No lugar de gols, números. Na verdade, cifras milionárias. E se em campo o Flamengo contratou sete reforços e mantém as esperanças pela permanência de Elias por um 2014 feliz, no campo financeiro o clube aposta em cálculos bem definidos para seguir dando fôlego aos combalidos caixas. Tal qual o título da Copa de Brasil em 2013 representou um primeiro ano bem sucedido na gestão Eduardo Bandeira de Mello em campo, a economia rubro-negra já vive um panorama menos caótico do que 12 meses atrás e se pauta em previsões otimistas para um futuro próximo, como a que prevê o pagamento de até 40% dos R$ 750 milhões de dívidas até o fim do mandato.
Com fôlego no caixa, Flamengo espera pagar 40% de dívida até 2015.
Para fazer um balanço do primeiro ano de gestão, o vice de finanças, Rodrigo Tostes, recebeu a reportagem do GloboEsporte.com para conversa com revelações como a que aponta até R$ 350 milhões em receitas para 2014 – quase o dobro dos R$ 190 milhões do ano passado. A evolução se dá pela criação do projeto de sócio-torcedor, novo acordo com o Maracanã, patrocínios, entre outros. A melhora da realidade, no entanto, ainda não permite exageros. Com a Certidão Negativa de Débito (CND) em mãos, os compromissos são muitos e mensalmente R$ 10 milhões saem dos cofres do Flamengo somente para manter tudo em dia.
Em busca do equilíbrio entre as exigências do torcedor no futebol e os compromissos acordados, pagar a gigantesca dívida segue sendo prioridade. E nesta missão o clube tem avançado consideravelmente, como explica o dirigente:
– Já pagamos R$ 120 milhões aproximadamente até o final do primeiro trimestre deste ano. Até o fim do ano, mais R$ 80 milhões. Se pegar nessa média, vamos ter pago de 35 a 40% do valor total em três anos. Vamos conseguir matar isso, além de frear muito a bola de neve. A piscina (da sede social, na Gávea) é um caso. A conta de água vinha R$ 700 mil por mês, era o segundo atleta mais caro. Só perdia para o Love.
Rodrigo Tostes falou também de novos rumos administrativos que o Flamengo deve seguir em 2014. Um novo organograma está sendo preparado para minimizar a divisão excessiva de poder e direcioná-lo a profissionais que serão cobrados para tal. Se transformar um clube de futebol em empresa parece uma utopia diante do panorama apresentado, o mínimo de organização parece ser exigência.
– Claramente, não estamos em uma empresa. Já descobrimos. Entramos com uma percepção e realizamos que no futebol as coisas não são como uma empresa. Mas temos que pegar os pontos bons de uma empresa e implantar no clube, tentando adaptar as peculiaridades do futebol. Sem romper com as tradições, mas colocar ordem na casa. Acabou a bagunça.
No longo bate-papo de 54 minutos, Rodrigo Tostes avaliou a realidade financeira do Flamengo, fez projeções para o futuro e admitiu que a calmaria no departamento de futebol é fundamental para o sucesso da parte administrativa. Falou também da folha salarial do elenco e investimentos em contratações, que já chegaram a R$ 10 milhões em 2014, mas podem ser minimizados com parcerias com investidores. Confira toda entrevista:
Tendo em vista que a vice-presidência de finanças é uma pasta tão importante quanto o futebol para gestão atual, como o Flamengo começa 2014 neste quesito?
Há uma diferença muito grande de 2013 para 2014: as novas receitas criadas durante o ano passado, neste ano vão ser para o ano todo. No sócio-torcedor, prevemos um aumento significativo de receita não por prever um aumento de adesões. Não é essa a meta. A diferença é que já começamos com essa receita em janeiro e com nível de estabilidade. Do ponto de vista de receitas, estamos mais consolidados, até por atuar em várias linhas: patrocínio, sócio, marketing, Maracanã com bilheteria… Temos um problema esse ano por conta da Copa, mas há esse impacto de nova utilização do estádio no ano todo.
