A cada lance certeiro, um soco no ar, um grito de alegria e uma explosão que contagia. Seja após um simples arremesso debaixo do aro, uma jogada aos trancos e barrancos na raça ou uma bola de três pontos quase do meio da quadra. A intensidade é sempre a mesma e indica com precisão absoluta o autor da façanha. Carlos Alexandre Rodrigues do Nascimento ou apenas Olivinha sempre foi assim. Do primeiro contato com a bola de basquete aos 9 anos, nas categorias de base do Grajaú Contry, tradicional clube da Zona Norte do Rio de Janeiro, até o título da Copa Intercontinental em 2014 com a camisa da Flamengo, a entrega é total, 110% como ele costuma dizer. A maneira com que o ala-pivô se atira em cada disputa e briga por centímetro a centímetro dentro do garrafão se tornou tão especial para a maior torcida do país, que ele próprio reconhece que algo não vai bem quando esse roteiro sofre alguma interferência.
– Não consigo me ver jogando de outra maneira, sem vibração, e se isso acontecer pode ter certeza que tem alguma coisa errada ou estou passando por um momento muito ruim. Principalmente aqui no Flamengo. É minha arma, meu combustível e aqui as pessoas notam logo. Quando era criança sonhava muito que seria jogador, depois passei a sonhar que seria campeão mundial, que jogaria uma Olimpíada e seria reconhecido. Mas até chegar lá o caminho é árduo. Sonhava como qualquer criança e hoje percebo que já realizei boa parte desses sonhos. O maior titulo da minha carreira foi o Mundial e até hoje me emociono com isso, porque no Brasil só Flamengo e Sírio conseguiram essa façanha. Sei que faço parte de um grupo seleto, motivo de muito orgulho e que será lembrado pelo resto da vida. Depois de tudo que passei ter esse reconhecimento do torcedor do Flamengo me deixa bastante feliz. Quando entro na quadra e vejo a torcida gritando meu nome e fazendo barulho, é incrível. As pessoas me param na rua para conversar, para elogiar, para tirar uma foto ou pedir um autógrafo. Outro dia fui jantar com minha esposa e uns amigos e um rapaz saiu da mesa dele e veio falar que era muito meu fã e que queria me agradecer pela minha vibração em quadra. Isso me emociona bastante. Não esperava chegar a ter esse reconhecimento todo – afirma Olivinha, que teve médias de 10,9 pontos, 5,2 rebotes e uma assistência nos 35 jogos disputados no NBB 8.
Reconhecimento que não veio apenas do torcedor rubro-negro, mas também de seus companheiros e dos dirigentes da Liga Nacional de Basquete (LNB). Depois de bater na trave por mais de uma vez, finalmente o ala-pivô teve seu trabalho recompensado ao ser eleito o MVP das finais do NBB 8, única honraria que faltava em seu currículo após uma enxurrada de títulos com a camisa do Flamengo. Para quem se doa tanto em prol do coletivo, isso é apenas mais um detalhe.
Assim como a escolha do número 16 às costas. Mas nem sempre foi assim. Se nos primeiros anos no Grajaú ele sempre vestiu a 9, a mudança para o Flamengo não foi somente de bairro. Pelas bandas da Gávea, usou várias delas (4, 7, 10, 18 e 21) antes de confirmar seu talento com a 16. O que quase ninguém sabe é que a opção aconteceu por influência do amigo de infância Michel Macedo, jogador de futebol do Almeria, da Espanha.
– Nós morávamos no mesmo condomínio da Aeronáutica, na Praça Seca, e crescemos juntos. Ele é lateral direito e jogava com a camisa 2 no Flamengo, mas quando foi para a Espanha em 2008 passou a usar a 16, e nós combinamos de jogar com o mesmo número para trocar as camisas no fim do ano. Como deu tudo certo e eu tive um excelente desempenho na minha primeira temporada com o Pinheiros resolvi não mudar e desde então uso a 16 – explicou o jogador mais valioso das finais do NBB, convocado por Rubén Magnano para a disputa do Campeonato Sul-Americano da Venezuela, e 26 de junho a 2 de julho, em Caracas.
