Em meio a discussão sobre quem deve ser o camisa 10 do Flamengo, outra posição que tem causado dor de cabeça nos últimos anos volta a ficar em segundo plano: a lateral-esquerda. Desde a saída de Juan, que viveu grande fase entre 2006 e 2009, antes de cair de rendimento, a camisa 6 não encontra um dono indiscutível.
Ainda é cedo para avaliar se a procura acabou, mas vejo o torcedor rubro-negro mais otimista. E os motivos para essa esperança são, à primeira vista, improváveis. O primeiro deles atende pelo nome de Anderson Pico. Revelado pelo Grêmio, Pico desembarcou na Gávea em busca de uma oportunidade. Visivelmente acima do peso e apresentado como “fio desencapado”, queria mostrar que aprendeu com os tombos da vida, após rodar por diversos clubes. Na época, o Flamengo havia rescindido com André Santos e só contava com João Paulo no setor. Foi a deixa para o jogador procurar Luxemburgo, seu treinador nos tempos do Tricolor Gaúcho, e conseguir a chance que sonhava.
Depois de algumas semanas de treinos e alguns quilos a menos, a estreia de Anderson veio contra o Cruzeiro. E não podia ser melhor. Vitória por 3 x 0 sobre o líder do campeonato, no Maracanã. Fora o baile! Com atuação segura na defesa e dois dribles desconcertantes em Marlone, Pico apresentou suas credenciais. Nos jogos seguintes, mostrou desenvoltura, fez gols, deu passes, sem descuidar da marcação. Por ser ambidestro, foi utilizado também na direita e manteve o mesmo nível. Acabou tendo o contrato renovado ao final da temporada, um justo prêmio pelo profissionalismo e qualidade demonstrados até aqui.
Quase simultâneamente, o Flamengo anunciava seu primeiro reforço para 2015, o lateral-esquerdo/meia Thallyson, que havia disputado a Série C pelo ASA. Definitivamente, não era uma contratação de encher os olhos. Mas aí, entre uma informação e outra sobre o jogador, declarações de quem o conhecia, vídeos e, principalmente, as boas atuações no começo da pré-temporada rubro-negra, a desconfiança foi dando espaço à animação e curiosidade. Quem era esse garoto que chegou sem se intimidar, como ele joga?
O próprio Thallyson tratou de tirar essa dúvida. Durante a entrevista coletiva que concedeu na última semana, definiu-se como “um lateral mais de apoio, velocidade, força. Gosto de carregar a bola até a linha de fundo e cruzar para os atacantes.” Em seguida, declarou ter Athirson como espelho e fugiu do discuso calculadora de “vim para somar”, afirmando que veio fazer história. Pretensioso? Só o tempo dirá. O que está claro é que não falta personalidade. A mesma que lhe fez driblar a deficiência na mão esquerda e se tornar jogador profissional.
São esses os personagens improváveis que fizeram a diretoria do Flamengo prescindir de João Paulo e que parecem ganhar um voto de confiança da torcida. Nomes como Alex Telles, Milton Casco e Emmanuel Más soam cada vez mais distantes, pelo menos por enquanto, até por motivos financeiros. O Campeonato Carioca será o vestibular de ambos, o momento de mostrar que resolvemos duplamente o problema que nos persegue há várias temporadas, sem a necessidade de novas contratações. Quem também pode ganhar oportunidade é Jorge, lateral do Sub-20 que tem se destacado na Copinha.
A favor deles está a escassa safra de laterais-esquerdos no Brasil. Tanto que o atual ganhador da Bola de Prata da Placar nessa posição é Zé Roberto, de 40 anos, e que há muito tempo não fazia essa função.
Deixo minha torcida pelo bom desempenho de Thallyson e Anderson Pico, que já deu bons sinais do que pode render, e um pedido: vamos ter calma. Oscilações são normais num time que pode até não começar do zero, mas que ainda busca uma (nova) maneira de jogar. Boas e más atuações, individuais ou coletiva, não devem ser motivo de euforia nem decreto de fracasso nesse momento de preparação.
Saudações Rubro-Negras!
Por Camila Miranda
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