Vocês devem ter notado que desde a semana passada a intimorata crônica esportiva brasileira, sempre vanguardista, tem se debruçado com especial interesse sobre a fragrância da moda, o Cheirinho de Hepta. As penas mais esclarecidas perceberam imediatamente o espirito bonachão de onde emana esse perfume. Outras, menos afortunadas com o dom da perspicácia, enxergaram zombaria e arrogância dos rubro-negros. Esqueçamos desses malas.
Creio já ter ficado claro para todos que não guardam mágoas no coração que o Cheirinho de Hepta é apenas o produto de uma reação química decorrente da condensação do Ácido Heptanóico na atmosfera. É um perfume natural, encontrado na natureza, não manipulado e sem qualquer contraindicação, desde que seja usado apenas pela torcida. Em nome das boas maneiras, e em conformidade com as leis antidoping, jogadores e dirigentes devem evitar a ingestão do Ácido Heptanóico assim como o uso do supracitado perfume. Porque, cá pra nós, nas internas, todo mundo sabe que o ácido e o cheirinho são apenas novos disfarces para o velho Já Ganhou, que é primo de 2º grau do oba-oba da Gávea.
Não é difícil avaliar o quão difícil é seguir essa norma singela. O Flamengo vem superando todas as expectativas e está mexendo com a mente da rapaziada. Eu mesmo, devo confessar, não ando muito bom das ideias. Como gato-mestre amador que sou, previa uma evolução mais lenta do Flamengo. Achava que o time, mesmo reforçado depois do sacolão da janela europeia, ia demorar mais tempo para, perdoe o meu mau francês, encaixar. Tenho absoluta convicção que nem o mais fanático dos mulambos esperava que o time se tornasse eficiente em tão pouco tempo.
Mas o Flamengo está aí, colocadão no G4, fustigando os paraguaios e fazendo o sangue da arcoirizada congelar nas veias. Sábado fomos ao Barradão para doutrinar os genéricos baianos e mesmo com aquele sustinho tradicional quando tomamos gol dos caras, deu pra vencer bem. Inclusive com mais um gol do nosso improvável artilheiro, o sr. Fernando. Que nas ultimas duas semanas tem feito mais gols pelo Flamengo do que em seus últimos 5 anos de carreira. Que fase!
O que torna a coisa toda mais difícil para os torcedores é que o nosso parâmetro de ganhar Brasileiro é a campanha épica de 2009 em que fizemos tudo errado e mesmo assim levamos o Hexa pra Gávea. Acontece que em 2009 o Flamengo na rodada 24 estava lá embaixo, em 8º. O que permitiu a construção de todo um raciocínio baseado na premissa do Deixou Chegar Fudeu. Mas nada será como antes. Forçoso reconhecer que no Brasileiro 2016 o Flamengo está estabelecendo um novo padrão, galgando parâmetros, como diria o pensador Sebastião Lazaroni.
Sim, estamos vivendo uma nova realidade no Flamengo. E um dos mais seguros indicadores do bom momento do futebol rubro-negro é a virtual ausência dos nomes de Godinho, Rodrigo Caetano e Mozer nos noticiários. Evidente que quando a turma da cozinha está trabalhando direito deixa de ser notícia, mas é nessas horas de aparente calmaria que percebemos que o trabalho desses caras é sério e está sendo bem feito. Aliás, provavelmente já estava sendo bem feito antes, nós é que não percebíamos porque estávamos muito ocupados cornetando os caras baseados apenas em resultados.
Mas agora já percebemos que o Hepta não é viagem de ácido. É uma realidade possível. Saber dosar o terror psicológico e o sapatinho frenético é a chave pro Hepta. Torcedores na fanfarra e jogadores jogando sua bolinha. Cada 1 com seu cada 1. Por isso a onda otimista e alto astral tomou conta da nação. E digo a você hoje, meus amigos, que embora nós enfrentemos as dificuldades de hoje e amanhã ainda temos um sonho. É um sonho profundamente enraizado no sonho rubro-negro de felicidade e justiça.
O sonho que um dia esta nação se levantará e viverá o verdadeiro significado de sua crença – nós celebraremos estas verdades e elas serão claras para todos, que os homens são criados iguais. O sonho que um dia, até mesmo nos estados mais xenófobos, estados que transpiram com o calor da injustiça, que transpiram com o calor de opressão e do preconceito, serão transformados em um oásis de liberdade e justiça Flamenga.
O sonho que um dia todo vale será exaltado, e todas as colinas e montanhas virão abaixo, os lugares ásperos serão aplainados e os lugares tortuosos serão endireitados e a glória do Hepta do Fuderosão será revelada e toda a carne estará junta.
Se eu tivesse poder para tal diria que o Flamengo deveria continuar bebericando o chá amargo do gradualismo e evitar ocupar a liderança do Brasileiro de forma precoce. Manter uma posição decente no G4, fustigando os paraguaios e tirando o sono da arcoirizada sem representatividade em termos nacionais até a rodada 34 ou 35 e só então partir pra cima. Quando já não houver mais tempo para reação dos pequenos. Mas, felizmente, não sou eu que decido essas coisas.
Quarta-feira nós cruzaremos bigodes com o porco e ainda que os afobados digam que será a partida decisiva do Brasileiro sinto-me na obrigação de lembrar aos amigos que o Campeonato Brasileiro só termina na 38ª rodada. O resultado do próximo jogo é muito menos relevante para a definição do campeonato do que querem nos fazer crer. Vamos pra cima dos buchas, nossa moral é sabidamente superior, mas não há a menor necessidade de encostarmos a lâmina do Agora ou Nunca em nosso próprio pescoço. O Hepta vir ou não vir não é uma questão de fé. É uma questão de tempo.
Mengão Sempre
Arthur Muhlenberg
Fonte: República Paz & Amor
Essa vitória já tá na conta! Belo texto!
que saudade dos textos do Arthuzao!!!
Como sempre, o Muhlemberg sendo genial na sua crônica. SRN