Mas Olivinha não vive apenas para o basquete. Brincalhão, dono de uma personalidade extrovertida e bastante ativo nas redes sociais, o jogador falou de tudo um pouco menos de 48 horas depois de conquistar o tetracampeonato do NBB. No bate-papo de quase uma hora, o ala-pivô revelou alguns segredos e muitas curiosidades vividas ao longo de seus 33 anos.
Em referência ao número de sua camisa, o GloboEsporte.com selecionou as 16 melhores histórias contadas pelo queridinho da torcida rubro-negra.
PRIMEIROS ARREMESSOS NO GRAJAÚ COUNTRY
Os primeiros arremessos foram na quadra do Grajaú Country, com apenas 9 anos. Por lá ele ficou do pré-mirim até o segundo ano de infantil, quando trocou a Zona Norte pela Gávea, onde se profissionalizou em 2002. Como amador, conquistou os títulos no infantil e juvenil e teve Paulo Chupeta como seu primeiro treinador.
AVENTURA NO MÉXICO E SOLIDARIEDADE AO IRMÃO
O único clube que defendeu fora do Brasil foi o Barreteros, de Zacatecas, na região central do México. Mas não durou muito. Em solidariedade ao irmão Olívia, seu companheiro na equipe e que acabou sendo dispensado por um treinador recém-chegado, Olivinha decidiu ir embora antes do fim de seu contrato, que era de sete meses.
GRATIDÃO AO TÉCNICO CLÁUDIO MORTARI
Se no Flamengo Olivinha conquistou seus títulos mais importantes, foi no Pinheiros que deu um salto de qualidade na carreira. E um dos principais responsáveis por isso foi o técnico Cláudio Mortari.
– Tenho que dar os méritos ao Cláudio Mortari. Ele confiou no meu trabalho quando muita gente não confiava e já não esperava mais nada de mim depois da minha passagem por Uberlândia. Quando soube que iria trabalhar com ele tive certeza de que coisas boas viriam, porque já havia trabalhado com ele no Flamengo. Essa passagem no Pinheiros foi marcante – afirmou.
CARREIRA CURTA COMO GOLEIRO
Morador de um condomínio residencial da Aeronáutica, na Praça Seca, Zona Oeste do Rio, durante a infância, Olivinha passava o dia jogando futebol como todo garoto. A brincadeira ficou séria, e o ala-pivô, que já era alto para sua idade naquela época, chegou a jogar como goleiro no clube dos suboficiais da Aeronáutica. Olivinha ainda tentou a sorte na linha, mas os treinos no basquete falaram mais alto e, por sugestão do técnico Miguel Ângelo da Luz, acabou trocando os gramados pelas quadras.
– A mudança aconteceu quando o Miguel conversou com meu pai e sugeriu que eu entrasse numa escolinha de basquete. Como eu já gostava por causa do meu irmão, acabei topando – lembra.
FACULDADE À DISTÂNCIA
Apesar de saber que o basquete seria seu ganha-pão desde moleque, Olivinha nunca abandonou o colégio e sempre conseguiu conciliar a bola laranja com os estudos. Além de ter o segundo grau completo, começou esse ano a cursar a faculdade de marketing. Como as aulas e os trabalhos são realizados na internet, o jogador admite que é preciso ter foco.
– Eu consigo conciliar esse estudo à distância numa boa porque consigo estudar na hora e onde eu quiser, já que aulas estão no computador. Dá para ir levando. Costumo estudar mais em casa mesmo, já que nas viagens fico muito concentrado para os jogos. Só quando estou sem fazer muita coisa que pego e dou uma olhada – explicou.
INFLUÊNCIA DO IRMÃO OLÍVIA
Um das maiores promessas de sua geração, Olívia foi a grande influência do irmão mais novo. Nove anos mais velho que o caçula, o pivô de 2,11m começou nas categorias de base do Fluminense e disputou os Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996. Ele sempre foi um espelho para Olivinha.
