Para identificar a renovação dos técnicos do futebol brasileiro basta consultar a lista dos nomes. Quem imaginaria, há poucos anos, que o chamado “trio de ferro” de São Paulo começaria uma temporada com Fábio Carille, Eduardo Baptista e Rogério Ceni como seus treinadores? No Rio, Jair Ventura e Zé Ricardo eram nomes desconhecidos até recentemente.
Seja pela consequência do trauma do 7 a 1, quando a defasagem tática do futebol no país foi apontada como uma das causas da tragédia, pela melhor adaptação dos jovens técnicos a estruturas mais completas das comissões técnicas ou pelo desgaste dos medalhões mais caros, fato é que os principais clubes do país optaram por dar chance a novidades, em vários casos a iniciantes.
Há apenas cinco anos, em janeiro de 2012, os treinadores dos 12 grandes clubes brasileiros somavam 209 anos de experiência como técnico profissional. Ou seja, os times eram dirigidos por profissionais com, em média, 17,4 anos de carreira. O número despencou à metade na comparação com janeiro de 2017, quando a média de experiência dos técnicos dos grandes será de 8,7 temporadas.
Entre os 12 grandes, sete estão com treinadores com cinco anos ou menos tempo de estrada. Carille, do Corinthians, de curta passagem como interino, e Ceni, no São Paulo, são estreantes como técnicos efetivos. Zé Ricardo e Jair Ventura vão para o segundo ano. O decano e exceção que confirma a regra é Abel Braga, de volta ao Flu com 32 anos de bagagem — sem ele, a média da safra de 2017 cairia para apenas 6,6 anos de tempo de carreira.
TRAUMA DO ATRASO TÁTICO
A aposta em técnicos supostamente mais atualizados com a evolução tática do futebol nos últimos anos parece ser uma tônica em vários casos. Atual campeão brasileiro, o Palmeiras deu chance a Eduardo Baptista, reputado como muito estudioso, e que começou sua carreira em 2014. Sem trazer o colombiano Reinaldo Rueda, do Nacional de Medellín, o Corinthians preferiu o ex-auxiliar Carrile em vez de veteranos como Vanderlei Luxemburgo.
O 7 a 1 da Alemanha parece um ponto de inflexão neste processo. Com os supermedalhões Felipão e Parreira no comando da seleção, o resultado ficou para muitos como símbolo do atraso tático brasileiro. Coincidência ou não, nomes como Luxemburgo, Émerson Leão e Joel Santana não foram mais contratados no Brasil desde então.
O aspecto tático não é o único motivo. Treinadores mais experientes, com currículo mais coroado, muitas vezes não aceitam reduzir seu patamar salarial. Um terceiro motivo é apontado por Rodrigo Caetano, diretor do Flamengo, um dos times que apostaram num iniciante:
— Acho que é reflexo da nova filosofia de muitos clubes, em que a comissão técnica não passa só pelo treinador, ele não tem mais todas as funções e responsabilidades de uma comissão. Outros integrantes são mais valorizados, há outras funções específicas no trabalho, e acho que os jovens têm mostrado que se adaptam melhor.
CAMPEÃO POSSIVELMENTE INÉDITO
Um dos novatos que terão chance, inclusive na Libertadores, é Jair Ventura, do Botafogo. Ele sabe que a mudança de auxiliar para técnico principal acarreta outras novidades na carreira:
— Assumi na zona de rebaixamento. Se perco duas ou três, diriam “sabe nada, é auxiliar, é garoto” e eu não estaria aqui. A gente cobra renovação, mas não avalia o trabalho, cobra resultado. Agora, minha carreira é de treinador. Sei que uma hora vou sair do Botafogo e seguir. Não tem Alex Ferguson (lendário ex-técnico longevo do Manchester United) no Brasil.
A drástica renovação faz com que os principais times do país sejam dirigidos por treinadores com a fome de colocar a primeira estrela no currículo. No atual cenário para 2017, por exemplo, parece muito provável que o próximo técnico campeão brasileiro ganhe o título pela primeira vez.
Hoje, dos 20 times da Série A, apenas três são comandados por treinadores que já ganharam o Brasileiro: Abel Braga, do Fluminense (campeão pelo Flu em 2012), Paulo César Carpeggiani, do Coritiba (Fla, em 1982), e Paulo Autuori, do Atlético-PR (Botafogo em 1995).
Fonte: O Globo