Fonte: ESPN / Mauro Cézar Pereira
Virou moda no futebol brasileiro e em alguns times de outros países sul-americanos. Quando um time tem um lateral a ser cobrado no campo de ataque, perto da área inimiga, o jogador encarregado de recolocar a pelota em jogo toma distância. Depois ele corre, joga os braços para trás e a arremessa, a atira com toda força possível no meio do bolo de atletas dos dois times. Um cruzamento manual.
Quando daí acontece um gol, muitos vêem o primitivo recurso como válido e defendem sua utilização. Contudo, na massacrante maioria das vezes a bola é simplesmente desperdiçada. Isso mesmo, foi gol em apenas 0,53% das vezes nas quais ela foi jogada com as mãos na área rival nas primeiras dez rodadas da Série A. É o que mostra estudo feito pela equipe do “Jogo a Jogo” após analisar 100 partidas (tabela abaixo).
O índice é impressionante: 99,47% dos laterais arremessados na área adversária não funcionam. Tal número foi encontrado após a análise de 187 batidas executadas dessa maneira. Em 16 delas — abaixo de 9% — pelo menos os times que estavam no ataque conseguiram finalizar, mas em apenas uma saiu o gol. Goiás, Atlético Mineiro e Vasco, pela ordem, são os três que aparecem com mais cobranças do gênero.
O único tento foi marcado por Edigar Junio após uma batida de lateral feita por Eduardo em Atlético Paranaense 2 x 2 Coritiba, decretando o empate do Furacão e fechando o placar. Importante: o Corinthians marcou com Elias sobre o próprio Atlético a partir de uma cobrança de lateral de Fágner. Mas o jogo aconteceu na 12ª rodada e o estudo publicado neste post engloba apenas as dez primeiras.
Antes do primeiro jogo da Copa do Brasil 2014, mostramos (abaixo) que Marcos Rocha utiliza o arremesso na área com freqüência. Ele tentou mais de dez vezes nas semifinais contra o Flamengo, mas nenhum dos quatro gols do Galo nasceu desse tipo de lance. No primeiro cotejo decisivo diante do Cruzeiro funcionou duas vezes. Um ponto fora da curva que pode ter motivado mais times a recorrer a essa jogada.
O Barcelona de Pep Guardiola não batia sequer escanteios na área adversária, ciente de que raríssimos são os gols oriundos de cruzamentos com os pés. Confiava em sua capacidade de trabalhar a bola, batia curto para então construir uma jogada de ataque. Tantos técnicos nos times da primeira divisão brasileira aderindo ao arremesso com as mãos é algo que evidencia o nível baixo do futebol aqui jogado.
Se ainda fosse uma jogada eventual, uma rápida cobrança que aproveita uma distração da defesa inimiga, tudo bem. Mas o que temos visto é um recurso adotado sem parcimônia por times da Série A, inclusive os mais fortes. Quem não se garante ao trabalhar a pelota com os pés opta por jogá-la na área do rival e seja o que Deus quiser. Abaixo a tabela que detalha as cobranças e a análise do autor do estudo.
Vale ou não vale… é bom ou não é…
por Alexandre Siqueira
Nos últimos três anos, um pouco mais, um pouco menos, uma jogada vem chamando a atenção no futebol brasileiro. Trata-se da cobrança de lateral, em direção à área, como num cruzamento, e muitas vezes, próximo do meio de campo onde nunca a área será alcançada. A polêmica se instala a partir da efetividade, ou não, da ação.
Há quem pense ser mais efetivo imprimir a ação mais lógica, ou seja, sair jogando, criar jogadas, tabelas ofensivas, envolver o adversário, enfim, jogar futebol. Outra tese defende que a jogada é uma arma, e que muitas vezes resulta em gol, inclusive, com a vitória resultante deste lance.Para não ampliar muito com outras motivações, estas duas posições me parecem suficientes para a discussão.
Há de se registrar, que diferentemente do que se faz hoje, onde toda a força é centrada pelo impulso, às vezes com um pequeno galope, e pelos braços do jogador, o lance aconteceu de forma inusitada com uma brasileira no ano de 2008, quando a lateral da Seleção Brasileira Leah Fortune, a utilizou combinando com uma cambalhota na cobrança do lateral. Era uma forma de maximizar o impulso e a força no arremesso. Naquele ano, pelo Mundial Feminino, Leah declarou que treinava e fazia exercícios específicos para este fim, e com isso, em dois jogos, obteve sucesso, culminando com dois gols para o Brasil. Em 2010, repetiu a façanha com mais um gol brasileiro.
Parece ter feito escola. Em 2012, o jogador da Islândia, Steinthor Freyr Thorsteinsson, pela Copa Kirin, repetiu a ação por várias vezes, sem sucesso naquele jogo. Além de algumas disputas de bola, pelo alto, entre atacantes e zagueiros, que nada acontecia, no máximo, aconteceram duas finalizações de cabeça para fora. Podemos contemporizar alegando que o problema não foi do cobrador do lateral, e sim do finalizador. Não se tem mais notícias sobre a jogada e o jogador.
Pois bem, ilustrado o tema, e uma vez que trabalho com estatísticas do futebol, coloquei a mão na massa para uma apuração. Por duas vezes, em programas esportivos, prestei atenção no que disse o comentarista da ESPN Mauro Cezar Pereira, aludindo ao tal lance, e colocando em questão sua valia. E dizia; “Nós, porque não temos isso em números para avaliar…”. Claro, não foi nada pessoal, mas me senti quase desafiado à proposição.
Durante o campeonato Mineiro deste ano, fiz o levantamento das cobranças de lateral dirigidas à área adversária. Foram 17 jogos e 91 laterais batidos desta maneira. Uma média de 5,35 por jogo, uma vez que o lance aconteceu em todas as partidas.
Com os respectivos percentuais, assinalei quatro gols (4,4%) e por 8 vezes aconteceram finalizações a gol no final da jogada (8,79%). Em 15 momentos aconteceram disputas de bola, ora com domínio da zaga, ora com domínio do atacante, que iniciavam outra jogada (16,48%), e por fim, 64 lances em que nada aconteceu (70,33%).
Ora, aqui temos um viés interessante para avaliar. Se por um lado, esmagadoramente temos mais de 70% de insucesso nos lances, que piora se somados aos 16,48% de jogadas que redundavam apenas em disputa de bola, por outro, temos 8 finalizações a gol, que não podemos desprezar pela oportunidade criada, e 4 gols aconteceram. Pesa a favor, destacar que numa final do campeonato (Caldense x Atlético), o primeiro gol atleticano (Thiago Ribeiro) veio deste tipo de cobrança de lateral (Marcos Rocha), um toque do atacante (Lucas Pratto) e a finalização com gol.
E ai, vale ou não vale? É bom ou não é?