Quem queria, ficou sem. Quem topou pagar, perdeu a disputa e o benefício, e quem não topou não teve nem a chance de buscar uma outra solução financeira. A CBF, que está há meses convivendo com a pressão da opinião pública, seguirá sofrendo com isso. E quem disse que ele não resolve, a despeito dos relatórios e dados que mostram o contrário, seguirá prejudicado por erros bobos, assim como todos os anteriores. Na discussão sobre o árbitro de vídeo no Brasil, ninguém saiu ganhando.
Horas depois de o Conselho Técnico do Brasileirão vetar o árbitro de vídeo para a edição 2018 do torneio, o UOL Esporte levantou justificativas dos clubes e explicações da CBF para mostrar que o “jogo de empurra” deixa o árbitro de vídeo cada vez mais longe de ser realidade. A maior parte dos times não aceita o modelo proposto. A confederação, por sua vez, não vê possibilidade de mudanças a curto prazo. E o único debate que se aproxima é aquele já conhecido, após cada rodada, para lamentar erros que poderiam ser evitados. Se no discurso há uma repetição da “busca por solução”, na prática é bem diferente,
Fundamental, custo derruba VAR
A CBF insiste em dizer que o alto custo não puxou a inviabilização do árbitro de vídeo, mas um rápido levantamento mostra exatamente o contrário. O valor de R$ 50 mil por jogo para cada time, totalizando um projeto de R$ 20 milhões por ano, derrubou as pretensões de ter o recurso. Ouvidos pela reportagem, Santos, Ceará, Sport, São Paulo, Vitória e Cruzeiro informaram que só vetaram a ideia pela questão financeira.
Os seis clubes, somados aos sete que já haviam aprovado a ideia, formariam os votos necessários para que o VAR estreasse no Brasileiro 2018. Atlético-MG, Vasco, América-MG, Atlético-PR e Paraná também se posicionaram contra os valores, além de apontarem problemas em questões técnicas, de transparência e isonomia. Apenas Corinthians e Fluminense disseram não se importar os preços apresentados pela confederação.
CBF se defende com compliance e regulamento
Diante dos argumentos que mostram que o alto custo foi fator fundamental ao veto, a CBF passou a ser atacada por não subsidiar os R$ 20 milhões do projeto de vídeo. E se defendeu. De acordo com o secretário-geral da entidade, Walter Feldman, é inviável injetar mais grana na série A.
“Já bancamos bem mais de R$ 10 milhões em organização. Além disso, não podemos chegar agora e colocar mais 20 [milhões] para a arbitragem, sendo que o regulamento geral nos impede. Ali é claro, clubes arcam com esse custo. Eu tenho Conselho Fiscal, tenho uma auditoria, um compliance. Não é assim, ‘coloca lá'”, rebateu.
Nesta terça (7), o Blog do Rodrigo Mattos mostra que o valor acumulado pela CBF nos últimos anos seria suficiente para bancar mais de dez anos do recurso. São R$ 245 milhões em caixa. Questionado sobre o saldo que poderia viabilizar o pagamento, Feldman detalhou por que a entidade não quer assumir tal custo.
“A CBF não fica com nada. [Da receita,] 80% é direcionado para clubes, 20% banca a estrutura administrativa. Normal. Pago Série B, Série C, Série D. Tudo. Clubes que não têm condições. Ainda realizo 19 campeonatos, pago futebol de base, feminino. Não posso retirar o fomento de quem precisa e achar que futebol no Brasil é só Série A. Em qualquer canto, onde tem futebol, a CBF está pagando”, argumentou o secretário-geral.
O custo do VAR não teve a mesma sorte das verbas destinadas a cartolas, como aumento de pagamentos a federações e viagens com acompanhantes para acompanhar jogos da seleção. Todos aprovados no citado “compliance”. “Não é mesada, é um dinheiro que chega a times ainda menores”, se defendeu o porta-voz da CBF, sobre a verba mensal distribuída a cartolas de cada estado.
