Bastidores – o que sustenta Wallace no Flamengo?

Desde o começo de 2015 conhecemos bem os problemas de Wallace. Apesar das  boas participações na reta final da Copa do Brasil, principalmente, o zagueiro apresentou um forte declínio, bastante claro na última temporada. Ele passou de titular inquestionável e “companheiro ideal de Samir” a questionado, vaiado, pressionado e símbolo de um Flamengo cambaleante – ao lado, é claro, do incansável Márcio Araújo. O fato, porém, é que em poucos momentos ele deixou o onze inicial. Apesar das seguidas falhas e reclamações da torcida, nenhum treinador ousou sacá-lo do time principal por muito tempo. E qual é a razão?

Antes de tudo, devemos nos lembrar que nunca tivemos boas opções para suplantá-lo. Marcelo, César Martins, Samir e companhia apresentavam desempenho tão regular ou ruim quanto, e não havia unanimidades entre eles. O que proponho, entretanto, é que sua manutenção soberana se deu não somente pela falta de alternativas inquestionáveis, mas por fatores extracampos, que não alcançavam somente a todo o elenco como também à comissão técnica. Por que Wallace ainda é titular e capitão do Flamengo?

No ambiente rubro-negro, Wallace é visto como líder por todos – ou quase todos. Apesar dos pesares, o defensor é um profissional exemplar, que consegue o respeito e a atenção dos companheiros e a liderança carismática do grupo. Apoia os mais jovens, colabora socialmente com pessoas carentes e incentiva estudantes a cultivarem o hábito da leitura. Tem um blog (Wallace leu), onde dá dicas de leituras passadas, e já se prontificou algumas vezes para quadros da Rede Globo que levaram atletas profissionais a escolas primárias, muitas das quais carentes. Dentro do clube, criou uma biblioteca para os jogadores juniores, frequentemente afastados dos estudos pelo futebol.

Segundo palavras do próprio Muricy Ramalho, destemido e recém chegado, o zagueiro é “muito focado e dedicado. Surpreendeu na parte física na pré-temporada e é um líder positivo para o grupo”. Com bom histórico disciplinar, ainda é regrado na vida pessoal, considerado como um jogador “de família”. No elenco é, especialmente, referência para os jogadores juniores recém promovidos ao profissional. Politicamente, é respeitado não somente por nossa equipe, mas a nível nacional. Foi eleito, inclusive, como integrante do conselho técnico da Primeira Liga, ao lado de Lúcio Flávio, pelos capitães dos outros clubes.

Internamente, além da organização da biblioteca, Wallace também bancou do próprio bolso a reforma dos vestiários do Ninho do Urubu, que tinham situação precária devido à falta de dinheiro do clube. Juntamente com Paulo Victor, aplicaram algo em torno de R$ 12 mil.

Um amigo que cobre os jogos do Flamengo pela imprensa já havia me contado sobre a liderança que Wallace exerce sobre o plantel rubro-negro. No último amistoso contra o Santa Cruz, em Recife, Wallace concordou em adiar a saudação à torcida em nome da manutenção do protocolo televisivo, caminhando diretamente para a perfilação e canto dos hinos pernambucano e brasileiro. O grupo, sem questionamentos, o seguiu. Toda e qualquer insatisfação com temperatura do vestiário, tempo de aquecimento e pormenores preliminares eram levados e debatidos por Wallace, como se fosse o líder natural do elenco.

Por fim, Wallace é o tipico líder natural, que também é boa praça. Cativa seus companheiros, tem o respeito de todos e isso explica, em termos, porque todos saem em sua defesa e esperam dias melhores, enquanto a torcida o castiga. Seu momento é realmente terrível, e acredito que ele não tem a qualidade técnica que um zagueiro do Flamengo deve ter. Mas, no jogo psicológico, o elenco o respeita, apoia e segue. Só falta o essencial: futebol.

Rodrigo Coli
rodrigo.coli@colunadofla.com