro ou se está barato, nunca sei ao certo. Só sei que, onde estiver, estaremos. Reclamando, se for o caso. Mas mesmo no pior momento, vamos apoiar até o final. Eu juro!
Fonte: Magia Rubro-Negra