Justificando as Cotas de TV de Flamengo e Corinthians.

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INTRODUÇÃO
Após um período particularmente difícil, o Blog Teoria dos Jogos retoma suas publicações com a promessa de que este seja seu grande ano. E para fazer com que as postagens tenham cada vez mais frequência, contamos com a boa e velha fidelidade de você, leitor apaixonado por análises, estatísticas e pesquisas de torcida. A reedição desta parceria, que já deu muito o que falar, tem tudo para dar certo neste 2015 ainda incipiente.
Ao longo dos últimos anos o Blog Teoria dos Jogos se tornou um dos poucos espaços especializados na divulgação e análise de audiências televisivas na internet brasileira. Trata-se de uma questão que vem tomando cada vez mais corpo e importância.  É a audiência quem determina o número de transmissões de cada equipe, impactando tanto nos repasses da própria televisão quanto no investimento de anunciantes e patrocinadores.
Recentemente, uma vertente ideológico-filosófica questiona a “justiça” de se pagar tanto para determinados clubes (especificamente, Flamengo e Corinthians), o que supostamente geraria desequilíbrios maléficos. O resultado: políticos surfando nesta onda, apresentando projetos de lei e prometendo redistribuições equitativas.
Um assunto tão importante demanda análises mais racionais do que as que se tem notícia. Colunistas que distorcem a realidadecom base em informações pela metade, jornalistas que sequer sabem a diferença de pontos e share, fundindo-os bizarramente… Pessoas que fomentam um tsunami de textos viciados e enviesados. Infelizmente no Brasil, o disseminar de determinadas “informações” é a maneira mais rápida de fazer mentiras parecerem verdades.
Pra início de conversa, é absolutamente impossível compreender audiências sem ter em mente a impossibilidade de fazê-lo apenas com base em números de… audiência. Soa paradoxal, mas significa que a audiência absoluta – medida através dos famosos “pontos” do Ibope – muitas vezes esconde distorções. Fins de semana com menos televisores ligados (ex: feriados), partidas jogadas em datas pouco usuais (ex: aos sábados) ou clubes com mais jogos às quartas (dia de audiências superiores) são variáveis que precisam ser levadas em conta.
Todas elas, entretanto, podem ser desmascaradas quando analisados o share, ou “participação” – que representa o percentual de televisores ligados em relação ao total de aparelhos. Portanto, não basta dizer que “meu time deu mais pontos de audiência”. Se o share for reiteradamente inferior, pode ser que ele esteja apenas sendo televisionado em condições mais favoráveis. Somente em igualdade de condições, quem dá mais share atinge maior pontuação. Eis a característica dos verdadeiros “campeões de audiência”.
Além do mais, a quantidade de partidas influi decisivamente nos números finais de uma dada equipe na TV. Quanto mais jogos transmitidos, maior tendência de queda pela exposição de más fases ou confronto com adversários despretensiosos. Times de menor torcida tem apenas clássicos veiculados  – justamente quando se registra maior audiência. Por fim, o mais natural: competições internacionais ou em fases avançadas fazem com que se alcance melhores números.
AUDIÊNCIAS DA TV EM 2014
No primeiro trimestre de 2014, este Blog divulgou parcialmente as audiências dos Estaduais, ainda nos tempos de Globoesporte.com. Agora, dividiremos a análise entre Brasileirão e Copas (Libertadores, do Brasil e Sul Americana). Separamos também as praças do Rio e de São Paulo. Por fim, audiências e shares totais se referem ao somatório de Globo e Band, emissoras responsáveis pela veiculação do futebol em TV aberta no país. Ainda que os globais tenham valor de mercado muito superior, não restam dúvidas que o somatório é o melhor mapeamento do universo de consumidores do futebol. Os dados foram apurados diretamente com a TV Globo.
RIO DE JANEIRO

A queda do Vasco para a Série B em 2014 gerou um claro impacto no perfil do televisionamento carioca. Indo contra o senso comum, o Fla se manteve estável na liderança (17 jogos), e os que subiram foram Botafogo (9 jogos) e Fluminense (14 jogos). Os times representam uma escalada no tocante à audiência total: 16,3 do Alvinegro contra 19,8 do Tricolor e 22,6 do Rubro Negro. O maior apelo do Flamengo se solidifica através da participação: 45%, contra 40% do Fluminense* e 35% do Botafogo.
*O levantamento não contempla o share de quatro jogos do Flu, contra um do Fla.
Conforme dito na “Introdução”, expor o percentual de jogos às quartas é importante por razões comportamentais. Torcedores tendem a assistir mais futebol na TV durante a semana, enquanto comparecem às arquibancadas nos fins de semana. Neste sentido, a distribuição dos jogos no Rio de Janeiro é relativamente equânime, com leve prejuízo ao Fogão (22% às quartas, frente a 29% da dupla Fla-Flu). O Bota também não se beneficiou com a transmissão de nenhum clássico, enquanto os dois Fla x Flus (entre as maiores audiências do ano) foram veiculados. Botafogo e Fluminense jogaram uma vez aos sábados – dia menos afeito aos bons números.

