Meu mestre João Saldanha ficava louco quando havia qualquer tipo de interferência do poder público no futebol. Aliás, João sempre viu os representantes do poder público que faziam este tipo de tentativa de interferência como aproveitadores da popularidade do esporte que o povo elegeu. Hoje, leio que um dos representantes do poder público, o Deputado Otávio Leite, de quem aliás tenho ótima impressão, é autor de um projeto que visa aumentar em mais de trinta pontos percentuais a tributação sobre os ganhos da CBF.
A proposta sobe de 3% para 13% o Cofins e cria a taxa de 20% sobre todos os contratos firmados pela entidade. Em síntese, a base de raciocínio do deputado para encaminhar tal proposta é a de que a CBF terá que pagar imposto por explorar a marca BRASIL. A notícia dá conta ainda de que a ideia é usar parte destes impostos na formação de novos atletas (?).
Com todo respeito ao nobre deputado que, repito, tenho respeito e admiração, esta não é uma ideia oportuna, até porque há neste país muitos outros assuntos muitíssimos mais importantes a serem debatidos e, tão pouco, justa. A base da ideia é a de que a CBF explora a marca BRASIL, e por isso tem que pagar. E que o nosso país já ganhou das mais variadas formas através do vitoriosíssimo futebol brasileiro? Que tipo de ajuda o Estado deu até hoje para o desenvolvimento do futebol, ou de qualquer outro esporte? Parte gigantesca da dívida dos grandes clubes brasileiros é com o governo federal. Sabem porquê? Simplesmente pelo fato destes grandes clubes terem gasto verdadeiras fortunas na formação de atletas e treinadores nos esportes olímpicos, missão esta que caberia ao Estado que até hoje foi omisso, inconsequente e irresponsável. Basta dizer que já houve uma olimpíada em que o Flamengo foi o responsável por um terço da delegação brasileira. Quem bancou esta farra para o Estado foi o futebol do Flamengo, que é superavitário e, por isso, banca, bancou e continuará bancando os esportes olímpicos. E o que teve até hoje o Flamengo como contrapartida pelo seu enorme esforço, além de uma cobrança de dívida cruel e injusta? O ex-grande presidente do Flamengo Antônio Augusto Dunshee de Abranches nunca escondeu de ninguém que se dependesse exclusivamente dele, na Gávea, no lugar das piscinas e ginásios, haveria campos de futebol. Se os clubes de futebol que também apoiam os esportes olímpicos adotassem esta filosofia, o Brasil pagaria a cada quatro anos “mico monumental” como o país que ignora a importância do esporte para a formação de novas gerações. O Brasil seria o IBIS olímpico… Vergonha mundial…
Além disso, cabe a seguinte pergunta: Na CBF, dentre seus inúmeros patrocínios, há alguma estatal? Isto é, o governo, através de qualquer de suas empresas, patrocina de alguma forma a entidade maior do nosso futebol? Para quem não sabe, a resposta é NÃO!!!
Talvez o nobre deputado não saiba, mas a exemplo do que já citei aqui com relação aos clubes, onde o futebol sustenta os esportes olímpicos, na CBF, ocorre algo parecido. A seleção principal sustenta todas as outras seleções, do sub-15 ao sub-21, onde todas, “inclusive todas”, são altamente deficitárias. Ou seja, o futebol profissional sustenta as divisões de base, onde nada, absolutamente nada se arrecada. Em síntese, o dinheiro arrecadado pela seleção principal é reinvestido para a formação de futuras gerações.
Meu nobre deputado, como diria João Saldanha, “Cada macaco no seu galho”. Pense na fome de tanta gente, na saúde, na educação, na segurança… Perto disto aí, desta vergonha nacional, em que parte considerável da classe política está pouco se importando, o futebol brasileiro é um oásis…
Fonte: Blog do Kleber Leite