A primeira vez na vida em que percebi que um time de futebol não era composto apenas pelos jogadores foi na final da Copa de 70 no Estádio Azteca. Para um moleque com 6 anos de idade que não prestava a devida atenção à grandiosidade daquele momento histórico a figura de Zagallo, gesticulando no banco, um pouco calvo, levemente grisalho e vestindo calças compridas, era de incontestável autoridade. Aos meus olhos aquele cara era o adulto que mandava em todos os meninos grandes que corriam de shorts dentro de campo. Uma imagem que jamais se apagou da minha memória.
Algum tempo depois entendi que todos os times tinham seus treinadores. A imagem de Yustrich, treinador do Flamengo, era por demais assustadora. Diferentemente de Zagallo, Yustrich era um cara mau, capaz das mais terríveis broncas. Com seus óculos escuros e cara de poucos amigos a mim mais parecia um agente da repressão, o bicho-papão da época. Foi com certo alívio que descobri em 72 que Zagallo era agora o treinador do Flamengo. Foi como se tivessem mudado o terrível diretor da minha escola por um professor do qual eu não tinha medo. Um dos sinais mais evidentes do meu precoce amadurecimento é que foi mais ou menos nessa época que aprendi que o nome do técnico do Flamengo não era Zé Galo.
Em 74, influenciado pela leitura, sem a supervisão de adultos, de jornais e revistas certamente subversivos acreditei que meus conhecimentos futebolísticos já eram suficientes para cornetar o treinador da Seleção Brasileira. Quem comandava aquela frustrante Seleção, que decepcionou o país pela primeira vez na sua cruzada pelo Tetra, era o, para mim, agora antipático Zagallo. Ainda mais grisalho, mais loquaz e aparentemente muito menos capaz de controlar os caras de short dentro de campo. Nunca mais esqueci os versos da paródia feita sobre o jingle do Scratch Canarinho quando voltaram derrotados da Alemanha: “Todos de porrete na mão, esperando o Zagallo descer do avião”. Não era mole ter 10 anos na década de 70. Eu e uns coleguinhas ficamos de castigo quando flagrados na escola cantando em altos brados a violenta versão de protesto.
Acho que depois da Copa Zagallo nem voltou ao Flamengo. Aproveitamos esse vacilo e rompemos relações, unilateralmente, por vários e vários anos. Zagallo passou a representar tudo o que então mais abominava no futebol, a saber: o Vasco, o Fluminense e o Botafogo. E foi com enorme prazer que vi o Flamengo de Zico derrotar as suas equipes vezes sem fim durante esse período de beligerância. Cada vitória do nosso esquadrão sobre os fregueses era um desagravo pela traição de Zagallo ao ídolo Zico, por ele preterido na convocação de 74.
Tentei uma reconciliação com o Velho Lobo quando retornou como treinador à Gávea, muito pelo passado vitorioso do jogador que brilhou durante 8 anos na Gávea e de lá saiu para ser Campeão do Mundo na Suécia. Mas a época não ajudava, comandando um Flamengo sem Zico e ainda por cima perdendo os Cariocas de 84 e 85 com derrotas até para o Bangu, rompemos relações mais uma vez. Pior, agora Zagallo era para mim um dinossauro, um fóssil sem qualquer serventia para o futebol moderno. E assim se passaram mais 10 longas temporadas em que cuidei zelosamente de jamais lhe dar a mínima demonstração de admiração.
A simpatia pelo meu 1º treinador só retornaria na épica e conturbada Copa de 94, onde finalmente saímos da fila com a conquista do Tetra. Parreira era o retranqueiro antipático, Zagallo, o sábio experiente e bonachão. Foi bacana a nossa reconciliação, tão bacana que resistiu à traumática sapatada em Saint Dennis em 98. Ficaram apenas as boas lembranças, o “vão ter que me engolir”, a mística ligação com o número 13 e o aviãozinho moleque do agora bom e querido velhinho. Foi naquela época que aprendi, e desta vez definitivamente, que Zagallo é interminável.
