Por: Higor Neves e Venê Casagrande
Membro da diretoria do Flamengo desde 2013, Bruno Spindel assumiu o cargo de diretor-geral do clube em maio deste ano, após Fred Luz se desligar do Rubro-Negro. De lá para cá, Spindel se tornou responsável por importantes decisões no que diz respeito ao futebol. Exemplo disso é que o dirigente teve influência direta na contratação de Vitinho, além de ter representado o clube na negociação que selou a venda de Lucas Paquetá para o Milan. Porém, antes disso, quando exercia a função de diretor de marketing, ele esteve envolvido no fechamento de contrato com patrocinadores como Adidas e Carabao.
Flamenguista desde o berço, Spindel garante que o sentimento de torcedor faz com o que ele tenha motivação dobrada para ajudar ainda mais no crescimento do clube, visando ao sucesso em diversas áreas, com a ideia de manter o sentimento de orgulho da torcida. E o comportamento de Spindel frente a seu trabalho convence internamente. Prova disso é que ele conta com admiração e respeito dos dirigentes rubro-negros. Não a toa, durante o período em que ele estava concedendo entrevista ao Coluna do Flamengo, Spindel teve sua sala “invadida” por Eduardo Bandeira (presidente do clube) e Walter Oaquim (vice-presidente na chapa de Lomba), que apareceram para o cumprimentar. Luís Augusto Veloso, ex-presidente do Flamengo, também foi um dos que foi à sala de Spindel no decorrer da conversa.
A entrevista com o diretor-geral tratou de diversos pontos relacionados a negociações, jogadores e afins. Porém, ao longo do bate-papo, conhecemos também o outro lado de Spindel, quando ficou clara a sua postura como verdadeiro “workaholic”, ou seja, viciado em trabalho.. Além disso, ele chegou a fazer uma autoanálise de suas principais qualidades, sem ocultar os defeitos. O dirigente contou ainda detalhes sobre sua família, mostrando que um de seus maiores anseios é servir como exemplo para os filhos. Por fim, Bruno Spindel relembrou o tempo em que tinha o sonho de ser triatleta. Ele não chegou ao patamar que desejava, porém, faz questão de destacar que é um apaixonado por esportes.
CONFIRA O “PERFIL” DE SPINDEL:
Como foi trajetória de Bruno Spindel até chegar ao cargo de CEO do Flamengo?
– Trabalhava no mercado financeiro há 15 anos. Depois eu conheci o projeto de revitalização, mudança e profissionalização do Flamengo. Conheci através de um amigo, que me apresentou ao pessoal da chapa azul. Comecei a me envolver nesse projeto, achei legal, sou Flamengo e apaixonado pelo clube. Flamengo é a maior marca esportiva do Brasil. Conheci pessoas sérias e com muito sucesso em suas respectivas carreiras. Então, eu comecei a ajudar no que podia. Me chamaram para trabalhar, ajudei na negociação do contrato com a Adidas, fui com Bap (ex-vice de marketing do clube) lá para São Paulo em dezembro de 2012. Depois me chamaram para trabalhar no clube. Avisei aos meus sócios e vim trabalhar no Flamengo com o maior prazer e com a vontade de fazer o Flamengo ter o tamanho que a torcida merece. Ter faturamento igual aos dos clubes europeus. Estamos longe, mas é a ideia. Estou aqui com esse sonho de chegar ao nível dos maiores clubes do mundo.
Qual é o seu principal objetivo como diretor-geral?
– Meu objetivo é que o Flamengo ganhe tudo. Acredito em trabalho. Tem sorte na vida? Tem. Tem gente que trabalha muito e não consegue. Naquele negócio: Deus ajuda quem trabalha, eu acredito plenamente. Tem que ter pessoas boas ao seu lado. o Flamengo me ensinou muito isso. Trabalho em equipe e pessoas dedicadas. É uma Nação. Estamos aqui para tentar entregar o que todos querem. É trabalho de muita gente. A gente trabalha para ganhar hoje e ser campeão hoje. Se a gente não for campeão hoje,. é trabalhar para ser campeão amanhã. O que eu fiz de errado. Não é desistir nunca. A gente sonha muito com esse título. É incrível a vontade de todos aqui. A gente trabalha muito para conseguir.
