O Clássico dos Milhões (de gols rubro-negros) do último domingo traduz a distância que foi aberta entre arquirrivais: o Vasco venceu apenas 2 dos últimos 28 jogos contra o Fla.
Exceção de duas finais de Copa do Brasil (2006 e 2011), uma disputa de título brasileiro (2011) e uma boa campanha de Libertadores (2012), a impressão que se tem é de que o Vasco ainda não foi convidado para o século XXI do futebol do Brasil.
A crise existencial é tamanha que o time da Colina se olha no espelho, mas não se encontra.
Por outro lado, percebe-se que quando o Flamengo se defronta com a própria grandeza, há em seu destino um desafio na América do Sul similar ao do Real Madrid, no Velho Continente: dominar, ter a plenitude da própria potência, para, naturalmente, vencer e vencer bem e vencer sempre.
O sonho do Flamengo tem orientação geográfica para as Américas e para o mundo e, altivo, o Mengo encara essa missão com olhar olímpico de quem sabe ser capaz. Esse sonho imperialista rubro-negro pode um dia se materializar ou não, mas inegavelmente foi vivido pelo povão durante mais de uma hora onírica e imperial, no Maracanã.
Uma hora e vinte e quatro minutos orgásticos para os preto-encarnados, precisamente das 16:27 às 17:51 do dia 2 de junho de 2024 que foi quando o Bráulio Machado (lá ele) decidiu parar.
O árbitro sequer deu acréscimo ao segundo tempo, tendo havido na mesma segunda etapa três gols e quatro paradas para substituições. Gesto de generosidade tão incrível quanto constrangedora.
O Maraca escolheu o Flamengo para vencer. Tá, o mando era do Vasco, mas a bola escolheu o Flamengo como dono.
Cebolinha é ‘blabo’, o peito do Pedro é brabo, David Luiz golaço e o doceiro De Arrascaeta driblou Galdames, Piton, Maicon, Pedrinho, São Januário e 777 caravelas vascaínas, para acertar a receita do segundo chocolate mais saboroso que o Fla provou no século. Atrás somente dos 5 x 0 no Grêmio na semifinal da Libertadores 2019.
Fica um vácuo inexplicável ao Vasco da Gama. O próprio Flamengo passou por isso quando levou 6 do Botafogo no dia do aniversário rubro-negro, em 1972. Precisou vingar na mesma medida para se curar totalmente do trauma. Foi no flamengo ano de 1981 que a revanche veio.
Se o Vasco um dia dará o troco não se sabe. Possível é. Provável, não.
Cruzmaltinos se recolhem silentes e feridos, pois no mesmo lugar onde Rondinelli e Pet feriram, Bruno Henrique e Gabigol arrombaram.
Numa grande resenha entre amigos no céu, Apolinho – criador do termo chocolate para designar goleadas – liga seu microfone rubro-negro, “mais feliz do que pinto no lixo”, para gritar que “o Flamengo é foda!”; enquanto o incrédulo Eurico, o seu charuto apaga.
Chocolate ao (de)leite para a Nação. Amargo e com pimenta, para o povo vascaíno.
Festa pra “arquibaldos e geraldinos” na fantástica fábrica de gols e chocolates do Maracanã.