Diante do desastrado do início de campanha no Brasileirão – preocupante, como há muito não se via – um debate totalmente desfocado do mundo real começa a tomar corpo: afinal, é melhor manter a austeridade financeira ou investir o dinheiro que não se tem em reforços que possam nos tirar do atoleiro?
Nenhum debate pode ser mais falso.
Primeiro, porque se o investimento é custeado por um dinheiro que não existe e vai implicar em deixar de honrar pagamentos de salários e impostos, é óbvio que não pode ser feito. Isso é algo tão preliminar que sequer merecia entrar em pauta.
Segundo – e aqui peço o máximo de atenção, porque talvez o leitor não tenha se dado conta – o futebol do Flamengo tem muito pouco de austeridade. O time que vai a campo protagonizar vexames atrás de vexames pode ser tudo, menos barato.
Eu venho comentando isso há tempos, todas as vezes em que escrevi sobre as demonstrações financeiras do clube, mas me sentia pregando no deserto, porque na imprensa, nas redes sociais e nos discursos o veredito é sempre o mesmo: o Flamengo não tem dinheiro para montar um time de qualidade, por conta da herança maldita das dívidas do passado.
Isso, infelizmente, está longe de ser uma verdade absoluta. E, para minha sorte, tem mais gente reparando o fenômeno.
O consultor Amir Somoggi, uma referência no cenário de gestão esportiva, publicou há alguns dias um poderoso comparativo sobre as finanças dos clubes brasileiros. O estudo, inclusive, foi muito comemorado por nós, flamenguistas – especialmente aqueles mais alinhados com a direção atual – porque revelou que pela primeira vez o clube retomou a liderança em arrecadação quando expurgada as receitas vindas de vendas de atletas. O entusiasmo com os comparativos desse estudo me permitem concluir que os dados foram validados pelo clube – e nem deveria ser diferente, afinal são uma mera compilação de informações públicas.
O que pouca gente prestou atenção é na evolução das despesas do futebol. Um dado, em especial, é particularmente incômodo.
Se me perguntassem, de cabeça, qual foi o ano mais custoso da história recente do Flamengo eu cravaria 2011. Afinal, naquele ano, dentre outras estripulias, tínhamos Luxemburgo no comando, Ronaldinho Gaúcho e Thiago Neves em campo.
Pois bem.
Para meu espanto – e imagino que de você também – o custo do departamento de futebol do Flamengo cresceu inacreditáveis 66% em 2013, quando comparados a 2011. Ou, se prefere ler os dados de outra forma, o Flamengo da Patricia Amorim gastou, em 2011, R$ 108,6 milhões, contra R$ 180 milhões do Eduardo Bandeira de Mello em 2013.
Incrível, não é mesmo? A gestão azul queimou em 2013 R$ 72 milhões a mais do que Patricia tinha gasto em 2011. E quanto foi em 2012? Não sei – nem eu, nem ninguém. As contas de 2012 foram revisadas pela gestão atual e recentemente aprovadas, mas esse dado não foi divulgado, porque o clube não individualizou as despesas do futebol. Aliás, não custa lembrar que “despesas do futebol” não são apenas as remunerações dos atletas, mas sim tudo que o departamento consome.
Ah, mas deve haver explicações! Sim, espero que haja. Inflação, por exemplo, é uma delas, afinal de 2011 a 2013 o IPCA acumulado é de cerca de 12%. Rescisões de Ibson, Liedson e Renato Abreu, talvez, sejam atenuantes. Mas vamos combinar que R$ 72 milhões de diferença é muita grana para justificar um salto tão gigantesco em razão dessas firulas.
E antes que você pergunte, já vou logo adiantando: a) a “dívida” do Flamengo não tem nada a ver com esses gastos, porque é classificada em separado; b) o fato do Flamengo não ter pago nada a R10 ou a quem quer que seja também não modifica a despesa, que entra no balanço mesmo que o clube não tenha tido qualquer desembolso; c) gastos com “compra” de atletas também não entram aqui nessa comparação – aliás, vale lembrar que em 2013, embora o Flamengo não tenha vendido nenhum atleta, gastou dinheiro comprando Gabriel, André Santos, Chicão, Val e Bruninho.
Outro contraponto interessante de fazer é mirar o comportamento de nossos rivais. E lamentar que Atlético MG, Cruzeiro e Grêmio, por exemplo, gastaram menos do que o Flamengo com seus respectivos departamentos de futebol. Em que pese terem elencos claramente melhores e campanhas no Brasileiro muito superiores.
Eu cheguei a esboçar uma análise para tentar explicar o, digamos, descalabro, mas depois desisti…não trabalho no clube, não faço parte da gestão, não sou do SóFla (a corrente política situacionista), sou apenas torcedor e blogueiro.
Se alguém tem que explicar alguma coisa pelo fato de gastar tanto dinheiro em um elenco tão medíocre, definitivamente, não sou eu. Quem realmente precisaria prestar algum tipo de esclarecimento seria, por exemplo, o Sr. Paulo Pelaipe. Ou, como ele não está mais lá, quem o contratou e assinou embaixo de suas decisões.
O que eu realmente queria dividir com os leitores é essa impressão: parem de dizer que o Flamengo está do jeito que se encontra por falta de grana. Isso, definitivamente, não é verdade.
E que, mais do que nunca, São Judas Tadeu nos proteja. Aparentemente, vamos precisar muito.
Por Walter Monteiro
Por Walter Monteiro
Fonte: Magia Rubro-Negra