Qual é a principal virtude do Bruno Spindel como diretor-geral?
– Eu acho que é trabalho duro. Não desistir nunca. Contar com as pessoas da equipe e ouvir muito. Nós temos dois ouvidos e uma boca para isso, para ouvir mais do que falar. Trabalhar muito, cobrar muito e focar em resultado.
E o maior defeito?
– Sou desorganizado e acho que preciso melhorar a comunicação com os meus colaboradores. O meu lado de relacionamento comercial é algo que tinha uma lacuna muito grande. Acho que essa experiência no Flamengo preencheu essa lacuna. Acho que tem uma lacuna no entendimento mais profundo técnico do futebol. Creio que temos profissionais muito bons lá e a missão é cobrar resultado, entender porque está tomando decisão e me qualificar para poder questionar mais e ajudar a fazer as melhores escolhas junto com o departamento de futebol. Claro que o povo brasileiro é fanático pelo futebol. É óbvio que é um mercado novo para mim. Estou no cargo desde o final de maio, mas já tinha uma convivência muito grande com o departamento. Tenho outros defeitos, mas vou levar uma semana se ficar falando (risos). Para compensar esses defeitos e falhas, eu procurou ouvir muito a minha equipe. Ficar focado sempre em resultado.
Como você avalia seu desempenho como negociador?
– Um bom negociador são os resultados que mostram. Mais do que falar por nós, é melhor analisarmos os resultados. O que posso dizer é que estou sempre buscando o melhor. Eu quero que a minha equipe também sempre esteja correndo atrás do melhor. Sempre vai ter coisas que poderiam ter sido melhor. Se a gente não se cobrar o tempo todo… Talvez a palavra certa não seja frustrado, mas insatisfeito, inquieto, desconfortável, a gente não consegue progredir. Óbvio que temos metas. A gente tem que ficar feliz, mas logo depois temos que ficar insatisfeitos de novo e temos que correr atrás de novo. A insatisfação é o sentimento que move a gente o tempo todo.
*Bruno Spindel participou diretamente na negociação do Flamengo para contratar o atacante Vitinho e foi o dirigente que viajou para a Europa com o objetivo de finalizar a venda de Paquetá para o Milan.
Você já deixou claro que é apaixonado pelo Flamengo. Porém, como você vê a possibilidade de trabalhar em outro clube futuramente?
– Não dá para dizer que nunca. Não vou fechar a porta de nada. Eu acho que, colocando de outra forma a pergunta, eu acho que o Flamengo tem que ter os melhores em todas as áreas. O fato de eu torcer para o Flamengo cria uma emoção sentimental, faz com que eu tenha mais energia para o sucesso, eu posso entender bem o sentimento do torcedor, mas eu acho que o lado do clube tem que sempre buscar os melhores profissionais. O Flamengo é eterno, e a gente passa. De novo: trabalhar no Flamengo é um prazer enorme e uma satisfação muito grande. A questão da gente deixar um legado para os filhos é muito forte no Flamengo. Essa coisa de pais para filhos é forte demais. Poder trabalhar como profissional, ajudar o clube a crescer, entregar isso para os meus filhos, isso é uma coisa pessoal minha, é uma recompensa muito bacana. Ver o Maracanã lotado, ver o Flamengo brigando por título, os jogadores do nível de Seleção, a base revelando um jogador atrás do outro, esporte olímpico bem, esse Flamengo que dá orgulho… é um orgulho muito grande participar desse processo.
Por falar em família… Como fica a relação com eles em meio ao desafio de ser dirigente do Flamengo?
