Geral tá ligado que o Mengão é um time sem astros. O mais perto que temos disso é o croata da Vila Kennedy, que trouxe na bagagem uma sólida carreira na Europa, porém lá ele não era exatamente um protagonista. E o que mais se aproxima de um ídolo é o vetusto capitão Léo Moura, querido por muitos, odiados por muitos também, mas que pelo conjunto da obra e longevidade é respeitado por todos. O resto, perdão pelo clichê, é um time de operários.
Nesse Flamengo imprevisível, que tanto pode fazer uma exibição empolgante em um tempo e entregar a rapadura no instante seguinte, como acabamos de ver no Pacaembu, tem 3 jogadores que se destacam pela regularidade, seriedade, entrega e desempenho. Curiosamente, nenhum deles foi recebido com entusiasmo em sua apresentação ou tem seu nome gritado mais alto pela torcida.
Em 2014 há uma regra que tem funcionado de forma constante: quando Cáceres está em campo, o time vai bem. Ave, Cáceres!
Diziam que ele não é um volante típico de marcação, tanto assim que ficou na reserva um tempo, mas não sei se por convicção ou falta de opção, Jayme plantou Cáceres na proteção à zaga e estava tudo maneiro, até que ele se contundiu. Dali em diante a maionese desandou e o time veio ladeira abaixo.
O curioso é que Cáceres é um jogador de imagem apagadíssima. São raras as reportagens sobre ele, ninguém o procura quando o jogo termina, ele é figura ausente nas coletivas de imprensa. É a discrição personificada.
E o futebol dele também vai mais ou menos nessa mesma linha, não é um construtor de jogadas, não costuma ser eleito o melhor em campo, não é de fazer gol, não bate falta. Não discute com o juiz, não abre os braços para torcida implorando apoio. Joga sério e quieto.
Se o time do Flamengo fosse uma repartição, Cáceres seria aquele cara que chega cedo, trabalha duro cuidando das rotinas, não almoça com a galera e nem vai no happy hour, mas que todo mundo lamenta quando entra de férias, porque obriga o resto do departamento a trabalhar mais.
Quando Wallace chegou, línguas maldosas, a minha inclusive, plantaram o boato que ele veio de contrapeso do então badalado Carlos Eduardo, já que os dois tinham o mesmo empresário e foram anunciados de forma quase simultânea. Foi o suficiente para que a má vontade contra o zagueiro se espalhasse.
Que bom que ele calou a boca de todos nós e agora dá até a impressão que o contrapeso era o sonolento ex-gremista, que já foi tarde e não deixou saudades. Samir (uh! é seleção), Chicão, Marcelo (o aprendiz de Dedé), Frauches e quem mais estiver por ali brigam pela outra vaga da defesa, porque o baiano com cara de soldado do Estado Islâmico é titularíssimo.
E ainda tira onda com a galera por ser um sujeito com um preparo cultural bem acima da média dos colegas de profissão, graças a seus hábitos literários. Essa semana mesmo deixou um repórter de saia justa, que veio sugerir um livro e foi surpreendido quando o zagueiro tirou a sugestão da mochila e revelou que já tinha terminado de ler. É o Mengão mostrando ao mundo nossa nítida superioridade intelectual sobre a arcoirizada ignara.
Por fim, Everton. Eu tenho emoldurada na minha sala uma camisa oficial do título de 2009, autografada por parte do elenco. Sempre que alguém vem me visitar no escritório e identifica o ativo mais valioso do meu patrimônio, a diversão é começar a procurar as assinaturas, Adriano, Léo Moura, Petkovic, Bruno, Angelim….aí a pessoa vira o quadro e vê, camisa 22, Everton. Já me acostumei com a pergunta, “escuta, quem é Everton?”
Não é para menos. Depois da bela passagem pelo time hexacampeão, Everton penou em agrupamentos futebolísticos de nome curioso, como o Samsung da Coreia, o Tigres do México e o Botafogo de Marechal Hermes. Estava lá em Suwon, capital da Gyeonngi, quando o Atlético PR o resgatou e a gente se reencontrou com ele na final da Copa do Brasil. O Mengão fez um combo no genérico da Baixada, trazendo um lateral de quem diziam maravilhas e o Everton, quem sabe para compor o elenco.
Pois enquanto o tal do lateral Léo tenta se curar da mandinga forte fazendo hora extra no Departamento Médico, o Everton se tornou o jogador do Flamengo mais, digamos, agudo. Eu disse essa abobrinha porque eu não sei muito bem definir o papel do Everton. Ele é ponta, ele é atacante, ele é ala, ele é meia, ele é tudo ao mesmo tempo agora. Mas sei que ele, nos dias bons, toca o terror na defesa adversária. Nos dias ruins ainda assim é muito melhor do que os que estão ao seu lado, para não dizer naqueles que saem do banco de reserva.
Ainda não consegui chegar a uma conclusão se o time do Flamengo é bom ou ruim. Tem alguns ali que me irritam profundamente e eu nem vou dizer quem são, porque tô de bem com a vida e concentrado para amassar as florzinhas. Tem outros que, perdoem o toque levemente chulo, não fedem nem cheiram. Ainda tem os que eu gosto e ponho fé, mas precisam de mais rodagem para que eu confirme minha impressão.
Porém, Cáceres, Wallace e Everton formam, em 2014, aquilo que o torcedor mais gosta: atuações convincentes, muito empenho e muito respeito ao Manto. Mais do que isso, são o prenúncio de um time ainda melhor ano que vem.
Walter Monteiro
Fonte: Urublog