Agora que erámos amigos para sempre só faltava a sua volta ao Flamengo em grande estilo. E nem precisei esperar muito, em 2000 Zagallo estava de volta à Gávea. Para em 2001 confirmar que muito além da competência, Zagallo, o meu 1º treinador, era um dos caras mais largos do mundo. Um especialista da fina arte de estar no lugar certo na hora certa. Vieram as conquistas, a Taça Guanabara, com a inesquecível cobrança de pênalti espírita de Cássio. E o TetraTri do gol do Pet em que sua figura, ao mesmo tempo frágil e poderosa, com colete de titular sobre a camisa 13, agarrada à imagem de São Judas Tadeu como se fosse uma Jules Rimet é mais marcante em minha memória do que a Copa dos Campeões inteira que ele ganhou em Maceió com outro espetacular gol do sérvio. Zagallo foi ali tremendamente Zagallo.
Parabéns, Mario Jorge Lobo Zagallo, meu 1º treinador. Que seus próximos 86 anos sejam ainda mais brilhantes do que os primeiros. Juro que nós nunca mais vamos brigar.
Mengão Sempre
Mano gostei do texto
Mano gostei do texto
Esse cara fazia a diferença no blog do Flamengo lá na rede esgoto. Agora aquele blog está entregue às moscas.
Esse cara fazia a diferença no blog do Flamengo lá na rede esgoto. Agora aquele blog está entregue às moscas.
Verdade,os antes piravam..lembro da final da libertadores de 2010 eu acho..ele postou uma imagem de uma garrafa de Chivas…kkkk os chorolados piraram,estavam mais no urublog que no blog deles..eu ria muito..o cara e fera…ele ainda escreveu no república paz e amor..
Muhlenberg, sempre nos presenteando com a fina arte da comunicação.
Muhlenberg, sempre nos presenteando com a fina arte da comunicação.
Excelente texto homenageando uma parte viva da história do nosso futebol. Zagallo merece o respeito e reconhecimento de todos nós.
Excelente texto homenageando uma parte viva da história do nosso futebol. Zagallo merece o respeito e reconhecimento de todos nós.
Sempre excelente, no Globoesporte já dava aulas! Texto de parabéns!
Sempre excelente, no Globoesporte já dava aulas! Texto de parabéns!
Um brinde a delicada e espinhosa flor de um texto bem feito. Parabéns!
Um brinde a delicada e espinhosa flor de um texto bem feito. Parabéns!
Quem sabe, sabe …
Mulhemberg e Zagallo, parabéns!
Quem sabe, sabe …
Muhlemberg e Zagallo, parabéns!
Arthur… Feras!
Arthur… Feras!
Parabéns ao Velho Lobo pelos 86 anos!!! E que belo texto do Mulhemberg, como de hábito. Zé Galo, kkkk
Parabéns ao Velho Lobo pelos 86 anos!!! E que belo texto do Mulhemberg, como de hábito. Zé Galo, kkkk
Tempos em que carioca valia alguma coisa….em 2001 tivemos vexatórios 35% de aproveitamento no BR, não caímos por 2 pontos, campanha pífia tomando até 5 dos vices.
Tempos em que carioca valia alguma coisa….em 2001 tivemos vexatórios 35% de aproveitamento no BR, não caímos por 2 pontos, campanha pífia tomando até 5 dos vices.
Excelente texto, vida longa ao grande Zagallo!!
Excelente texto, vida longa ao grande Zagallo!!
Belo texto
Belo texto
Essa relação eu tenho com o saudoso Carlinhos Violino, o primeiro treinador do Flamengo que eu lembro de fazer a diferença e ser campeão, em 87 e 92.
Essa relação eu tenho com o saudoso Carlinhos Violino, o primeiro treinador do Flamengo que eu lembro de fazer a diferença e ser campeão, em 87 e 92.
Arthur Mulhemberg…
O mais phodástico escriba dos assuntos Rubro Negros…
Aquele que como ninguém, humildemente (nem sempre) e no sapato máximo (nem tanto), contou e decantou nossas estórias Flamengas por anos que pareceram décadas…
E nos brindando semanalmente no “Gê É ponto com” em nosso saudoso Urublog em épocas onde o “perrengue máximo” e a “quebradeira financeira” além da contratação dos perebas de sempre e os maus comportados de outrora nos assustavam passando sempre a impressão que só seríamos Flamengo se a “casa sempre estivesse prestes a cair” para assim conquistarmos improváveis títulos.