– Tenho dois filhos (Erick, de 3 anos, e Pietra, de 6 anos). Óbvio que a vida profissional sacrifica o lado familiar. Mas a minha mulher, Ticiana, sempre apoiou minhas escolhas profissionais, dando todo o apoio possível e suporte familiar nas horas difíceis. Além de mulher, ela é muito parceira, eu não teria chegado onde cheguei sem a orientação e apoio irrestrito dela. Ela é um exemplo de dedicação, caráter e todos os valores. A Ticiana é vencedora na vida. Me dá o suporte necessário para que eu me doe muito pelo Flamengo, o que é obrigação do meu cargo, mas, é claro, que acaba tendo o custo da família, que não é baixo. Mas o brasileiro, de forma geral, tem a vida muito dura. Muita gente sai às 3h da manhã para trabalhar. Eu não posso reclamar de nada nesse aspecto, só me dedicar ao Flamengo. Tem o custo, tempo de aproveitar a família. Do outro lado, eles vêm o exemplo. Mais do que falar, o amor que passa para os filhos é fundamental. O exemplo de dedicação em mim, espero que vejam, de querer sempre o melhor, espero que isso seja a melhor forma de educar. Eu acredito nisso. Temos sempre que passar o exemplo. A melhor forma é ser exemplo com atitudes. Para os filhos vale a mesma coisa. Acho que enxergam isso e espero que eu possa dar orgulho.
Seus filhos são torcedores do Flamengo?
– São e muito (risos). Querem tudo do Flamengo. Chuteira, camisa e, sempre que podem, eles estão no Maracanã para assistir aos jogos.
Você foi competidor de triatlo antes de chegar ao Flamengo. Sente saudades desse tempo?
– Eu fui até os 22 anos (atualmente Bruno tem 42 anos). Eu era triatleta. Não fui profissional. Eu tinha um sonho de ser profissional, mas não consegui. Era para manter a saúde, mas agora o tempo está escasso. Preciso arrumar um tempinho para fazer exercício. Sou apaixonado por esporte. Eu acho que o esporte é um exemplo de vida. Transforma a vida, você faz amigos, é um ambiente de meritocracia. Mistura talento, sorte, esforço e caráter. Eu acho que o esporte é um exemplo muito importante para todos. Quem pratica esporte sabe disso.
Hoje você pratica algum esporte?
– Eu tento correr no tempo que dá. Acabo lesionando alguma coisa por estar acima do peso (risos). Tento correr. De vez em quando jogo futebol com os amigos, mas estou sem tempo ultimamente (risos).
No Flamengo, muita gente diz que você não dorme porque está sempre ligado no Whatsapp e no e-mail. Você se considera workaholic (*uma gíria em inglês para chamar a pessoa viciada em trabalho)?
– (Risos) Eu tenho responsabilidades, inclusive, entregar resultados. Então, eu quando acordo com um negócio na cabeça, eu “vomito” tudo no Whatsapp. Quando a pessoa acordar, vai ver as mensagens, e aquilo vai ter processo mais rápido (risos). É normal. A cobrança é mútua. Acho que o Whatsapp é uma ferramenta muito legal para a gente se cobrar. Todo dia de manhã, tudo que é importante, que está na minha lista de pendência, já vai ser resolvido. Já falo com todos os envolvidos para pegar status, perguntar no que posso ajudar para fazer andar mais rápido. As coisas ficam rodando na cabeça. Ela não para nunca. Isso é o maior prazer. Aquilo que falei: tem que dar o exemplo. Sem trabalho duro, sem comprometimento, a coisa não vai para frente. De forma geral, a equipe toda entrega bastante. É só ver o que aconteceu no clube. Temos que lutar todos os dias. Não desistir nunca, acreditar e remar junto. Missão dada, é missão cumprida. Não desistir nunca. Aqui não tem vaidade. Não tem essa de tarefa nobre. Se precisar tirar xerox, eu tiro, se tiver que empurrar carro, eu empurro. O que tem que fazer para acontecer, a gente faz. Todos com essa mentalidade.
