A vinda do Jorginho foi um erro que vocês assumem?
– Erro é uma palavra forte. Tudo que você faz na vida é pautado pela intenção de acertar. Tem coisas que faz na hora errada, pela situação, os artistas envolvidos, não funciona como gostaria. Tenho respeito pelo Jorginho, vai ser um dos maiores treinadores, mas o momento não foi feliz por uma série de razões. Pelas crenças dele, pressão da torcida, pelo que tem que tirar do jogador no momento, por não tem um elenco como gostaríamos, por ele querer que o clube jogasse de uma forma que a gente não tinha jogadores para jogar daquela forma, ou uma combinação de algumas dessas coisas. Nos enganamos em relação ao momento com o Jorginho. Admiro ele pessoalmente e como profissional. Infelizmente não aconteceu como a gente gostaria. Em qualquer área tem que ter resultado. Futebol é um pouco mais cruel. Não acho que a escolha tenha sido um erro. Ah, mas dizem que agora vão buscar um técnico caro. As pessoas não sabem como você vai pagar. Então, começa um pré-julgamento. O torcedor tem que entender que os princípios que nos regem são rigorosamente os mesmos. Não vamos fazer loucura. Não vou virar um mentiroso para contratar o treinador. Tem que falar a verdade, a situação. Nas próximas contratações, só estamos fazendo pelo dinheiro do sócio-torcedor. De treinador, uma parte. Já tem orçamento base. Sai um treinador que ganha mais, a diferença poderia vir do sócio-torcedor. Com os jogadores a lógica é a mesma. A folha agora é 36% menor, e o time melhorou, mas não é suficiente, para a minha expectativa e para a do torcedor. Mas há de se ter compromisso.
Então vocês descartam a vinda de um grande craque?
– Qual o grande jogador brasileiro hoje, em atividade, que se criar um projeto de marketing em torno dele, daria retorno? Não vale falar o Neymar. É muito difícil isso. Se tem um cara com um talento bruto e cabeça muito boa, pode ser produzido, mas não vejo esse jogador no Flamengo. O Adryan é um garoto talentoso, de futuro, mas não sei dizer isso hoje. Tem um momento que deixam de ser meninos e viram homens. Já vi muita gente na base jogar bola e desaparecendo no profissional. O cara tem que ter talento, força de vontade, estrutura emocional, não é fácil. A gente não tem dez cracaços de bola. O Robinho é bom jogador, mas tenho dúvidas se seria uma âncora para um projeto desse de marketing. Tem muito mais coisas por trás além de jogar bola. O cara vira uma criatura pública, e todo mundo espera perfeição. Não pode beber, ofender ninguém, tem que ter sangue de barata. O Neymar é um cara genuinamente do bem e talentoso. Nunca vi sacaneando ninguém. Tem o lado da orientação. Mas ninguém o ensinou a jogar bola. Imagina se ele fosse um cara da noite, que não ouvisse…até outro dia era um adolescente. Todo mundo bajula o cara, as mulheres querem estar junto, ele pode comprar qualquer bem, para cabeça de qualquer um é punk, imagina um garoto… Não basta agir, a outra parte tem que acatar, e isso é difícil em qualquer idade. Quando você é uma estrela que veio de meio menos favorecido é mais difícil. O Kaká é um bom produto de marketing. Nunca fez bobagem. Agora, vamos combinar, no futebol de hoje em dia, se o cara não jogar, ele perde ritmo rapidamente. O Kaká hoje não está mais jovem, não jogou com a constância. E tem a opção do atleta, que é legítima. Não tenho sentimento de viúva. O Jorginho deu errado por variáveis que a gente não controla. O projeto de marketing catalisa oportunidade, mas não inventa um talento como o Neymar, um comportamento, uma atitude e uma empatia com a torcida. A torcida do Flamengo teve ídolos que jamais foram craques. Porque se identificava com o cara que dava a alma. Não se ensina ninguém a ter vontade, garra, não querer perder, criar identificação, empatia, que antecede o talento. Não pode fabricar um Zico, um Pelé, um Neymar. Não tinha com o Carlos Eduardo uma expectativa de ser um ícone da nossa gestão. Mas ele joga muita bola. Para pelada, society, ou para a camisa 10 de um clube que precisa se reerguer. Você alavanca isso, mas não inventa. Não cria dedicação, empenho, talento. Lapida e aproveita quando eles estão ali não necessariamente organizados.
O Flamengo vende o que hoje?
– Vende a paixão, o sonho, um clube que nasceu para ser grande. O momento é difícil. Não pode analisar a foto, e sim o filme, que é belíssimo. Falta muito. Como as pessoas não vão trocar de time, quanto mais cedo apoiar mais rápido muda tudo.
A quantas anda o tal fundo de investimento para o futebol?
– É uma das formas inteligentes e criativas e pode funcionar. Seria um esquema de sociedade por cotas, vejo com bons olhos, é importante. Se possível para ontem. Tem que ter investimento de risco. Gente que queira botar dinheiro. Com condições estabelecidas. Conceitualmente sou a favor, e é uma das alternativas para reforçar o time.
Que tem achado do modelo de administração através de um Conselho Gestor?
– Eu achava que seria mais complexo. A gente realmente deixa a vaidade na porta. É diferente discordância e discórdia. Sacanear o outro pelo resto da vida porque ganhou um ponto. A gente pensa diferente, mas concorda em muito mais coisa. O Carlos Eduardo, tem desde gente dizendo que ele não vai jogar e para mandar embora, até gente que fala que é bom, para contratar psicólogo, que não desaprendeu. Os dois extremos tem o mérito. Se eu botar meu fígado para definir, opto pela primeira opção, se botar a cabeça, a segunda. Eu fui um dos caras que apoiei a contratação dele, tinha expectativa que arrebentasse. se manda embora agora e estoura em dois meses em outro clube. Pode jogar nada em um ano? Pode. To colocando hipoteticamente, todos tem uma opinião. Tolice pensar que não teria custo ao devolver. Tudo tem consequências. Você erra e você acerta. Quem liga com futebol e com emoção, tem que estar preparado para levar beijo e levar porrada.
Fonte: Extra Globo