Arena Corinthians, Maracanã e Allianz Parque são os estádios mais rentáveis do país, e até eles precisam melhorar a performance comercial para começar a lucrar de verdade.
A Copa do Mundo deixou uma herança ingrata para o cidadão – as arenas construídas para o evento são majoritariamente deficitárias, e os prejuízos delas são em boa dose pagos com dinheiro público. O problema está no descompasso entre o que políticos e cartolas sonharam que arrecadariam com os novos estádios e o que arrecadam de fato. O país injetou bilhões de reais para construir instalações esportivas que têm custos “padrão Fifa” e receitas “padrão Brasil”.
O Brasil tem uma população considerável, acima de 200 milhões de habitantes, e dá a impressão de tomar gosto pelo futebol por ser pentacampeão mundial e ter uma dúzia de clubes tidos como grandes. Mas é um país emergente. Na economia e no futebol. O brasileiro tem menos renda disponível para o lazer do que o americano, o inglês ou o alemão. O futebol brasileiro tem menos qualidade do que o europeu. A (in)segurança afasta o sujeito comum dos estádios. O país de repente herdou uma dúzia de arenas custosas sem que houvesse mercado para sustentá-las. E a conta está aí.
ÉPOCA buscou nas demonstrações financeiras das empresas que administram estádios as receitas de 15 novas arenas em 2015 – as 12 usadas na Copa e mais três construídas no mesmo período e nos mesmos padrões: o Allianz Parque (São Paulo), do Palmeiras, a Arena do Grêmio (Porto Alegre) e o Independência (Belo Horizonte). Os modelos de negócio variam de estádio para estádio, portanto dois cuidados foram tomados para não distorcer as comparações. Não foram considerados repasses de dinheiro público que alguns estádios recebem de governos, e, nos casos de arenas que ficam com as bilheterias dos clubes, os valores foram discriminados dentro do total arrecadado. Isso para que haja um denominador comum.
A Arena Corinthians (São Paulo) tem a maior receita do país, com R$ 83,8 milhões arrecadados na temporada em que o Corinthians foi campeão inconteste do Campeonato Brasileiro. Com um asterisco. O Corinthians, clube, decidiu deixar o valor arrecadado por ele com a venda de ingressos integralmente no caixa da empresa que administra o estádio. Isso enfraquece as contas do time de futebol, mas segura a operação da arena de pé. As bilheterias renderam R$ 73,9 milhões, ou 88% do faturamento. O estádio corintiano precisa melhorar – muito – a rentabilidade de outras receitas: patrocínios, merchandising, alimentação, estacionamento e camarotes.
O Maracanã (Rio de Janeiro) tem o segundo maior faturamento entre os estádios, com R$ 60,6 milhões. Também com um asterisco. Os acordos feitos pela Odebrecht com Flamengo e Fluminensereservam uma parte das bilheterias para a operação do estádio. Do total, R$ 5,5 milhões foram obtidos a partir dos ingressos. Note a importância da distinção entre bilheterias e outras receitas: o Maracanã, do ponto de vista comercial, teve um desempenho superior ao da Arena Corinthians em 2015. Na realidade, teve o melhor desempenho do país. O fato de ser a arena com mais atividade, 66 partidas, facilita a captação de patrocínios porque o público alcançado é maior.
O Allianz Parque (São Paulo), administrado pela WTorre, e não peloPalmeiras, aparece em terceiro. Sem asterisco. A construtora não recebe nenhuma parte dos ingressos vendidos pelo clube. E ainda divide com o clube percentuais entre 5% e 30% de outras receitas. O estádio palmeirense é o único a ter vendido os naming rights – a seguradora que o nomeia paga R$ 15 milhões por ano – e leva vantagem por ter eventos além do futebol com frequência. Houve 82 eventos no local, entre eles sete grandes shows, e a maioria dos camarotes, em torno de 80%, está vendida. Os R$ 47,1 milhões arrecadados tornam a arena na segunda mais rentável do país.
No Sul, o Beira-Rio (Porto Alegre) fatura R$ 20 milhões sem também contar com as bilheterias do Internacional, que ficam com o clube. A Andrade Gutierrez e o BTG Pactual constituíram uma empresa para administrar apenas as “áreas nobres” do estádio colorado: camarotes, skyboxes, alimentação e estacionamento. A Arena do Grêmio (Porto Alegre) arrecada R$ 42 milhões, mas boa parte, R$ 19,7 milhões, corresponde às bilheterias do Grêmio. Outra parte, R$ 15 milhões, equivale ao dinheiro de sócios que o clube repassa para o estádio. A casa gremista sofre com a cisão entre o time e a construtora que o administra, a OAS, e gera menos dinheiro do ponto de vista comercial do que a casa do rival colorado. A Arena da Baixada (Curitiba), inteiramente administrada pelo Atlético-PR, gera R$ 11,1 milhões, mas quase a metade, R$ 5,8 milhões, vem de ingressos.
A comparação entre faturamentos de arenas, com os devidos cuidados, é possível. E ajuda a entender o que o Brasil precisa fazer para que os estádios comecem a dar lucro. O futebol que um dia se sustentou apenas com a venda de entradas agora precisa fazer dinheiro com camarotes, assentos premium, espaços corporativos, alimentação, estacionamento, eventos além do futebol. As arquibancadas precisam estar cheias para valorizar essas novas receitas. Isso requer reformas na estrutura do futebol brasileiro para que tenha mais qualidade, seja mais seguro para o espectador e não sacrifique em demasiado o torcedor com preços além da conta. Tornar a herança da Copa em um negócio sustentável num país emergente é mais complexo do que políticos e cartolas imaginaram.
Fonte: Época