Uma das cenas mais emblemáticas do tetracampeonato mundial conquistado em 94 envolveu um dos personagens principais da eliminação rubro-negra na Copa do Brasil desse ano – ao menos para o torcedor do Flamengo.
A comemoração “embala neném” de Bebeto, anunciava a chegada de seu filho, Mattheus. 20 anos se passaram desde a famosa comemoração, e o neném de Bebeto era jogador profissional do Flamengo (clube pelo qual o pai fez fama e sucesso). O estilo de jogo lembra muito pouco o do pai: Mattheus é um clássico meia-esquerda, canhoto, alto e conhecido por cadenciar o jogo de sua equipe. Fez sucesso na base rubro-negra, sendo um dos artilheiros de sua geração.
Nos últimos anos, recebeu algumas chances de integrar o elenco profissional, mas a grande oportunidade veio somente em 2014. No Carioca, jogou alguns minutos contra times de menor expressão; no Brasileiro, apareceu entrando no fim das partidas. O jogo que verdadeiramente marcou Mattheus foi o da eliminação na Copa do Brasil. Lançado aos leões contra um time fortíssimo em casa, Mattheus recebeu a orientação de “segurar a bola no ataque”. Nitidamente nervoso e sem companhia para ajudá-lo na tarefa, teve atuação apagadíssima e foi alvo da fúria da nação rubro-negra.
Parte da torcida aliviou o jogador, transferindo a culpa para o técnico Vanderlei Luxemburgo – justamente por lança-lo num momento tão importante. Outra parte, não perdoou o jovem: Mattheus virou piada nas redes sociais e a tão famosa comemoração de 94 virou símbolo de críticas.
Dias depois da eliminação, Luxemburgo e Bebeto se pronunciaram sobre as cobranças em cima do garoto. “Bode expiatório” e “injustiça” foram algumas das menções utilizadas para defender o garoto, que ainda não sabe o real efeito que o episódio terá em sua carreira.
Bom de bola ou filho de craque?
A má atuação do atleta levanta na torcida uma dúvida que já existia internamente no clube: Mattheus é realmente bom de bola ou está nessa por ter um pai famoso? Aparentemente, a resposta é: um misto das duas coisas.
Mattheus teve momentos excelentes na base. Para todo e qualquer jogador, a transição entre juniores e profissional é recheada de percalços e mesmo craques como Neymar (ou, ainda, Zico) precisaram de “paciência” para compreender as diferenças que existem nas categorias.
Por outro lado, há um certo preconceito com o meia; chamado de preguiçoso pelo estilo excessivamente cadenciado, ele não encontraria espaço em um futebol cada vez mais físico e competitivo se não tivesse o “pai certo”. Atletas como Thomás e Adryan, tido como maiores promessas dessa geração, foram emprestados, enquanto Mattheus seguiu no clube, por exemplo.
Caso não é inédito
Antes de crucificar Mattheus, é importante lembrar que ele não é o primeiro e nem será o último dos casos. Em muitas famílias no mundo, filhos seguem a profissão dos pais e o no futebol não é diferente.
Quando o pai não é um extra-classe, não é raro que o filho, inclusive, o supere – vide Paolo Maldini, maior jogador da história milanista, filha de Cesare, ex-jogador do rossonero. Domingos, pai, e Ademir, filho, foram cracaços, cada um em sua época, alimentando a tese de que, muitas vezes, a genética ajuda.
Mattheus sofre hoje com problema semelhante ao que tiveram Thiago (Zico), Romarinho (Romário), Enzo (Zidane) e Jordi (Johann Cruyff), pra ficarmos em alguns exemplos. Precisa superar a desconfiança de que é realmente talentoso em um local onde o pai triunfou – problema que Thiago Alcántara, por exemplo, não sofre. É uma pressão tremenda e qualquer passo em falso, pode minar para sempre a carreira do garoto.
A solução?
Nenhuma solução possível é simples. Ou bem Mattheus irá aumentar sua intensidade de treinamentos, mudar sua atitude em campo e provar que pode ser tão bom no profissional como era na base, ou terá que buscar um caminho longe da Gávea. Às vezes, um empréstimo é uma boa saída para um jogador jovem; é uma oportunidade de jogar com mais regularidade – e, consequentemente, amadurecer seus fundamentos – e também conhecer uma nova realidade.
Até o fim do ano, Mattheus terá pouco mais de 30 dias de trabalho (6 jogos no período) para provar que a derrota para o Galo foi um acidente de percurso. Recuperar a confiança nesse momento é fundamental para que ele tenha forças de começar 2015 em alto nível.
Fonte: 90 min