República Paz e Amor – Assisti ao treino contra a Cabofriense por um dos canais do PFC. Na metade do segundo tempo, quando Eduardo da Silva tirou o colete, a repórter Janaína Xavier anunciou: “Vem aí Carlos Eduardo.”
Gelei.
Pensei estar de volta a um pesadelo recente e que imaginava pra sempre superado. O cara pode ser desajeitado e não ter intimidade com a criança – se alguém aí pensou no Cáceres, bingo –, mas tem que correr, suar, dar o sangue, honrar a belíssima camisa que veste. Justiça seja feita: exatamente o que o Cáceres faz. Ao ouvir o nome pronunciado por Janaína Xavier, convivi alguns segundos com a lembrança daquele fantasminha em campo, que corria três metros pra cá e três metros pra lá como se suspirasse no melhor estilo Macunaíma: ai que preguiça! Felizmente, Janaína percebeu – ou foi avisada – em seguida, e corrigiu a informação rapidamente, interrompendo a tortura psicológica e me economizando alguns anos de terapia.
Quanto ao jogo, sejamos coerentes. Se ao empatar com o Macaé engatamos o discurso da falta de ritmo, da fase de observações etc., não podemos sair por aí cantando loas por uma goleada em cima do time de Cabo Frio – cidade que, até hoje, só deu uma contribuição importante à história do futebol brasileiro: o magnífico lateral-direito Leandro.
Nosso horroroso primeiro tempo foi salvo por um bom chute de Gabriel e uma jogada individual do Arthur Maia, intermediada por um preciso cruzamento de Pará e finalizada de modo estranho por Marcelo Cirino. (Aquela bola só entrou porque bateu no zagueiro, não?) Para quem se apega às tais observações, valeu pelo Arthur Maia e pelo Cirino, que podem realmente balançar o chão da praça, mas o lance mais importante do jogo foi o gol de empate da Cabofriense, por causa do erro de Samir.
Artigo primeiro, parágrafo único: nosso time é limitado. E revoguem-se as disposições em contrário. Entretanto, diante do cenário caidaço do futebol brasileiro, se nos ajeitarmos e, sobretudo, se jogarmos com aplicação, dá para encarar qualquer um e disputar qualquer coisa.
Uma tão óbvia quanto sábia máxima futebolística diz que só perde pênalti quem bate. Só erra quem tá lá dentro. Mas errar é uma coisa, ser displicente é outra. Fiz uma brincadeira com Samir no post anterior, a respeito de suas escorregadelas fatais, e pode parecer que não gosto dele. Pelo contrário: gosto bastante. É firme, tem impulsão e velocidade, não costuma sentir vergonha em pôr a bola pra fora quando a coisa aperta. Mas, voltando ao irrevogável artigo primeiro, só vamos superar nossas limitações se tivermos concentração e seriedade do primeiro ao último momento. Ok: é duro manter a paudurecência em jogos como esse, mas se não for assim, vamos observar o quê e melhorar como?
Uma historinha para ilustrar.
O grande Mozer ainda era apenas um zagueiro promissor e tinha acabado de ser lançado no time de cima do Flamengo. Jogava muito, mas gostava de fazer uma graça. Era o começo de uma partida no Maracanã, contra o Serrano (espécie de Cabofriense dos anos oitenta), quando sobrou uma bola fácil na nossa zaga. Mozer fez pose para dominar, o atacante adversário tomou e criou uma confusão danada. Não deu em gol, mas o treinador do Flamengo, Dino Sani, viu ali uma oportunidade de decidir o futuro daquele garoto: feito um pai rigoroso ou um dedicado pedagogo, mandou aquecer o zagueiro reserva e decretou a substituição sumária de Mozer, como se o colocasse de castigo de frente para a parede. Alguns anos depois, Mozer ganharia tudo pelo Flamengo, esteve na Copa do Mundo de 90 e só não foi à de 94 por problemas médicos.
Vanderlei Luxemburgo agiu bem em não tirar Samir de campo ontem, não precisava tanto. Mas bem que poderia contar essa historinha pra ele.
Jorge Murtinho
Prezado Jorge,
Parabéns pelo seu texto, me fez voltar no tempo. Recordo desse lance como se fosse hoje. Se não estiver enganado esse foi um dos motivos pelo qual o Dino Sani saiu do Flamengo e o Carpegiane assumiu.
Lembro-me de tudo ou quase tudo que foi descrito neste contexto.Tenho muita saudades quando Mozer,Leandro, Júnior,Adilio, Andrande,Zico jogavam, pois este time tinha muita raçã principalmente Rondinelli, não existia jogo perdido lutavam até o fim.
É amigo Jorge, fui um dos que esbravejou, xingou e queria a substituição do Samir, pois a todo momento ele segurava a bola na área e esperava o combate do adversário e com isso era obrigado a atrasar a bola no fogo para o Paulo Vitor e por isso o nosso goleiro a todo momento dava chutões para frente.