Fonte: Falando de Flamengo
Ao perceber que sua missão estava mais do que cumprida, o mestre do Jiu-Jitsu Helio Gracie (1913–2009) declarou, certa vez: “Já disse aos meus filhos que quando eu morrer quero uma festa. Sem bebida, sem esculhambação.” Mestre do futebol rubro-negro, Carlinhos Nunes, o Violino, ganhou sua festa, bonita, simples, nessa terça, 23 de junho, no salão nobre do Flamengo, à beira da Lagoa. Sob o sol forte, o verde do gramado da Gávea reluzia.
A bandeira do clube estava a meio-mastro. Ao lado do ataúde onde o clássico meia descansava, uma mesa forrada de vermelho exibia dez taças conquistadas com sua ajuda. Lá fora, um bandeirão com o rosto sorridente de Carlinhos oi hasteado. Elegante como o estilo de jogar do falecido, João Victor, membro da Orquestra de Câmara Carioca, adentrou o recinto e entoou, num volume respeitoso, o hino do Mais Querido do Brasil ao violino. Aplausos e lágrimas vieram como resposta ao solo.
Um dos primeiros ex-jogadores a aparecer foi Zinho, campeão de tudo. “Cheguei aqui com 11 anos de idade sem saber de nada, só sabia bater bola. Futebol, mesmo, aprendi com esse aqui”, disse um choroso craque Crizam César (para os íntimos). A irmã, dona Silvia, e as filhas receberam o abraço de mais algumas dúzias de ex-jogadores, de pelo menos cinco gerações de craques do Flamengo.
Todos tinham boas histórias para contar sobre o vitorioso treinador. Um deles lembrou que, quando ganhava títulos como técnico, Carlinhos se enfiava no vestiário, emocionado, e dizia que comemoração era para os jogadores. Chegou a ser, certa vez, arrastado de volta ao gramado do Maracanã por dois amigos para ser saudado por seus meninos e por seus fãs empoleirados nas arquibancadas.
Um companheiro íntimo de Carlinhos lembrou que, ali por 1985, ele recebeu um telefonema. Um cartola do Fluminense queria retirá-lo da Gávea para treinar o time principal das Laranjeiras. Carlinhos agradeceu amavelmente, sem nem ouvir a proposta financeira. Preferiu ficar na base do Flamengo do que assumir o rival. Como rubro-negro, jamais desafinaria.
O violino continuava tocando baixinho no salão. Velhos jogadores trocavam abraços, sorrisos, matavam a saudade. Unir a Gávea em polvorosa era mesmo com Carlinhos, e na sua morte não foi diferente: a família recebeu a ligação e os pêsames de praticamente todos os ex-presidentes do Flamengo ainda vivos, bem como do atual, Bandeira de Mello, presente desde as primeiras horas da justa homenagem.
Surgiu então, entre conselheiros do clube, a notícia de que já havia um abaixo-assinado circulando para que Carlinhos Violino se tornasse o nome de uma das ruas pequenas próximas ao Flamengo. Nada mais justo, concordariam todos, do segurança ao presidente. Vale lembrar que, nesses tempos em que nossos meio-campos são verdadeiras avenidas, que ao menos o saudoso Carlinhos seja para sempre rua, uma rua tranquila, simpática e simples, como ele soube ser ao longo da vida.