– Desde cedo ele ia para as viagens da seleção e sempre voltava com algum presente para mim. Eram aquelas minibolas de basquete, camisas de time da NBA e fitas de VHS com os melhores momentos dos principais jogadores de lá. Lembro que enquanto assistíamos juntos a essas fitas, ele contava várias histórias sobre as viagens. Isso foi me entusiasmando cada vez mais porque via que ele amava o que fazia. Até hoje estamos sempre conversando, trocando mensagens e ele sempre se preocupa em me dar algumas dicas importantes.
ATRASOS NA BASE DO FLA E TOLERÂNCIA DE CHUPETA
Por conta do colégio, Olivinha ganhou uma fama indesejada nas categorias de base do Flamengo. Como estudava longe e ia para a Gávea de ônibus, chegava todo dia atrasado nos treinos. Na tentativa de ajudar, sua mãe passava na escola para levar outra mochila com as roupas do treino, dois sanduíches e uma garrafa de suco. Para ganhar tempo, o jogador trocava de roupa no colégio, comia dentro do ônibus, mas não tinha jeito, os atrasos eram constantes. Mas como a falta de pontualidade não era proposital e por uma boa causa, o técnico Paulo Chupeta tinha uma certa tolerância e sempre entendia o problema.
LONGE DA SELEÇÃO NA BASE, E 1ª C0NVOCAÇÃO AOS 26
Sem nunca ter sido lembrado pelos técnicos das seleções de base, Olivinha foi convocado pela primeira vez já como profissional em 2002, mas acabou cortado. Chamado novamente em 2004, ele estava com o Flamengo nas finais do Brasileiro daquele ano, que acabaram sendo adiadas por um problema no calendário, e sequer se apresentou. Até que finalmente em 2009 o ala-pivô teve sua primeira chance. Sob o comando de Moncho Monsalve, foi campeão da Copa América, em San Juan, Porto Rico.
VÍCIO PELO VIDEOGAME MUDOU COMPANHEIRO DE QUARTO
Quando não está em quadra com o Flamengo, é fácil encontrar Olivinha. Viciado em videogame, o ala-pivô admite que passa quase todo seu tempo livre em frente ao computador. Mas o camisa 16 não é o único e tem o capitão Marcelinho como seu meu maior rival. O vício da dupla é tão grande que para não atrapalhar a rotina do grupo, o supervisor André Guimarães foi obrigado a trocar os companheiros de quarto durante as viagens.
– Meu companheiro de quarto sempre foi o Marquinhos, desde a época o Pinheiros, já são sete temporadas juntos. Mas quando cheguei ao Flamengo, o Marcelinho e o Duda, que também jogavam videogame, dividiam o quarto e eu continuei com o Marquinhos. O problema é que como ele não é tão viciado como nós, acabava sempre ficando sozinho. Mas quando trocou o time e o Duda saiu, eu passei a dividir o quarto com o Marcelo, enquanto o Marquinhos sempre fica com um juvenil para fazer tudo para ele (risos). Nós passamos o tempo todo jogando, comprei até uma televisão portátil com um suporte para videogame e o negócio ficou profissional. O Marcelinho é o meu maior rival, mas não dá para ele não. Eu sempre ganho (risos).
PERNA DE PAU NA COZINHA
Se o videogame é o forte do MVP das finais do NBB, a culinária é seu ponto fraco. Péssimo na cozinha, a única coisa que o ala-pivô se arrisca a fazer é café e um ovo mexido com miojo, que, segundo ele, é sua única especialidade na cozinha.
FÃ DE FUTEVÔLEI, ARTILHEIRO E MARRA DE IBRAHIMOVIC
Outro passatempo de Olivinha é o futevôlei. Apesar do pouco tempo livre, o ala-pivô procura praticar sempre que pode. Os confrontos são raros, já que achar um parceiro também tem sido uma tarefa difícil. O jeito é mostrar suas habilidades nas tradicionais peladas de aquecimento apitadas pelo preparador físico Diego Falcão.
– O nível realmente é fraco, mas eu sou o artilheiro e quem coloca a bola para dentro. Não é todo mundo que tem talento, né! Tirando eu, Gegê, Marcelo e Marquinhos (risos)…. Falei que nem o Ibrahimovic agora (risos).
