Na manhã de domingo uma pessoa perdeu a vida enquanto caminhava por uma praça.
Ela, na verdade, não perdeu a vida.
Sua vida foi tirada.
A pessoa foi assassinada.
Uma bala disparada por um bandido no meio de muitos outros, atingiu seu coração. A morte foi imediata. O assassino fazia parte de dois bandos de “organizados” que se enfrentavam em plena manhã de domingo, numa praça.
Esse crime aconteceu a muitos quilômetros do Estádio do Pacaembu, onde, durante a tarde, se enfrentaram Palmeiras e Corinthians.
As mortes ligadas aos jogos de futebol são assustadoramente comuns. Providências efetivas não são tomadas, seja pelas autoridades policiais e judiciais, seja pelos dirigentes de clubes, coniventes e financiadores desses bandidos, em sua maioria.
Durante a semana ficamos sabendo que entre os presos pela Polícia por conta das brigas do domingo, estavam participantes do assassinato do garoto Kevin Espada, em Oruro, em 2013.
Um dos presos foi o elemento que se apresentou à polícia paulista e assumiu a autoria do disparo do artefato que matou Kevin. Convenientemente, ele era menor de idade e sua confissão, ou “confissão”, levou a nada. O assassinato de Kevin segue impune.
Como impunes seguem os responsáveis por grande parte das mais de 100 mortes registradas em estádios, suas proximidades ou eventos ligados aos jogos em locais mais distantes, principalmente estações de metrô e ônibus.
São muitas as páginas deste OCE que se ocupam da violência praticada por “organizados”. Recuso-me a chama-los de torcedores, pois não são.
Nada é pior que a perda de uma vida e não há como medir o valor de uma perda como essa.
Nada é mais grave para uma nação que manter impunes pessoas que tiram a vida de outras, não importam os motivos.
Antes das autoridades, os dirigentes de nossos clubes precisam cortar os vínculos com esses bandos e, principalmente, cortar suas fontes de abastecimento de dinheiro.
É uma ofensa a um sócio-torcedor que paga sua mensalidade em dia, muitas vezes, principalmente hoje, com dificuldade imensa, ver bandidos travestidos em torcedores ganharem ingressos de seu clube do coração. Ganharem transporte. Ganharem facilidades para acesso ao estádio.
Se os Conselhos, ineficientes, incompetentes Conselhos dos clubes, não agem contra seus executivos que facilitam a vida dos bandidos, devem as autoridades agir contra esses dirigentes. E duramente, sem contemplação, eventualmente penalizando também o próprio clube.
Infelizmente, porém, o que vemos são ações desprovidas de sentido e carregadas de publicidade, como a proibição em São Paulo de venda de ingressos para duas torcidas nos clássicos.
Torcida única nos clássicos.
Ora, melhor seria decretar o fim do futebol a implantar uma tontería como essa!
Essa medida, por sinal, é o reconhecimento de “papel passado” da virtual falência do Estado brasileiro na manutenção da segurança para os cidadãos.
Causa espanto, entre outras coisas, que essa ineficiência do Estado se dê, por exemplo, na prevenção de brigas marcadas pelos bandos criminosos. Confrontos que todos sabem que vão ocorrer são ignorados pelas autoridades. Sabe-se que eles são marcados com antecedência. Como ficam, então, os serviços de inteligência das forças policiais?
A Operação Lava Jato está dando mostras inequívocas a cada novo dia de como realizar trabalhos investigativos junto a setores e pessoas altamente qualificadas em termos de informações e recursos financeiros, infinitamente mais do que são capazes os bandos de criminosos que vestem camisas de clubes.
Meios existem, portanto. Então, o que falta?
Vontade.
Vontade política de todos os envolvidos.
Havendo essa vontade, estou certo que a polícia ficará satisfeita e cumprirá seu dever com mais facilidade.
O custo da violência
O trecho abaixo abre o post “As perdas que a violência provoca”, publicado por este OCE em 27 de março de 2012:
“40,3%
Medo da violência
Falta de segurança
Brigas entre torcidas
Confusões/Tumultos
Torcidas organizadas
É perigoso
Prefiro ver em casa porque é mais seguro”
Esse foi apenas um dos muitos posts a respeito e o destaque foi a pesquisa Qualibest, realizada com 1.627 internautas de todo o país, com mais de 18 anos de idade. Imaginem a perda financeira que esses números representam para os clubes.
Em 10 de fevereiro de 2015, o programa Redação Sportv destacou pesquisa realizada pelo instituto Stochos sobre os motivos que levavam os torcedores a não comparecerem aos estádios.
O resultado é muito claro, como mostra a tela acima:
Violência.
O principal fator a afastar o torcedor.
Dessa vez, um percentual de 43%, na prática similar e comprovador dos 40,3% da pesquisa Qualibest, com uma amostra muito diferente. Essa pesquisa Stochos foi realizada em todos os estados brasileiros, com um total de 8.000 entrevistados acima de 16 anos de idade.
Há muitas outras pesquisas, inúmeras, mais antigas, mais recentes, com amostras maiores ou menores, regionais ou nacionais. Os resultados são extremamente consistentes e apontam, sempre, para a violência como o maior obstáculo à maior presença de torcedores nos estádios.
As pesquisas, assim como o que vemos no dia a dia pela imprensa, mostram que a origem, a causa maior desse medo está na presença dos bandos de “organizados”.
Sabem as autoridades que “torcida única” nada irá resolver, mesmo porque os torcedores verdadeiros, principalmente quando acompanhados por familiares, têm muito medo… dos bandos de “organizados” do seu próprio time.
Fonte: Olhar Crônico Esportivo