Em comparação com 2013, a diferença nestes pontos é muito significativa?
Fazendo uma análise de 2013, o grupo (diretoria) demorou uns 90, 100 dias para tomar pé de tudo que estava acontecendo. A transição foi muito correta, mas vimos claramente que faltava informação. O nível de detalhe que se precisa para um planejamento decente não existia. Nunca nada foi escondido, mas o Flamengo não tinha detalhes de nada, de onde vinham as coisas. Após uns 100 dias para tomar pé, tivemos mais uns 30, 40 para estabelecer prioridades. Tivemos reuniões dos vice-presidentes e recentemente, e foi gratificante ver que muito itens do que tínhamos que fazer foram cumpridos. Isso é bom para energizar.
Que tipos de metas foram alcançadas do ponto de vista administrativo na visão de vocês?
De 50 a 60% foi cumprido. Por exemplo, planejávamos ter as CNDs, conseguimos. O sócio-torcedor? Conseguimos. A negociação com o Maracanã, todo processo de benefícios e incentivos (fiscais), uma nova estrutura organizacional, ações para redução de despesas… Conseguimos tudo isso. Agora, entrar a fundo em redução de custo pessoal, processos do futebol e outras áreas não conseguimos. Vários itens acabam ficando para depois por termos que sempre atuar como bombeiros, que resolver pepinos. O que buscamos para 2014 é uma estrutura de organização mais enxuta.
Haverá uma mudança efetiva no organograma? Como ficaria diante dessa nova realidade?
O Flamengo praticamente tinha um diretor como sombra para cada vice-presidente, como são Wallim (vice de futebol) e Pelaipe (diretor executivo), por exemplo. Estamos mudando totalmente a estrutura para operar em 2014. Não é uma estrutura definitiva, mas será muito mais enxuta e com linhas mais claras, com mais gente com mais responsabilidades. Vamos ter que tomar algumas ações e isso vai permitir uma linha de comando muito mais clara e qualificada. É algo que vai permitir que os caras tenham metas, bônus, como uma empresa normal. Afinal, vamos administrar um orçamento de R$ 300 a 350 milhões.
Mas há toda peculiaridade do futebol que em muitos casos atrapalha bastante que um organograma comum de uma empresa seja estabelecido…
Claramente, não estamos em uma empresa. Já descobrimos. Entramos com uma percepção e realizamos que no futebol as coisas não são como uma empresa. Mas temos que pegar os pontos bons de uma empresa e implantar no clube, tentando adaptar as peculiaridades do futebol. Sem romper com as tradições, mas colocar ordem na casa. Acabou a bagunça. Podemos errar, vamos errar, mas dentro de uma consistência. Há um conceito, um padrão, uma visão, e vamos perseguir isso. O que não pode é cada hora tomar uma decisão.
Falando mais da situação financeira do clube, em 2013 vocês iniciaram o ano com um rombo de R$ 120 milhões entre receitas e despesas e conseguiram terminar com aproximadamente R$ 30 milhões. Qual a previsão para 2014?
A expectativa de receita é de R$ 300 milhões até 350, mas com despesas ainda muito elevadas. Esse ano passamos a pagar mais por conta da negociação dos impostos O acordo prevê aumento em 2014 e mais ainda em 2015. Em 2016, quitamos parte significativa disso. Nos deram fôlego em 2013 para apertar depois, mas também já vou ter mais receitas. No líquido, não melhora muito (em relação ao rombo no fim de 2013), mas tenho mais segurança das receitas do que antes. O problema de fluxo de caixa continua, mas agora temos mais garantias do que vamos receber. Ainda temos um rombo de 30 a 40 milhões que precisamos resolver via empréstimo, venda de jogadores… Minha meta é terminar o ano no azul. Dentro de um orçamento de R$ 360 milhões de receitas, acho que vamos encontrar solução até o fim do ano. A ideia é não ter mais problema de fluxo de caixa no fim de 2015 para 2016 termos superávit.