COLECIONADOR DE CHINELOS
Não é só o videogame que consegue atrair as atenções de Olivinha quando ele não está em quadra com a camisa do Flamengo. Acostumado a andar de chinelos para cima e para baixo, sempre gostou da marca Havaianas. O problema é que do alto de seus 2,03m, nunca foi muito fácil arrumar modelos que coubessem nos seus pés. Mas bastou encontrar um par de número 47 para se tornar um colecionador. Já são mais de 15, de todos os tipos e modelos. Desde os da Croácia, dos Estados Unidos, do Uruguai, da Inglaterra e da Holanda, produzidos para a Copa do Mundo de 2014, no Brasil, até alguns com os desenhos do Mickey, do Pluto ou até “Onde está Wally”. Recentemente, Olivinha teve uma baixa na sua coleção. Numa ida dessas à praia, o jogador teve seu chinelo dos Flintstones, com um pé do Fred e a outra da Pedrita, roubadas.
FAMA DE CACHACEIRO MESMO SEM BEBER
Se o torcedor rubro-negro adotou Olivinha como um dos principais ídolos do basquete do Flamengo, os rivais acharam uma maneira peculiar para provocar o ala-pivô. Apesar de não beber um gole de álcool sequer, o jogador ganhou a fama de cachaceiro.
– Eu já provei, mas odiei e não gosto de nada que tenha álcool. Pode ser vodka, cerveja, whisky, não consigo beber nada disso. Ainda bem, imagina o que eu ia fazer de besteira se bebesse. Mas é engraçado porque nas viagens as torcidas rivais me chamam de cachaceiro direto, isso é o que eu mais ouço. Eu não nunca apareci em lugar nenhum com um copo na mão ou uma garrafa de cerveja, só tenho essa cara de cachaceiro mesmo, mas não bebo nada (gargalhadas).
ROQUEIRO NAS HORAS VAGAS
Olivinha afirma que 98% das músicas que escuta são de grupos de rock’n roll. Foo Fighters, Queen, Beatles, Nirvana, Ramones, Mettallica e Pearl Jam são suas bandas preferidas.
REI DAS REDES SOCIAIS
Assim como o americano Jerome Meyinsse, Olivinha também é adepto do mundo virtual. As plataformas mais utilizadas pelo camisa 16 são o Twitter e sua página no Facebook. Ainda um iniciante no Snapchat, ele usa a ferramenta para interagir com seus fãs.
– É muito difícil conseguir responder todas as mensagens que recebo, mas faço questão de curtir todas para mostrar que leio tudo. Depois do título de sábado, passei 1h40 respondendo aos fãs.
LADRÃO DE FIGURINHAS
Outra mania de Olivinha é colecionar figurinhas. Em ano de Copa do Mundo, então, o hábito se torna uma obrigação. As história envolvendo torcedores e fãs são muitas, mas nenhuma foi tão engraçada e doeu no bolso do jogador quanto a que ele precisou reembolsar o ex-companheiro Nicolas Laprovittola.
– Quando faltavam 42 figurinhas para eu completar o álbum da Copa de 2014 fui um dia ao shopping e uma pessoa me reconheceu. Ele também colecionava e começamos a ver o bolo de repetidas do outro. Achei que tinha conseguido todas que não tinha e fui para casa feliz da vida, mas quando comecei a colar percebi que tinha feito uma confusão na hora de marcar as que não tinha e ainda faltava uma, a do time da Suíça. O pior é que como achei que tinha completado, dei meu bolo todo para o cara. Mandei uma mensagem no nosso grupo do time, perguntando quem tinha a do time suíço. Quando o Nico (Laprovittola) falou que tinha, fiquei aliviado e pedi que me desse porque era a única que faltava. Mas ele disse que não me daria se eu não pagasse. Fiquei desesperado, implorei, mas ele bateu o pé e disse que não ia dar. Cheguei no treino, ele trocou com alguém que também colecionava e eu fiquei de olho no bolo dele. Quando ele foi tomar banho, peguei o bolo e roubei a da Suíça e fui embora. Só avisei quando cheguei em casa, mas ele reclamou tanto que comprei 30 pacotinhos e dei para ele. Acabou saindo caro demais essa figurinha (risos).
Fonte: GE