Natural o olhar de estranhamento diante deste mercado de muita movimentação e de pouca realização. Em especial, este mercado de pouco dinheiro que abre 2015. Há um consenso no ar de que a responsabilidade chegou ao futebol. Talvez seja verdade em alguns casos. O fato é que com ela, ou talvez antes dela, tenha chegado a necessidade.
Começa um ano especial. Como imaginar que um mercado que tem mais de 80% dos direitos econômicos de seus jogadores nas mãos de terceiros não fosse sentir os efeitos das limitações impostas pela Fifa aos investidores? Foi como se uma fonte de receita importante dos clubes tivesse secado. Pode ser temporário, pois há quem aposte que os investidores não vão embora. Vão se adaptar.
O fato é que o impacto é inevitável. Conta-se nos dedos, das transações fechadas até o último dia de 2014, quantas tiveram desembolso de algum clube do país. Marcelo Cirino, personagem da principal transferência desta janela até aqui, chegou ao Flamengo graças a um adiantamento de um fundo de investimentos. Jogadores livres ou emprestados são disputados a tapas.
Olhemos agora para as novas arenas que abrigam os principais jogos de futebol no país. A conta é alta. E boa parte delas está nos ombros dos clubes. O Corinthians, clube que, segundo levantamento da consultoria BDO, mais gastou dinheiro com futebol em 2013, tem uma conta de R$ 100 milhões a pagar em 2015. Começa o ano sem previsão de receita de bilheteria. E começou a janela de forma comedida.
Cautela igual têm o Internacional, terceiro maior gastador em 2013, e o Grêmio, este último envolto numa conta difícil de fechar com sua nova arena.
Não é tudo. Os últimos meses vêm apresentando aos clubes um mundo real que, quase todos, duvidaram que algum dia fosse existir: o governo cobra seus créditos. Impõe retenções de receitas ou acordos com parcelas altas.
Sem falar na gangorra tão característica do futebol brasileiro. O clube superpoderoso de uma temporada é o humilde do ano seguinte. O passo maior do que a perna, seja por pressão política, por falta de planejamento, por megalomania ou por uma mistura de todos estes ingredientes, mais cedo ou mais tarde apresenta a conta. O Botafogo que o diga. O quinto maior gastador em 2013, ano em que se classificou para a Libertadores, está hoje na Segunda Divisão.
Diante do quadro, é necessidade ou responsabilidade? O salário especulado de Cristian, os valores da disputa por Dudu, apenas reforçam o questionamento.
Há um lado bom. Talvez a necessidade, ou a responsabilidade, ou ambas, ajudem a consolidar uma realidade que o futebol brasileiro ainda desconhece: a manutenção dos elencos. Uma lição que o Cruzeiro ensinou nos últimos anos, ainda que sustentado por resultados. E que, em 2015, o promissor São Paulo pode reforçar. Antes de perder as chances de ser campeão brasileiro, o tricolor paulista sustentou 11 rodadas com aproveitamento de 80% dos pontos. Era o “Cruzeiro da vez” na reta final do Brasileiro. Mas com um time que existia havia três meses, tempo insuficiente para compensar a distância que já o separava do líder. Com a base mantida, pode ser mais forte.
O cenário do mercado, a crise ou a recessão podem dar um mínimo de estabilidade aos times num futebol em que a janela de entrada e saída parece sempre aberta. Ao menos, jogadores podem fixar residência. Porque, quando se trata de treinadores, continuamos sendo o país da esquizofrenia, o país que demitiu o terceiro e o quarto colocados do campeonato. Neste caso, não parecia haver necessidade. E muito menos responsabilidade.
Fonte: Blog do Mansur