Quando Júnior levantou seu penúltimo troféu como capitão do Flamengo, o de campeão estadual de 91, após uma vitória por 4 a 2 sobre o Fluminense, no Maracanã, Ricardo Fischer tinha apenas sete meses de vida e jamais poderia imaginar que 25 mais tarde sua história se cruzaria com a do jogador que mais vezes defendeu o clube da Gávea, com 876 partidas disputadas. Mas uma foto tirada ao lado da camisa 5 usada pelo ex-lateral-esquerdo na conquista do Mundial Interclubes de 1981 acabou aproximando o principal reforço do time de basquete para a temporada 2016/2017 com um dos maiores ídolos da galeria rubro-negra.
O encontro entre os dois camisas 5, no entanto, foi impulsionado após um comentário de Júnior na foto postada pelo armador na sua página do Facebook. Incrédulo com a “moral” dada pelo maestro, Ricardo Fischer fez questão de localizar o ex-jogador através da assessoria de imprensa do clube para agradecê-lo pessoalmente.
Novamente em frente à camisa que virou o símbolo de sua chegada à Gávea, só que desta vez ao lado de seu dono, Fischer quase perdeu a fala. Recuperado de uma lesão na parte posterior da coxa esquerda, o reforço rubro-negro, que deve voltar ao time do Flamengo dia 17, contra o Pinheiros, às 20h, no ginásio Hélio Maurício, na Gávea, demorou para driblar a timidez e mostrar a mesma habilidade com que se livra dos adversários diante do ídolo.
– Eu estou meio nervoso, fico olhando assim e me recordo muito dele no futebol de areia. Lembro da história dele no Flamengo também, mas a lembrança mais recente é de quando ele jogava na praia mesmo. Até porque só o vi em ação em vídeo – disse Fischer, que nasceu em 91, dois anos antes de Júnior pendurar as chuteiras.
Passado o nervosismo, o armador presenteou Júnior com a sua camisa 5, levou na boa as gozações sobre as recentes conquistas do basquete do Flamengo – o jogador atuava pelo Bauru, rivais nas duas últimas finais do NBB – e engatou um bate-papo descontraído após receber as boas-vindas do ídolo rubro-negro.
– Fui ver três vezes se era verdade, achei que podia ser alguém que tinha acesso à página dele, mas quando vi que tinha sido realmente o Júnior que havia comentado, pedi a Raiana (assessora do Flamengo) o telefone dele para poder agradecer pessoalmente. Acabei mandando uma mensagem pelo whatsapp dizendo que era uma honra, e ele me respondeu – lembrou Fischer.
– Foram as boas-vindas! (risos) – emendou Júnior de bate-pronto.
– É uma honra chegar desse jeito, né! – respondeu Fischer
– E uma responsa também, até porque sou pé-quente no basquete, já vou te avisando logo. Nas últimas decisões eu estava lá – provocou o maestro.
– Eu sei, estava do outro lado nas últimas duas e te vi lá na torcida (risos) – entregou o ex-armador do Bauru, que depois falou sério sobre a importância de defender um clube com o peso do Flamengo.
– Já é uma responsabilidade usar a camisa do Flamengo, ainda mais a de um ídolo. Mas eu gosto, é uma responsabilidade boa. Todo atleta grande tem que encarar essas responsabilidades. Eu vim com o desafio de deixar o clube no topo, é motivador. O atleta que vem para cá tem que vir com um caráter vencedor – disse Ricardo Fischer.
– Eu só conheço vencedor com esse espírito – assegurou o maior lateral-esquerdo da história do Flamengo.
Gentilezas à parte, Júnior aproveitou o encontro para dar algumas dicas preciosas e apresentar atalhos importantes para qualquer atleta que deseja ter vida longa na Gávea.
– Acho que a primeira coisa é se identificar, e ele vai sentir isso nos primeiros jogos. Essa identificação é uma coisa mais do que natural, não adianta querer forçar uma barra. Existem características do clube que ele sabe como são, que vai sentir na pele, seja no futebol, no basquete ou qualquer outro esporte, que é a participação da torcida, por exemplo. Isso é fundamental para que ele possa se adaptar e fazer tudo aquilo que já fazia nos outros clubes. Não é fácil, é um clube exigente, a torcida cobra mesmo, principalmente quando você entra como favorito, que é o caso do basquete pelas últimas temporadas. Mas quem tem competência se estabelece – explicou o eterno camisa 5, que lembrou da sua primeira vez numa decisão como torcedor.
– Nunca tinha ido a nenhum jogo, mas fui convidado para ir à final do NBB 1 contra o Brasília, time que jogava o Alex à época. Foi minha primeira decisão e lembro que faltavam poucos segundos para o fim, quando a taquicardia começou a bater (risos) e vi que não ia aguentar aquele nervosismo. Pensei em sair para tomar uma água e só voltar no finalzinho, mas não dá porque o basquete te envolve de uma maneira onde tudo pode acontecer – argumentou o capacete.
Antes de se despedir do novo armador do Flamengo, Júnior explicou como começou sua ligação com o basquete e deixou a diplomacia de lado para atacar de torcedor e manifestar o desejo de ver um velho rival vestindo as cores vermelho e preto.
– Me envolvi mais com o vôlei por causa do meu irmão, que jogou na seleção e como profissional nos Estados Unidos, mas o basquete na minha época sempre foi com o Oscar. Ele foi o tipo do cara que levava a gente aos ginásios e quando veio jogar aqui passei a me envolver ainda mais. Nessas últimas gestões o basquete do Flamengo voltou a tomar uma proporção que nunca deveria ter perdido, e aí você se envolve mesmo, tanto que me propus a ir nos jogos com o maior prazer do mundo. Ano passado fui outra vez, mas o coraçãozinho bateu de novo. Ainda mais quando você pega certos jogadores do outro lado que gostaria que estivesse no seu time, como um tal de Alex, né! (risos). Esse cara tinha que jogar aqui, ele tem a cara do Flamengo. Além de jogar muito, tem aquela coisa do sangue rubro-negro mesmo, de não gostar de perder, de brigar e lutar até o final – tietou.
Se a decisão de vestir a camisa rubro-negra foi uma escolha difícil, mas exclusivamente sua, a de usar o 5 aconteceu por acaso. Ao contrário do dono mais famoso, que já gostava do número desde os tempos que brilhava no futebol de praia pelo Juventus, Ricardo Fischer lembra que o algarismo praticamente caiu no seu colo quando defendeu o Club Sion-Herens, da Suíça.
– No meu caso foi natural. Foi meu último número na verdade, porque já usei muitos outros. Às vezes você chega num time e já tem alguém com aquele número e acaba sendo obrigado a usar outro. No meu último ano na Suíça, eu queria o 8, se não me engano, mas já tinha um dono, então escolhi a 5, e dali em diante minha carreira começou a crescer. Como deu sorte, não larguei mais. É pesada, mas é um peso bom – riu Fischer.
Fonte: GE