Com relação às Copas (Libertadores e do Brasil), não há que se fazer distinção ao dia da semana, pois todos os jogos são às quartas. Por conseguinte – e com base no parágrafo anterior – os números das agremiações se inflam. Também neste caso verificamos o retorno do Vasco às transmissões (5 jogos), em número superior a Botafogo e Fluminense (3 cada). Ainda assim, a primazia do Flamengo foi absoluta: 11 eventos, o equivalente ao somatório de todos os rivais.
Fluminense (17,3 pontos e 32% de share*) e Vasco (18 pontos e 32% de share) se notabilizam pelo equilíbrio. Mas por terem jogado apenas a Copa do Brasil, perderam feio para o Botafogo e seus 21,3 pontos (41% de participação). Isto porque 2014 marcou o retorno do Alvinegro à Libertadores, fazendo com que seus três jogos transmitidos valessem pela competição. Resta clara a diferença de apelo da competição continental em face ao mata-mata nacional.
*O levantamento não contempla o share de dois jogos do Flu
Cristalina novamente é a vantagem do Flamengo em audiência. Tendo jogado a Libertadores e a Copa do Brasil – e chegado longe na segunda – o Rubro-Negro amealhou nada menos que 26 pontos médios e 46% de share. Cerca de 50% a mais que o Fluminense, a título de comparação.
SÃO PAULO

Uma característica histórica do televisionamento em São Paulo é a predominância absoluta do Corinthians. Para que se tenha ideia, no BR-2014 foram 19 jogos, dois a mais que o Flamengo no Rio – mesmo com apenas três grandes cariocas na Série A. Mesmo assim, o ano trouxe à tona um processo nem sempre corriqueiro: o boom de partidas do São Paulo. Foram 17, muito acima da proporção de 2:1 a favor do Corinthians em 2013. Enquanto isso, Santos e Palmeiras não tem vez: apenas três e cinco transmissões, respectivamente.
Vem de Sampa as análises mais equivocadas por parte dos “especialistas” citados na Introdução. Isto porque a fotografia das audiências mostra um Corinthians, com 22,3 pontos médios, abaixo do Palmeiras (22,4). Um tanto óbvio, se levarmos em conta que dois dos cinco jogos do Verdão (altíssimos 40%) foram clássicos justamente diante do Corinthians! O mesmo ocorre com o Santos, alinhado ao Corinthians em 45% de share*. Das três partidas do Peixe em TV, duas (66%) foram clássicos – respectivamente contra Corinthians e São Paulo. Ora, para equipes com tão poucas transmissões, o alto percentual de clássicos gera um viés absolutamente irreal. É como se Palmeiras e Santos só aparecessem na TV para confrontarem Corinthians e São Paulo.
* O levantamento não contempla o share de três jogos do Corinthians, dois do Palmeiras e um do São Paulo.
Diante deste cenário, soaria apropriado comparar apenas Corinthians e São Paulo, dado o grande número de partidas e a diluição das “causas perturbadoras”. No entanto, veremos que até aí existem distorções.
Aparenta equilíbrio.  A audiência foi de 22,3 pontos a favor do Corinthians, contra 21,7 do São Paulo. A Fiel amealhou 45% de participação, frente a 42% dos tricolores. Mas um olhar acurado demonstra que o Tricolor foi premiado com transmissões em dia nobre: nada menos que 47% de seus jogos na TV foram às quartas, contra míseros 11% do Corinthians e nenhum (!) de Palmeiras ou Santos. Concentração injustificável em claro benefício ao clube do Morumbi. Em tempo: SPFC, Corinthians e Palmeiras jogaram uma vez aos sábados.

Embora 2014 tenha sido um ano atípico pela ausência de paulistas na Libertadores, viu-se nas outras Copas (do Brasil e Sul Americana) mais do mesmo. Pouco Palmeiras (dois jogos) e Santos (três), muito Corinthians e São Paulo (oito). O Palmeiras com audiências em baixa (16,5) e o Santos melhor por ter jogado duas semifinais da Copa do Brasil (18,7 pontos médios). Por fim, novamente o São Paulo em algum equilíbrio diante do Corinthians (18,6 a 19,7 em pontos). Aliás, se há um quesito que escancara o desânimo paulista, é o share: todos abaixo de 40%*. O pior foi o Palmeiras, com 31%. O melhor, adivinhem? Corinthians, 37%.
* O levantamento não contempla o share de um jogo do São Paulo e um do Corinthians.
CONCLUSÃO
A verdade é uma só: se excluirmos distorções de diferentes naturezas, Flamengo e Corinthians nadam de braçada no tocante às audiências. A primazia do Mengão no Rio é tão grande que independe das próprias “causas perturbadoras”. No lado oposto da Dutra, outros tentam (mas não conseguem) fazer frente ao Corinthians. Fla e Timão são carro-chefe em suas respectivas praças, muitas vezes insuflando números dos próprios rivais. Emissoras comerciais, como Globo ou Bandeirantes, viveriam enormes dificuldades se não lançassem mão deste trunfo.
Mesmo assim, fica uma pergunta. Em que pesem números relativamente parelhos, por que tamanha discrepância nos valores pagos a título de televisionamento? A resposta: em negócios de massa como a TV , qualquer variação pode representar somas vultosas de consumidores. Um ponto de audiência equivale a 193.281 pessoas em São Paulo e 109.982 no Rio. Por isto, o mercado precifica cada ponto adicional em muitos milhões de reais. Não é preciso registrar o dobro quando dois ou três pontos de diferença valem como diamante. É tão simples quanto isto.
A César o que é de César.

Fonte: Teoria dos Jogos
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