OUTROS PONTOS DA ENTREVISTA:
Agora, com o passar do tempo, você acha que o Flamengo pecou na janela de transferência do meio de ano ao não contratar laterais?
– Eu acho que a gente sempre pode melhorar tudo. Não acho que se revolve tudo contratando. O atleta pode evoluir, tem sistema de jogo, treinamento e tem uma série de outros aspectos. Além disso, existe a limitação de receita. Não estou falando especificamente das laterais, mas o que se avaliou na janela é que as posições em que investimos, eram as posições que tínhamos mais carência. A posição mais carente, obviamente, era a extrema esquerda. Perdemos Vinicius Junior, Everton Cardoso e precisávamos repor essa posição. Na frente tinha saído o Vizeu, tinha incerteza do Guerrero e era outra posição que tínhamos necessidade muito grande. E a posição do Piris, que o Jonas acabou saindo da janela. Contratamos o Piris. No caso do Piris e do Vitinho, são jogadores jovens e vão poder performar no clube. Espero que virem ídolos. Uribe, embora da idade mais avançada do que os outros dois (30 anos), foi artilheiro no México. Os três fizeram parte do processo de avaliação. Uribe veio sem custo de transferência, pois seu contrato com o Toluca havia se encerrado. Foi interessante do clube. A gente espera que dê resultado. A gente quer se planejar para que a gente não faça grandes mexidas na equipe. O ideal para o clube é que não precise fazer mudanças na janela do meio do ano, para que o atleta possa fazer uma boa temporada e resistir à temporada do Brasil, que é uma das mais duras do mundo. Então, é importante que o time seja montado e pronto no começo do ano.
Então, para 2019, já tem negociações em andamento para a formação do elenco?
– Acho que é uma coisa que precisa se ver. Temos eleição. Estamos tentando entregar um planejamento pronto. A ideia é entregar tudo pronto, para que se possa agir muito rápido. Claro que, se tiver uma eventual oportunidade antes da eleição, vamos analisar. Mas acho que o principal é ter tudo planejado. Certeza é que o orçamento vai ser bom para o próximo presidente. Bom porque terá capacidade de contratação. Acho que vai ser um ano que o planejamento vai poder ser executado com recurso financeiro.
Fred Luz, seu antecessor no cargo de CEO, frequenta o clube, jogos e vestiário e presta consultoria. Como você vê essa “sombra”?
– Primeiro tem um aprendizado que o Fred deixou aqui, que é muito importante para nós. Temos que estar aqui todos os dias de manhã cedo, batalhando para entregar os resultados da melhor maneira possível, esse é o principal legado que o Fred deixou. Não importa se choveu ou fez sol. A missão é entregar resultados. Esse é o legado que Fred deixou aqui, talvez o principal. Eu acho que o Flamengo tem uma governança que cada estância tem tudo bem definido de qual é a autoridade e autonomia. As minhas missões e responsabilidades são as de um CEO de um clube.
E caso a oposição conquiste a vitória na eleição e te convide para ficar, você aceita?
– Eu trabalho para o Flamengo. Claro que eu respondo ao presidente Eduardo, mas sou funcionário e soldado do Flamengo. Meu sonho, respeitando os princípios, é ajudar o Flamengo. Eu tenho o sonho de ser potência mundial, que hoje não é só formar e revelar jogadores. Temos que manter os atletas e isso depende de dinheiro. Minha responsabilidade se deve ao presidente, mas sou profissional e soldado do Flamengo. Não tem problemas.
*Além dos tópicos apresentados nessa publicação, Spindel falou sobre outras questões importantes no futebol, como o detalhamento da venda de Paquetá, possibilidade de renovação com Diego Ribas, planos do Flamengo para o volante Gustavo Cuéllar e projetos para valorização da marca do clube.