Questões técnicas pesam, mas não deveriam
Um dos únicos clubes a ignorar o alto custo ao argumentar o voto contra o árbitro de vídeo, o Corinthians citou que “nem a própria Ifab [departamento da Fifa] e a Fifa têm padrões e definições de como seria o VAR”. O Vasco, por sua vez, exigiu mais detalhes e explicações, bem como o Paraná. No entanto, tudo foi explicado aos clubes. Um longo vídeo, um relatório da Ifab e explanações dos responsáveis pelos estudos nortearam a reunião da última segunda-feira (5).
Segundo o relatório da Ifab, em 98,9% dos casos analisados (804 jogos de competição) houve correção acertada do que seria um erro em campo do árbitro. Mas nem isso convenceu Andrés Sanchez. “Todo mundo vai reclamar em erro no futebol brasileiro. Teve jogo com vídeo que se reclamou também. Tem lance que está em uma bancada de cinco ou seis jornalistas e metade fala que foi e metade não foi”, disse o presidente corintiano. Os clubes citados ainda querem mais exemplos e explicações.
CBF ainda rechaça gastos menores
Na esteira do debate pelos altos valores, a CBF ainda não sabe como fazer para reduzir os custos e se esquiva das sugestões de outros sistemas pelo mundo. De acordo com Sérgio Corrêa, responsável pelos estudos do caso na confederação, não há opções no horizonte que possam repetir os modelos mais baratos utilizados na Europa e nos Estados Unidos.
A CBF reitera sua preocupação com a modernidade e a importância do árbitro de vídeo, mas não conseguiu expor uma solução alternativa ao alto custo do sistema. A opção pela fibra ótica, que multiplica por dez os gastos na comparação com o futebol português, ainda surge como forma única de uma confederação que sofre com a extensão territorial – conhecida desde o início da ideia – do Brasil. O Atlético-MG, por exemplo, quer mais transparência sobre essa dificuldade em adequar os custos ao modelo europeu.
VAR só no 2º turno incomodou e passa pela Globo
Entre as muitas justificativas daqueles que votaram contra, Fluminense e Atlético-PR bateram na mesma tecla: a utilização do árbitro de vídeo apenas no segundo turno prejudicaria a isonomia do Brasileiro.
O novo impasse passou por outra parte envolvida, a TV Globo. Apesar de desejar contribuir para o projeto, a emissora desembarcou da ideia ao se deparar com indefinições e possível repercussão diante de assunto tão polêmico, que envolve a paixão do torcedor.
O principal grupo de comunicação do país optou por deixar a CBF sozinha na missão e atrasou o cronograma da confederação, que teve que buscar novas opções no mercado para operar VTs e fornecer infraestrutura necessária para o vídeo. Mais um exemplo que o projeto não estava 100% finalizado para ser oferecido aos times.
“Ninguém é contra. Todos somos favoráveis ao vídeo, mas ainda falta discutir a melhor forma de se aplicar. Tem muita coisa sem explicação exata”, cobrou o presidente do Conselho Deliberativo do Atlético-PR e uma das vozes atuantes no Conselho Técnico, Mário Celso Petraglia.
Debate vai continuar?
O Palmeiras não só votou a favor da implementação da tecnologia como não ficou satisfeito com a reprovação do árbitro de vídeo para 2018. Maurício Galiotte, presidente da equipe, prometeu voltar à CBF para pressionar a entidade a instaurar o sistema. Nada, no entanto, ocorrerá sem aval do Conselho Técnico. De olho em fortalecer a política para as próximas discussões, a ideia do cartola é criar um grupo de discussões que acelere a implantação do VAR com debates em cima dos pontos considerados falhos. Desde o meio de 2016, porém, quando o assunto surgiu, nenhum clube fez campanha nas visitas à confederação para que o recurso fosse aprovado. A dúvida é se o discurso se tornará prática ou voltará à tona apenas nos debates após erros nos jogos.
*Colaboraram Bruno Braz, Enrico Bruno, Danilo Lavieri, Dassler Marques, Jeremias Werneck, José Eduardo Martins, Léo Burlá, Marcello de Vico, Napoleão de Almeida, Samir Carvalho, Thiago Fernandes e Victor Martins
Reprodução: Uol Esporte
Quando arbitragem errar a favor do Flamengo e corinthianos e vascaínos vierem chorar e só a gente jogar isso na cara simples, você não quiz transparência então não chore!