E até que ponto todo esse planejamento financeiro depende do sucesso do time de futebol?
O campo facilita muito. Tudo isso está vinculado ao projeto de todo ano estar na Libertadores. Por isso, não podemos criar um projeto de colocar tudo em 2014 para ganhar a Libertadores, criar o time dos sonhos e depois quebrar o clube. Isso não vamos fazer. Se você for 10 anos para Libertadores, a sua chance vai ser maior de ganhar. Não podemos colocar os dois pés na porta e depois não saber onde morar. É a história do cara que ganha na Mega Sena e perde tudo. As coisas andando bem no futebol nos dão tranquilidade para trabalhar. Esse foi o nosso maior ensinamento em 2013. As coisas têm que estar controladas no futebol para termos condição e estabilidade para executar o planejado.
Daquela dívida identificada pela auditoria, de R$ 750 milhões, quanto já foi pago e qual a previsão para curto prazo?
Já pagamos 120 milhões aproximadamente até o final do primeiro trimestre deste ano. A até o fim do ano, mais 80 milhões. Se pegar nessa média, vamos ter pago de 35 a 40% do valor total em três anos. Vamos conseguir matar isso, além de frear muito a bola de neve. A piscina é um caso. A conta de água vinha R$ 700 mil por mês, era o segundo atleta mais caro. Só perdia para o Love.
Desse montante já pago, onde foi investido a maioria do valor? É possível ter esse tipo de detalhamento?
O grosso foi em impostos, parte de imposto de renda, Timemania, que nada era pago. O Flamengo estava cometendo crime, recolhia do salário e não repassava. Diria que desses R$ 120 milhões , 70% é de imposto e o resto com dívidas com fornecedores, acordos, atos trabalhistas.
No segundo semestre do ano passado, o Flamengo tinha comprometido por mês cerca de R$ 7 milhões todo mês para manter a CND em dia, com acordos trabalhistas, impostos, etc… Neste ano, qual a previsão deste montante que sai de imediato do caixa todo mês?
Por ser progressivo, em termos de acordos e dívidas, já abrimos o mês devendo aproximadamente uns 10 milhões, até mesmo para manter CND. Ano que vem vai para uns R$ 12 milhões.
E qual a previsão de receita com a folha salarial? Se em 2013 ela girava em torno de R$ 6 milhões, a ideia era conseguir subir até R$ 9 milhões. Segue este planejamento? Já chegou ao limite?
É natural que título valorize o atleta. Grande parte deste aumento é comido pela própria valorização do atleta, principalmente nos contratos que terminam. O contrato do Elias, por exemplo, não é a mesma coisa que o anterior. O poder de negociação é maior. Às vezes, manter o jogador é o reforço em si, e come esse valor. A estimativa é chegar próximo de nove milhões. A conta que estamos fazendo é essa e estamos dentro dela.
Por fim, o Flamengo contratou sete jogadores neste começo de ano, mas só fez investimento em três deles. No total, dá certa de R$ 10 milhões (R$ 5 milhões com Everton, R$ 2 milhões com Léo e R$ 3 milhões com Mugni). O clube já chegou ao máximo possível ou ainda tem para gastar?
Está bem próximo do limite, mas estamos encontrando parcerias para minimizar o impacto. Hoje, a lógica do Flamengo é não conseguir comprar se nãol vender. Se você for olhar os balanços dos clubes, todo ano precisa de venda de jogador para fechar. O Flamengo não faz isso há quantos anos? Qual foi o ultimo? Renato Augusto. Olha no que o Flamengo se tornou. Para a conta fechar, ou fazemos via investidor, o que estamos tentando fazer, ou vendendo. É preciso balancear.
Fonte: GE
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