O fato de o Brasil não ter representante nas semifinais da Libertadores – recheada de times sem grife – está sendo considerado uma prova da crise técnica do futebol brasileiro.
Vergonha? Para mim, a relação entre perder a Libertadores e crise técnica demonstra arrogância e falta de conhecimento. Já deixamos de colar em todo adversário que fala espanhol o carimbo de “catimbeiro”, mas continuamos a não aceitar a derrota. Somos o máximo. Como se o melhor jogador do último Brasileiro não fosse Everton Ribeiro.s
A Libertadores é um campeonato com muitos desafios. Ela traz em seu bojo um sentimento difuso de patriotismo e de superação que não há em outros torneios pelo mundo. Cada time tem seus estrangeiros, como na Liga dos Campeões, mas aqui predomina o entendimento de se estar representando a Pátria. E isso é ruim para os rivais.
Há campos pequenos. Há gramados ruins. Há a pressão da torcida sobre árbitros. Os gandulas fogem. Há a conivência da Conmebol com tudo de errado que temos por aqui.
Por isso, ela é tão desafiadora. Imaginemos um grande time europeu, maior que o Barça de Guardiola, maior que o Bayern de 2013. Um time capaz de vencer a Liga dos Campeões fazendo quatro gols de diferença a cada jogo. Uma verdadeira seleção mundial, recheada com alguns alienígenas e com muito tempo para treinar. Esse time fictício, produto dos sonhos de todo amante do futebol, teria mais dificuldades em vencer a Libertadores do que a Liga dos Campeões. Se lá, os adversários são melhores, aqui não basta jogar futebol.
E, se esse ano, não temos um time na semi, pelo menos não matamos ninguém como em 2013. Nossos policiais não entraram em campo para agredir “inimigos” de outros países. A vergonha foi contra nós, com o caso de racismo contra Tinga.
Nacional querido, mais lembrado por seu site mambembe do que por conquistas. Defensor, pela primeira vez na semifinal. Bolivar, pela primeira vez a Bolivia na semifinal. E San Lorenzo, um grande argentino coroando seu esforço de recuperação econômica.
São os quatro semifinalistas. Quatro equipes sem título. A Libertadores terá um campeão inédito.
Estamos fora. E isso não é demonstração de crise técnica. Ela, a crise, já está aí há tempos. Independe do que fizermos na Libertadores. Vamos ver alguns itens
1) Que tipo de jogadores temos no Brasileiro? Quem foi para a Europa e está de volta. Quem ainda não foi para a Europa. Quem nunca irá para a Europa.
2) Temos falta de alguns jogadores específicos. Meias, por exemplo. Conca e Dalessandro são argentinos que Sabella não considera para a seleção. E eles brilham por aqui, como Montillo um dia também brilhou. O que as categorias de base estão formando?
3) Os laterais brasileiros pouco marcam. São ótimos no apoio, atacam como pontas, mas, infelizmente, defendem como meias. Não existe mais aquela figura antiga, do baixinho aguerrido, um verdadeiro carrapato. Eu me lembro de Fábio Santos. Mais exemplos?
4) Falta consciência tática aos jogadores. Saber jogar é fácil, entender o jogo é difícil.
5) Uma dúvida cruel: os jogadores brasileiros não entendem o que foi pedido ou nada é pedido? Os jogadores não entendem a tática ou não existe tática vinda do banco? Todas as anteriores, eu acho.
6) Um exemplo de jogador arrogante, que não entende o que é pedido. Talvez nem ouça as determinações do treinador. Lúcio. No São Paulo, recusava-se a ficar atrás, marcando. Queria brilhar na frente. Agora, no Palmeiras, disse que não conhece Arce e nem Gareca.
7) Essa Libertadores mostrou que os times estrangeiros, mesmo os ruins, sabiam o que fazer em campo. São equipes bem treinadas, que não chegam ao Brasil para se defender. Marcam à frente, dificultam o jogo e, quando estão sendo pressionadas, têm saída de jogo.
8) O Flamengo perdeu a classificação em casa. O Botafogo também. Idem para o Furacão. O Cruzeiro, que saiu com o San Lorenzo, já havia sofrido com o Defensor e com o Cerro. Não é coincidência.
9) O Galo foi um campeão incontestável no ano passado. Mas, se não fosse Vitor, não estaria na semifinal. Então, a crise já existe há tempos.
10) O Brasil tem muitas chances de vencer a Copa. O que também não será prova de fim de crise. É só ver que Luis Gustavo, Hulk e David Luiz nunca jogaram no Brasil. Daniel Alves, Marcelo e Oscar jogaram pouco. Nossos melhores estão aprendendo a jogar fora do Brasil. Talvez por isso sejam os melhores.
11) Solução? Melhorar a formação desde a base. Criar meias. Criar laterais. Criar jogadores que entendam as dificuldades táticas de um jogo e a melhor maneira de enfrenta-las.
12) E o principal: criar treinadores. O Brasil precisa de técnicos melhores do que os atuais. Gente que tenha idéias futebolísticas e que não sejam adeptas do empirismo: mexe aqui, troca ali, pronto, encaixou. Encaixou, vai em frente. Isso é muito pobre para vir de mentes tão bem pagas.
O futebol brasileiro tem muito dinheiro, considerando-se a América do Sul. Pode ganhar as próximas cinco Libertadores e nem assim haverá uma prova de que a crise técnica acabou. Ela é grave e precisa ser enfrentada sem preconceitos. Achar que a Libertadores é fácil e que é uma obrigação vencê-la é apenas uma faceta a mais de nossa empáfia e arrogância.
Fonte: Blog do Menon