Um grande abraço ao Velho Lobo e um salve para você Grande Mestre das mais “humildes”, magníficas e mal traçadas linhas Rubro Negras.
Minha reverência aos dois.
Saudações Rubro Negras e o Grande Abraço de sempre.
Mengão sempre.
Arthur Mulhemberg…
O mais phodástico escriba dos assuntos Rubro Negros…
Aquele que como ninguém, humildemente (nem sempre) e no sapato máximo (nem tanto), contou e decantou nossas estórias Flamengas por anos que pareceram décadas…
E nos brindando semanalmente no “Gê É ponto com” em nosso saudoso Urublog em épocas onde o “perrengue máximo” e a “quebradeira financeira” além da contratação dos perebas de sempre e os maus comportados de outrora nos assustavam passando sempre a impressão que só seríamos Flamengo se a “casa sempre estivesse prestes a cair” para assim conquistarmos improváveis títulos.
Um grande abraço ao Velho Lobo e um salve para você Grande Mestre das mais “humildes”, magníficas e mal traçadas linhas Rubro Negras.
Minha reverência aos dois.
Saudações Rubro Negras e o Grande Abraço de sempre.
Mengão sempre.
Tem que respeitar o velho lobo..essa imagem dele da cobrança do pet não sai da minha cabeça,assim como a disputa de penalte Brasil Holanda semi final de 98 em que ele foi em cada jogador um a um..aquilo foi marcante,sem falar na emoção que o velho lobo transmite..E uma lenda viva que até hj vê o futebol com o coração..
Tem que respeitar o velho lobo..essa imagem dele da cobrança do pet não sai da minha cabeça,assim como a disputa de penalte Brasil Holanda semi final de 98 em que ele foi em cada jogador um a um..aquilo foi marcante,sem falar na emoção que o velho lobo transmite..E uma lenda viva que até hj vê o futebol com o coração..
Verdade,os antes piravam..lembro da final da libertadores de 2010 eu acho..ele postou uma imagem de uma garrafa de Chivas…kkkk os chorolados piraram,estavam mais no urublog que no blog deles..eu ria muito..o cara e fera…ele ainda escreveu no república paz e amor..
Belíssimo texto, Arthur, belíssima e justa homenagem.
Belíssimo texto, Arthur, belíssima e justa homenagem.
Muhlenberg tem escrito pouco, mas quando escreve dá nisso aí, mais um texto para imprimir em vermelho e preto e colocar na moldura para daqui a 20 anos ler e entender que é mais atual do que se imagina. O velho Lobo tem essa ligação de muito amor e um pouco de ódio com o Flamengo, esteve aqui e nos blindou com muitas alegrias, faz parte da vida de cada rubro-negro com mais de 20 anos. Como foi emocionante o Terra Tri, meu vizinhos Vascaínos nunca choraram tanto.
Muhlenberg tem escrito pouco, mas quando escreve dá nisso aí, mais um texto para imprimir em vermelho e preto e colocar na moldura para daqui a 20 anos ler e entender que é mais atual do que se imagina. O velho Lobo tem essa ligação de muito amor e um pouco de ódio com o Flamengo, esteve aqui e nos blindou com muitas alegrias, faz parte da vida de cada rubro-negro com mais de 20 anos. Como foi emocionante o Terra Tri, meu vizinhos Vascaínos nunca choraram tanto.
Mas só conquistou títulos regionais pelo Flamengo, o que agora é considerado pouco pela torcida.
Mas só conquistou títulos regionais pelo Flamengo, o que agora é considerado pouco pela torcida.
A Copa dos Campeões que ganhamos com ele era um torneio bom e os estaduais tinham outra importância até ali.
A Copa dos Campeões que ganhamos com ele era um torneio bom e os estaduais tinham outra importância até ali.